A história da criação do mito por trás de "Rocky" já é clichê. Stallone após assistir uma luta de Ali e um desafiante desconhecido Chuck Wepner que aguentou inacreditáveis 15 rounds com o campeão, escreveu o script do filme em apenas três dias. Stallone apenas concordou em vender o roteiro de Rocky, um lutador sob a condição de que ele mesmo interpretaria o personagem-título do filme. Os produtores chegaram a oferecer-lhe 150 mil dólares para que deixasse o ator Ryan O'Neal interpretar Rocky Balboa, mas Stallone recusou a oferta. Deste modo, os produtores concordaram que Stallone interpretasse Rocky Balboa desde que ele conseguisse que a produção do filme custasse menos de um milhão de dólares, quantia obtida com a hipoteca das próprias casas dos produtores do filme. Stallone acabou sendo indicado ao Oscar na categoria de Melhor Ator em 1976 e foi anunciado com status de novo Marlon Brando. Máxima que foi se perdendo ao longo dos anos, mas aqui em "Cop Land", o garanhão italiano entrega mais uma vez uma excelente atuação...
A narrativa se passa na pequena cidade de Garrison, habitada majoritariamente por policiais que trabalham na vizinha Nova York durante o dia e voltam para suas famílias à noite. Tudo corre aparentemente bem até que o jovem Murray 'Superboy' Babitch se envolve num tiroteio e acaba assassinando dois criminosos, colocando em xeque a reputação da família, encabeçada por seu tio Ray. Uma discussão entre policiais e paramédicos quanto às provas do crime leva o Tenente Moe Tilden a investigar o local, até então administrado pelo pacato xerife Freddy. Sob a aparente tranquilidade que paira na pequena Garrison, existe uma complexa rede de intrigas e corrupção que lentamente é revelada. Stallone que ficou décadas sob a condição de heróis implacáveis, estrelando filmes de ação com enormes sucessos de bilheteria, aqui mostra novamente todo o potencial escondido que o ator possui...
James Mangold, que infelizmente participa do segundo escalão de diretores de Hollywood é um exímio profissional, entregando excelentes obras nos mais variados gêneros. Após esse seu trabalho inicial, foi responsável por entregar o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante para Angelina Jolie em "Garota, Interrompida", dirigiu o fraco "Kate & Leopold", mas em 2003 deu a volta por cima com o fenomenal e originalíssimo suspense "Identidade", comandou a ótima cinegrafia de dois cantores famosíssimos e também comandou Reese Whiterspoon para o Oscar de Melhor Atriz em "Johnny & June". Em 2007 deu um gás extremamente eficiente para o Western que andava capengando muito com "Os Indomáveis", em 2010 apresentou o divertido "Encontro Explosivo" e em 2013 talvez seu maior deslize, vem "Wolverine - Imortal" que descaracterizou totalmente o carcaju. Rsponsável por roteirizar muitos de seus filmes, aqui a assinatura do roteiro também pertence a Mangold.
O diretor foi muito feliz na composição de sua equipe na parte técnica. A fotografia de Eric Edwards é de cores frias, azulada mergulhando os personagens num clima soturno e sombrio, enfatizando o caráter duvidoso e misterioso da maioria dos personagens. Outro quesito que colabora no clima sombrio da película é a trilha sonora do compositor Howard Shore, que utilizando muito piano e acertando em cheio nas musicas que tocam no velho toca-discos de Freddy, contribui bastante para realçar a áurea melancólica do personagem em várias tomadas. Pontos conjuntamente para o estupendo roteiro de Mangold, que com calma e paciência, vai conduzindo a narrativa sem pressa aplicando zooms que nos aproximam lentamente dos personagens e closes que buscam realçar suas expressões e reações nas calorosas discussões que permeiam a narrativa. O diretor também acerta ao fazer com que o subúrbio e a própria Nova York sejam personagens ativos na trama do longa.
No elenco de apoio, temos participações muito especiais de Annabela Sciorra, O eterno exterminador T-1000 Robert Patrick e o sempre discreto Michael Rapaport. Ray Liotta pra mim é um cara engraçado. Com extremo potencial após atuar em "Os Bons Companheiros", foi sendo relegado ao ostracismo ao longo da carreira, participando de projetos cada vez mais irrelevantes. Aqui o ator ainda gozava certo prestigio e entrega um trabalho razoável. Um dos meus atores favoritos, Keitel compõe um antagonista assustador, que parece capaz de fazer qualquer coisa para manter o controle do local idealizado e fundado por ele, criando um personagem corrupto e detestável, é verdade, mas que jamais soa caricato ou unidimensional graças ao desempenho do ator. De Nro se mostra imponente, com grande presença de tela e somente um camarada com os atributos dele para trazer veracidade a composição do Tenente Moe Tilden.
Mas o melhor do filme realmente é John Rambo. Surgindo barrigudo e de andar vagaroso, Stallone compõe um personagem de fácil identificação. Com fala mansa, e tímido, Freddy evita olhar diretamente nos olhos de alguém, andando cabisbaixo e nas sombras, meio que receoso com julgamentos das pessoas, adotando um postura sempre na defensiva, evidenciando o tanto que não conseguir ser policial em Nova York frustrou sua trajetória. Ao lado de "Rocky" e "Taberna do Inferno", aqui, Stallone entrega seu melhor trabalho. Hoje a fita permanece meio num limbo, desconhecida da grande massa e que infelizmente tende a permanecer nessa situação, uma pena. Os últimos trabalhos de Mangold curiosamente não contem as mesmas qualidades que seu primeiro filme, será que "Cop Land" foi sorte de principiante? Ainda é cedo pra saber, de toda forma, não é todo dia que vemos Stallone barrigudo detonando tudo por aí...
Esse filme é muito bom, mas tá meio abandonado. Valeu por relembrar, meu amigo.