"Pacto Sinistro" foi um dos grandes sucessos da carreira de Alfred Hitchcock. É verdade que sem o mesmo barulho de "Psicose" (1960), "Um Corpo Que Cai" (1958) ou "Janela Indiscreta" (1954), por exemplo, mas com uma qualidade bastante semelhante a esses trabalhos. A data de 1951 marca o primeiro filme do diretor após assinar com a multimilionária americana Warner Bros. Apresenta também uma de suas obras mais sinistras e admiráveis. Vale lembrar que nessa época o cineasta já era dono de uma carreira sólida, com alguns clássicos no currículo. Entre eles: "Festim Diabólico" (1948), "Interlúdio" (1946) e "Rebecca – A Mulher Inesquecível" (1940).
Em linhas gerais, a história gira em torno do tenista Guy Heines, personagem que por um terrível azar esbarra com o psicótico Bruno Anthony no trem. Desfeito o mal entendido, ambos iniciam uma conversa estranha. Bruno dá mostras logo de cara que é um maluco, enquanto Guy apenas dá corda à conversa fiada do ‘amigo’. Papo vai, papo vem… o estranho Bruno faz uma proposta ousada ao companheiro: o plano seria o assassinato perfeito. De acordo com o suposto plano, cada um cometeria o crime do outro. Ou seja, Haines teria que matar o pai de Bruno (Sr. Anthony), enquanto Bruno mataria a esposa de Haines (Mirian). O que parecia mera brincadeira é levada a sério por um deles, desencadeando graves acontecimentos
Como em todos os filmes de Hitchcock, "Pacto Sinistro" tem uma série de sacadas geniais. A primeira delas acontece logo no início: dois homens aparecem caminhando até o trem. Na tomada, o diretor apenas filma os pés de cada um. Para a nossa surpresa, ambos possuem sapatos completamente distintos – como se revelariam suas respectivas personalidades ao longo da trama. Em outra cena (a do parque) é criado todo um clima macabro: Miriam Haines navega pelo rio junto com outros dois pretendentes; atrás deles, o psicótico Bruno os segue sem pudor. Na passagem da caverna, Hitchcock cria uma das cenas mais legais que eu já vi no cinema. A sombra se aproximando, o grito da mulher… mera brincadeira. O ponto final de Miriam Haines na história é adiado por mais alguns minutos. Há também toda a mística do trem: o meio de transporte é um dos preferidos dos cineastas para cenas de suspense/terror. Os trens, ao mesmo tempo que nos levam a algum lugar, transmitem uma imagem claustrofóbica, como se o mocinho estivesse encurralado, sem saída.
Sacadas à parte, Alfred Hitchcock também é mestre em desenvolver seus trabalhos. Acho impressionante o modo como ele faz tudo ao mesmo tempo: constrói o suspense, desenvolve a história, os personagens, as subtramas… tudo isso com muita qualidade e sem deixar furos. Outros cineastas têm por costume fazer uma parte de cada vez, tornando seus filmes um pouco mais arrastados. Com Hitchcock tudo é ágil, rápido… é raro ver alguém dizer que alguma de suas obras é ‘parada’. Junto a isso, colabora a trilha sonora de Bernard Herrmann, sempre muito adequada e utilizada nas melhores horas. Em "Pacto Sinistro" temos uma grande aula de como usar os efeitos sonoros – que é um dos recursos primordiais do suspense.
Falamos de tudo, mas ainda falta citar os atores… que fantástico é o desempenho de Robert Walker na pele de Bruno Anthony! A personagem goza de um desenvolvimento absurdo, muito bem trabalhado e aprofundado. Bruno é o típico filhinho de papai mimado que nunca teve um pedido rejeitado na vida. Quando cresceu, virou um maníaco, doido, maluco, frio, calculista… tudo que se pode imaginar. Impressiona a sequência do parque, quando logo após cometer um crime, ajuda um cego a atravessar a rua. Que lógica é essa? Como isso funciona? É difícil explicar, mas é um personagem interessantíssimo. Outra cena rica em suspense e extremamente tensa é a do quarto, quando Guy Haines se depara com Bruno em plena cama do pai. Aliás, toda aquela sequência é de deixar os cabelos em pé – dá vontade de adiantá-la no controle remoto para ver logo o que acontece.
O longa também conta com um elenco de apoio respeitável. Aqui, destaco a própria filha do diretor: Patrícia Hitchcock. Ela é o alívio cômico da trama; é desbocada, fala o que quer, garante risadas… ainda por cima é uma das chaves para desvendar o mistério. Mistério esse que é solucionado em outra cena empolgante (reparem na música ao fundo). De volta ao parque, no carrossel, com direito a ‘velhinho’ quase se sacrificando para evitar uma tragédia… aliás, alguém acredita que cavalos inofensivos de carrossel possam dar medo em alguém? Hitchcock de alguma maneira os transforma em diabólicos e assustadores (coisa de gênio).
Por fim, vemos em "Pacto Sinistro" uma obra completa, com todos os elementos necessários para se montar um grande filme. Obra obrigatória a todos os cinéfilos, especialmente aos que adoram um bom suspense!
Completando a ficha…
Para quem é daqueles que gosta de ter os dvd’s em casa, há uma versão recheada de extras interessantíssimos. Um dos mais legais é uma entrevista com o diretor M. Night Shyamalan, autor de obras como "O Sexto Sentido" e "Sinais". O cineasta, fan assumido do trabalho de Alfred Hitchcock, comenta o filme com propriedade – bem melhor do que esse que vos fala. Vale a pena conferir.
www.moviefordummies.wordpress.com
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