Saudações! Um novo cinema americano estava surgindo no final da década de 60, aglomerando tendências diversas como também diversas ideias, que pareciam ter como único ponto comum a liberdade, temática ou estética, para abordar temas tabu entre a sociedade americana. O filme em questão, Saudações (Greetings, 1968), de Brian de Palma (co-autor da obra junto a Charles HIrsch), também versa toda essa liberdade sobre temas que estavam "explodindo" no lendário ano de 68 com aguçado humor negro: a Guerra do Vietnã, a liberação sexual e até mesmo tramas mirabolantes sobre a morte de Kennedy.
No filme acompanhamos algumas histórias (ou esquetes) de um trio de nova-iorquinos. Paul Shawn (Jonathan Warden, único filme realizado pelo ator) tenta escapar da convocação para a guerra, seja levando uma surra aleatoriamente, ou se passando de ultra-direitista no exame psicológico com a ajuda dos amigos neuróticos. O paranoico Lloyd Clay (Gerrit Graham, que fez outros filmes com De Palma e teve carreira como ator de TV) tenta provar a cada oportunidade a farsa do governo americano em encobrir o verdadeiro assassino de Kennedy. E temos também a estreia nas telonas de Robert de Niro (que havia feito um filme em 1963, Festa de Casamento, em parceria com De Palma, mas que só foi lançado em 69), como Jon Rubin, um completo maluco que filma as suas transas de forma amadora. O ator demonstra certa insegurança em alguns momentos, mas no geral está deliciosamente cômico como na cena em que tenta dirigir sua "atriz" no seu "filme", ou na cena final no Vietnã (o que é aquela cena?).
Parece que o filme teve uma boa recepção na época, levou o Urso de prata do Festival de Berlim, embora certa parcela da crítica o veja apenas como exercício cinematográfico típico do começo de carreira ou simplesmente o acham chato, pelo excesso de diálogos que contém bilhares de informações neuróticas e conspiratórias retratados por câmeras anárquicas e imprevisíveis. No começo do filme, por exemplo, os três amigos conversam no que parece ser uma loja de fantasias, e a cada take mudam de lugares e roupas, como também os figurantes, sendo que a conversa que levavam parece linear e ininterrupta. Neste ponto, o filme se distancia da filmografia elogiada de De Palma, notável pelo primor técnico e elaboração de complexos planos-sequência de inspiração hitchcockiana (o nome de Hitchcock aparece no filme no livro-referência de Truffaut).
O que impressiona no filme talvez seja um misto de seriedade nas críticas ao governo americano, em que soldados recebem ordens para matar civis no Vietnã, com uma irreverência característica do movimento de contra-cultura americano, em que soldados ignoram ordens e fazem "filmes amadores" com civis no Vietnã. De profunda influência da nouvelle vague francesa (também há referências a Blow Up, de Michelangelo Antonioni, filme com o qual Greetings dialoga bastante), o filme parece ser um Acossado situado em 68, de recursos baixíssimos, com belmondos que preferem conversar sobre sexo ou política nas ruas de Nova Iorque, ou usando drogas em festas alucinantes.
O filme teve uma "continuação" (uma evolução, aparentemente) em 1970, Oi, Mãe! (Hi, Mom!) com os mesmos roteiristas e também dirigido por De Palma, com De niro no mesmo papel e Gerrit Graham interpretando um revolucionário em outro papel (este filme possui uma cena absurdamente genial conhecida pelo nome de "Be Black Baby"). Mas isso não vem ao caso, Greetings possui seu brilho próprio por mostrar que o fim da década de 60 trouxe junto com a liberdade das linguagens um conceito fundamental para se entender a contra-cultura americana: o descompromisso, que Brian De Palma soube filmar como um mestre mesmo não parecendo Brian de Palma. Outros detalhes do filme são a fotografia sempre colorida e a trilha sonora composta e interpretada por uma banda da época. Por fim, filme obrigatório da filmografia de De Palma, Greetings pode não agradar a todos, talvez por dever ser apreciado mais como um documentário cômico do que por ficção, mas que mesmo assim oferece qualidades impressionantes para o começo de carreiras tão importantes para o cinema, além de ser engraçadíssimo.
"Greetings, Greetings, Greetings, would you like to go away?"
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