Certos camaradas do cinema mundial dispensam introduções e comentários fervorosos com adjetivos formidáveis e espalhafatosos. A contribuição dada por Dario Argento ao gênero de terror, não só o terror mas para a história do cinema é indiscutível até mesmo para quem não conhece a fundo seu trabalho ou não o aprecia. As características de seus projetos são reconhecidas de imediato e sua paixão pelo gênero não menos que formidáveis. Em atividade desde o início da década de 70, Argento já entregou mais de 20 filmes para o mundo com obras que se em suma não são todas obras-primas, até seus filmes razoáveis possuem no mínimo dois ou três aspectos que valem a conferida. Certos diretores possuem filmes que distorcem um pouco de tudo já realizado, como por exemplo o filme "História Real" de David Lynch que é considerado um filme 'normal' em relação a todos os outros realizados em seu currículo. Não que "Giallo" fuja de tudo que já foi proposto na carreira de Argento, mas muito alegaram que o filme não possui elementos básicos que o consagraram. "Giallo" se mostrou meio que uma tentativa frustada do diretor de retomar os louros do passado...
O filme tem em seu mais fraco ingrediente o roteiro escrito a seis mãos, fato alegado por uns já ser um mal sinal, por Sean Keller, Jim Agnew e contribuição do próprio Argento. Ganha pontos criando situações inusitadas e pouco a pouco avança aumentando o suspense e não sofre do mal de outros títulos lançados no final da década de 90, inicio 00 que é o arrastamento e o adiamento do clímax e resolução do desfecho, mas seu principal defeito é o 'empréstimo' simples de obras do gênero e o tal do clichê que são empregados ao máximo sem vergonha nenhuma de soar repetitivo. Outro fato que se deu na época de seu lançamento é o duplo sentido dado ao título da película. "Giallo" para os mais desavisados ou até mesmo fãs fervorosos do diretor, não lembram muito o auge desse sub-gênero criado a muito tempo atrás para os órfãos do 'western spaghetti', os principais atributos que deixaram o diretor famoso a mais de 50 anos não se aplicam aqui e outro principal fator para desmerecer um pouco a obra é a falta de personagens cativantes e interessantes que era primordial que houvesse para nos apegarmos e torcermos por eles.
Os atributos que seriam indispensaveis gerados em outrora como as sempre luvas de couro negro, estrangeiros em suma maioria americanos dentro do país italiano para solucionar os crimes e assassinatos quase sempre procurando pistas bizarras, as cores saturadas e a câmera com closes ordinários ficam bastante discretos nessa obra. Argento se mostrou preguiçoso em vários aspectos como o Inspetor Enzo Avolfi interpretado pelo sempre competente Adrien Brody aqui é italiano nato que não fala italiano, não tem ao menos uma porra de sotaque para falar que tirou umas férias na Califórnia e desaprendeu a falar italiano, e também não fala italiano com seus outros colegas policiais. Ainda uma cena pra lá de desnecessária mostrando o inspetor indo apanhar uma certa lista com um bibliotecário e posteriormente vemos que essa lista não acrescenta em nada para a investigação muito menos para a trama.
Além da preguiça o outro fator que contribuí em muito para o coroamento da obra seja uma coisa que antes nunca havia faltado para Argento, até mesmo em suas incursões em solo americano, a tal da ousadia. A fotografia aqui, antes sempre emporcalhada, destonante e escura aqui é limpinha demais, correta demais. A música de Marco Werba é apenas satisfatória, não carrega o peso do suspense nas costas e a edição/montagem de Roberto Silvi mostra cortes rápidos e as vezes confusos, até mesmo as sempre presentes sequências ultra-violentas de sangue falso exagerado, tripas, mutilações e todas atrocidades que os assassinos cometem aqui se mostram covardes e serenas, aqui quase que desaparecem. E Emmanuelle Seigner surge para provar um dos poucos defeitos do autor sempre presente em seus filmes a má direção de atores. Não que a francesa seja uma péssima atriz, mas aqui ela apenas faz caras e bocas e não traz dinamismo a obra em seu resultado final.
O único acerto indiscutível da fita tenha um nome: Adrien Brody. Aqui o incansável inspetor Avolfi é implacável e sempre seguro de suas ações, mesmo que precise utilizar de artefatos e artimanhas não convencionais e que se mostrem muito pouco ortodoxas. Avolfi trabalha sozinho, mas dá o braço a torcer com o surgimento de Linda, mesmo que ele deixe ela obviamente em segundo plano na resolução da tarefa. Acho que Brody não sofreu da "Síndrome da Estatueta do Oscar", mal que acaba atingindo muitos que vencem a estatueta dourada, sendo relegados posteriormente a papéis e filmes medíocres como casos de Murray Abraham e Zellweger, o fato é que Brody sempre faz um excelente trabalho trás câmeras estudando muito antes de dar vida a seus personagens.
O trabalho mais diferente de Dario Argento. Provavelmente o espectador poderá pensar inicialmente que é em ”Giallo- Reféns do medo” que o diretor retorna às suas raízes que um dia o fizeram ter o prestígio que o próprio tem hoje, mas com o decorrer da trama, o filme muda de aparência e finalmente o espectador pode perceber que ainda não foi aqui que Dario Argento retornou ao giallo, pois observando pela visão tradicional este filme definitivamente não é um giallo, e muito menos o filme que muitos esperavam ver. Tem mais erros do que acerto? Tem. Mas não deixa de ser um produto com selo Dario Argento. Em dias que os filmes de suspense policiais estão cada vez mais medíocres, "Giallo" ao menos tenta ser um diferencial com qualidade e mesmo que não consiga merece ser assistido. Deslizes em carreiras existem aos montes, são poucos os diretores na história que possuem currículos inabaláveis. Pode desagradar em muito os fãs do italiano, talvez possa ser um filme incompreendido, no final fica aquele gosto de quero mais e o mais sensato a fazer é rever alguns clássicos do diretor.
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