Em pleno ano de 1970, o que se passava pelo cinema americano era uma necessidade de renovação que se tornava realidade, gêneros e estilos imortalizados pelo tempo ficavam para trás. O faroeste clássico não era mais realizado, Peckinpah ja havia dado novos ares ao oeste no cinema americano com seu Wild Bunch e na Europa, um grupo de italianos já tinham reinventado o gênero na década passada. Logo se vê que nada contribuía na realização de um western classicista em plenos anos 70 e acreditar em sua produção vista de hoje é improvável, mas aconteceu.
Howard Hawks, no fim da sua carreira, dedicou algumas obras a uma visão de um mundo que estava acabando. O fato de seu filme está meio que deslocado no tempo não significa que ele estava criando uma resistência e negando-se a enxergar a evolução da arte, suas obras da época possuíam um olhar sincero e auto-avaliador e que assumiam seu fim. Rio Lobo não é propriamente um crepúsculo em todas suas características, mas a intenção de se passar por um, é clara.
Primeiro que sua estrutura é semelhante a outras obras do diretor e aqui ele parece tirar sarro de si mesmo de uma maneira que deixa claro não se importar em esta numa época distante da sua. A ação do filme é totalmente clássica, distante da violência spaghetti ou de Peckinpah, Eastwood ou Siegel, o clima bem humorado também se faz presente remetendo às grandes obras do gênero. Um arco bem elaborado entre esta obra e outras duas de Hawks também colabora com a mística passagem do tempo que não é negada. Se em Rio Bravo, John Wayne é o xerife, em El Dorado (sua outra obra fatalista) o astro se une ao homem da lei, ja aqui ele luta contra um xerife corrupto. O oeste do diretor sempre foi um ambiente de pessoas não confiáveis, mas aqui ele coloca isso no limite, assim como seu cinema. Mas o engraçado é que ele lança uma evolução social, as portas dos saloons não são mais todas como a tradicional e há até um agente funerário, que comicamente sabe o exatamente o momento de sair ao trabalho, basta ouvir tiros, o tempo passou. Inclusive aqui os personagens agem com embasamentos políticos, já que a historia se inicia próxima ao fim da guerra, seus interesses se alternam quando ela finalmente acaba e as divergências políticas podem ser deixadas de lado, e antes inimigos, se tornam amigos, mas até com isso o diretor brinca genialmente, quando os personagens de Wayne e Rivero falam com descaso da guerra e zombam de estarem, agora unidos, uma vez que eram inimigos.
Os filmes de HH são movidos por uma lógica interna, onde o desenrolar dos acontecimentos são determinados por interesses individuais e coletivos numa combinação de fatores propositalmente encaixados para que o pensamento grupal se sobressaia, sendo que suas tramas não possuem fins ideológicos e sim apenas alcançar o objetivo de cada um. Ou seja, esse pensamento sempre imposto com leveza pelo diretor, ressalta a importância da coletividade em função do indivíduo, a ação em conjunto ocasionada por conseqüências distintas. Rio Lobo é uma autentica obra hawksiana. O longo prólogo se assemelha ao de El Dorado, servindo como uma ambientação extraordinária e após o ponto de ruptura com o fim da guerra e o início da busca pelos interesses pessoais a atmosfera do filme já está totalmente instalada.
Este exemplar da fragmentação de um cinema inigualável na historia, se sustente por todo o tempo unicamente pelo ideal da auto-representação, o que o torna ainda mais válido e importante. Essencial dentro da obra de Hawks. Todos seus elementos tradicionais, dentro do faroeste principalmente, estão presentes. Sua semelhança com outras obras é proposital, como esclarecimento de que estamos num mesmo ambiente, mas elementos são inseridos ou alterados para que a análise de cinema e tempo seja feita pelo próprio filme. Mas o grande mérito do filme é se distanciar de simbolismos e temáticas excessivas para chegar aonde quer, bastou apenas uma historia simples a ser contada e foi criado um verdadeiro testamento.
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