Após ser informado por amigos que sua namorada Minjung estava bebendo em um bar acompanhada de outro homem, o pintor Young-soo se preocupa e resolve interrogar a amada sobre o que de fato aconteceu. Esse é o ponto de partida que o aclamado diretor sul-coreano Hong Sang-soo escolheu para nos entregar mais um filme ao seu estilo particular, marcado por um roteiro cuidadosamente lapidado o qual esconde em sua simplicidade uma intrincada rede de jogos de lógica e de linguagem.
Mesclando cenas reais com reflexos dos desejos de Young-soo, somos conduzidos por cenas sempre com a cautela de saber se o que estamos assistindo realmente faz parte da história ou se é apenas delírio do pintor. Tal elemento, ao qual chamo de "interconectividade narrativa", é a marca registrada do diretor. Todos as suas obras de alguma forma empregam esse recurso, porém sempre de forma ligeiramente diferente, o que garante a independência e a qualidade artística de cada um deles.
Muito se nota um pensamento lógico-matemático derivando de cenas cotidianas. No caso de "Você e os Seus", a chave para os malabarismos roteirísticos de Sang-soo se dão graças às situações criadas por Minjung, que oculta sua identidade e se faz passar por outra pessoa sempre que para ela isso é conveniente. Os homens se aproximam dela, pois conhecem Minjung; ela no entanto desempenha o papel de desconhecida, de pessoa confundida, e acaba realmente criando outra identidade sustentada pelos próprios homens que juravam a conhecer. Esse acontecimento ocorre em loop durante todo o filme, e é na repetição das situações que o diretor alcança o caráter cômico da história. A relação do pintor Young-soo com Minjung está presente na cena inicial e na final, servindo de elo de ligação para o ciclo de acontecimentos e, por si só, denotando a continuidade das situações apresentadas.
Utilizando-se de recursos narrativos simples, notadamente a repetição e a interconectividade, o mestre sul-coreano consegue efeitos cômicos e manejo de linguagem brilhantes. Impressiona como os seus filmes são secos e simples: não há elucubrações estéticas, fotografia arrojada, tomadas inovadoras, direção marcada, atuações exemplares. O filme enxuga tudo isso para tornar o roteiro seu centro de força, e com isso arrebata o público. Em tempos de crescente "barroquismo" na forma de filmar, Sang-soo toma a direção oposta. Parece estar funcionando, em vista da sequência de ótimas realizações que vem alcançando.
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