Após cerca de duas horas de filme, A grande Beleza parece ganhar vida própria e insiste em não acabar. A essa altura começa a sucessão de possíveis finais que não se concretizam, pois o filme na verdade nunca acaba, o retrato ao qual se dispõe a fazer a obra não é de algo momentâneo, é de algo que mesmo após o desfecho da historia em questão, continuará. A sensação de que o filme é interminável pode se confundir, mas logo esta sensação passa quando fica claro que Sorrentino só quer mostrar um pouco mais com sua câmera brilhante. Não importa que acabe ou não rapidamente a obra, aquela realidade retratada permanecerá. É contundente.
Através do olhar irônico e existencial de Gep Gambardella, unido a uma câmera precisa movida pela contemplação, o diretor expõe a alta classe romana, revelando suas superficialidades, arrogância e o grande vazio que tomam suas vidas que julgam ser completas. O filme é guiado por isto apenas, não há grandes problemáticas, mas é o suficiente para um passeio incessante e revelador para o personagem. E o que há de mais interessante, também é o maior perigo ao qual o diretor se expõe, Gep pertence a essa sociedade que ele representa. Um jornalista bem sucedido com amizades e romances ocasionais, que freqüenta a alta sociedade na mesma proporção que a julga e gradativamente não a suporta mais.
Gep chega a uma fase de sua vida onde se depara com o próprio vazio, e a angustia psicológica o toma, fazendo-o usar seu tempo da melhor maneira possível, sem disperdiça-lo já que alcançou a terceira idade e a morte pode chegar a qualquer momento. Sua decisão converge com a de seus amigos na mesma situação, enquanto ele decide encarar a realidade e buscar um sentido para as coisas, todos ao seu redor preferem a tarefa mais simples de fingirem para todos, mas principalmente para si mesmos, sobre a realidade de suas vidas vazias e regadas a aparências. E Sorrentino lança-os um olhar cínico através de seu personagem.
O maior feito do diretor é com certeza colocar seus personagens inseridos por entre as ruas de Roma, que o diretor transforma em uma cidade viva. Ele lança um olhar sobre as excentricidades da capital, capturando situações diversas, unindo estruturas históricas com pessoas, fazendo da própria cidade muita mais que um cenário. Por ela Gep caminha constantemente numa rotina nada monótona preenchendo sua existência com reflexos e interações que não levam a lugar algum diferente do que ja habita, o de uma sociedade culturalmente rica, mas vazia em seu todo.
A grande beleza é um filme de análise, e como em qualquer uma, é necessário paciência no acompanhamento dos pensamentos que são lançados em questão. Aqui há o perigo de julgarem Gep, a nossa visão daquilo tudo de deprimente, como parte ativa daquilo que despreza. Mas a verdade é que ele é! E apenas por isso entra num espiral de auto-analises baseando-se em tudo que ja viveu e ao mundo que pertencia. Dentre outra qualidades da obra, vale lembrar da fotografia - as imagens da grande sacada de Gep durante o dia são belíssimas - e o desempenho de Servillo, que pode parecer inocente, mas embasada numa especie de naturalidade cínica, grande trabalho do ator.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário