O diretro David O. Russell se firmou no cenário do cinema americano nos primeiros anos da década de 2010, apenas de ser melhor filme ter sido feito há mais de uma década , Três Reis, em 1999. Solidificou sua marca e alcançou ainda o reconhecimento como autor quando se propôs a estudar relacionamentos entre pessoas de personalidades nem um pouco convencionais. Após seu êxito internacional em 2012, com O Lado Bom Da Vida, sem parar para respirar ele já engatou outro filme com a mesma proposta, mas obteve resultados diferentes, desta vez ele progrediu na elegância visual e a confiança que adquiriu com o projeto anterior fez com que descarregasse estilização que só somou em seu novo trabalho. Mas a mesma confiança que o ajudou o traiu. Se ganhou em elegância, perdeu em controle de situação e de personagens.
Ele não acertou o ponto de equilíbrio em sua historia. Talvez tenha faltado experiencia. A Trapaça era um projeto promissor, mas talvez alguns projetos entre ele e O Lado Bom da Vida devessem ter sido realizados pelo diretor para alcançar o objetivo maior aqui, o de contrabalancear uma enxurrada de pensamentos. Os primeiros minutos eficientes, são o que é preciso para colocar qualquer um dentro da historia, e tudo com a marca de O. Russell, o envolvimento de Irving (Christian Bale) e Sidney (Amy Adams), com direito a flashback, é passado de modo intimista e inteligente, assim como a entrada do detive de Cooper e da esposa histérica de Lawrence.
Após a apresentação dos personagens , pensamos que o diretor vai entregar seu trabalho definitivo, até que a análise sobre personagens se mistura à operação policial representada, e aí O. Russell perde o controle e parte intermediaria de seu filme passa a se tornar uma alternância de foco, mas a respeito disto não há problemas se feito com paciência e cautela, mas aqui, faltou mão firme e as virtudes necessárias perdem espaço para a pressa e as cenas parecem se suceder sem uma lógica narrativa, com os interesses profissionais se confundindo com os passionais, intencionalmente, mas sem uma conexão bem definida, fazendo os personagens exaltarem suas emoções sem sabermos ao certo o que exatamente provoca-as e quais são as pretensões deles, que justifiquem suas atitudes.
Temos então a elegância artística em um forte contraste com a instabilidade narrativa, ponto onde O. Russell mostrou que precisa ainda evoluir - pois o potencial é claro - para enfrentar historias mais desafiadoras, como esta, onde ficou obvia a necessidade de estabelecer um carro-chefe para sua historia. O interesse maior dele é o personagem, mas aqui isso não fica muito bem determinado, o que trás inconsistências em um aspecto geral.
O ponto mais positivo fica dividido entre a já citada estilização, inspirada em grande parte no cinema de Martin Scorsese, ficam claras inúmeras referencias ao diretor, e o desempenho de todo elenco. Num filme de atores se torna essencial falar sobre eles individualmente, a melhor performance é de Amy Adams, que equilibra humor e melancolia com uma naturalidade impressionante, Bale comprova ser um ator extremamente competente – contracenando com Robert De Niro, lança um olhar de apreensão que é algo genial -, Jeniffer Lawrence ganhou seus momentos do diretor e quando surge em tela chama as atenções pra si e Bradley Cooper dá conta do que lhe exigem, mas de todos, é o que menos merece louvores, apesar de protagonizar uma das situações mais geniais entre os atores do filme, na cena onde entra numa sala comemorando com os colegas de trabalho. O quarteto do diretor garante ao menos a simpatia do público pela historia.
E a análise a respeito da farsa e do que podemos ou não acreditar numa sociedade cheia de ilegalidades, que no começo tinha força, gradativamente vai perdendo espaço e se confundindo com as outras linhas de pensamento, até perder o sentido ao ponto de no final não sabermos ao certo quais as intenções do diretor com o tema.
Exemplos de momentos que misturam humor e eficiência temática são diluídos em meio a confusão dos acontecimentos. A genialidade de situações como o mexicano que se passa por um árabe ou o casal que decide só fazer sexo quando sentir que o amor é real se encaixam dentro da representação da farsa, têm seu sentido perdido. Fica esboçado algo como ninguém se importar com a mentira até saber que não há nada de verdadeiro nela, mas não passa muito disso. David O. Russell ainda terá mais chances de demonstrar maturidade como diretor e autor em trabalhos futuros, pois aqui ainda não aconteceu, nem chegou perto.
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