O filme Ponto de Mutação (Mindwalk) de 1990, traz diversos diálogos profundos baseados no pensamento do austríaco Fritjof Capra, importante teórico da física que desenvolve pesquisas sobre o que é chamado “Pensamento Sistêmico”, uma visão global do mundo e da ciência, que Capra desenvolveu através de análise e comparação entre a ciência ocidental e oriental. O filme produzido em cima do livro de Capra publicado em 1983 tem como diretor Bernt Amadeus Capra.
Analisando a obra podemos considera-la brilhante ou um verdadeiro fracasso. Um fracasso como filme e brilhante como discurso. O cenário da história é a bela paisagem do Mont Saint Michel, uma ilha rochosa onde foi construído, no século XIII, uma espécie de castelo/santuário para São Miguel. Essa ilha fica em contato com o continente todos os dias, de acordo com a maré e desde muito tempo vem sendo modificado pelo homem, estando previsto para 2012 ela realmente se tornar uma ilha, com a construção de uma barragem que irá elevar a quantidade de água no local.
Visitando este belo local estavam Thomas Harriman (John Heard), um poeta não muito famoso e seu amigo, Jack Edwards (Sam Waterston) que concorreu às eleições a presidência dos Estados Unidos, mas perdeu e agora buscava descansar um pouco em contato com seu velho amigo. Os dois iniciam uma conversa e casualmente se encontram com Sonja Hoffman (Liv Ullmann), uma “ex-física, ex-americana e ex-eleitora”, que acabou por abandonar seu trabalho devido à utilização dos resultados de suas pesquisas serem empregados na indústria armamentista americana, hoje ela mora sozinha na localidade, sendo visitada por sua jovem filha, Kit Hoffman (Ione Skye). O filme vai se desenvolvendo em torno da conversa entre os três e paralelamente o conflito de Sonja e Kit, que não conseguem conviver bem, mas este pequeno gancho na história é bem pouco aproveitado.
Thomas serve na história apenas para citar obras de literatura, pois seu personagem é pouco aproveitado e basicamente concorda com tudo que Sonja diz. O embate fica entre a visão ampla de Sonja, baseada no discurso de Capra, e a visão tradicional e fragmentada de Edwards. A conversa deles vai passando por diversos assuntos, focados nos avanços científicos e nas possíveis soluções que a política poderia trazer. O filme busca mostrar que a política não irá resolver nada se continuar igual, pois ela “confunde a todos” e acaba tapando os problemas com um cobertor curto, que é puxado de um lado pro outro, sempre deixando espaços visíveis e expostos a mais problemas. A solução que o filme propõe, através de Sonja, é a mudança de visão das pessoas, a mudança de atitude e pensamento. Pois a visão mecanicista instaurada hoje é ruim, ela enxerga o mundo, a natureza e os problemas como peças de um relógio, nunca o consertando por inteiro, mas focalizando suas ações nos problemas diretos. Essa visão mecanicista acaba gerando a especialização, de forma que um médico sabe resolver os problemas da mão direita, mas não sabe nada sobre a esquerda, por exemplo.
A crise de percepção que o filme trabalha fica bem exposto em falas pontuais e muito interessantes introduzidas pelos personagens como “Crianças pagam com fome e morte a divida externa de seus países”. Outra ideia interessante que o filme aborda é o velho pensamento de que o homem domina a natureza e esse domínio é patriarcal, onde a mulher é o ser ligado à natureza e que ela deve ser também dominada. O filme constrói este pensamento de que somos parte de uma teia inseparável de relações em uma dança cósmica de destruição e criação e que para modificarmos algo, devemos pensar em processos e não em estruturas, baseados na criatividade como elemento fundamental para a evolução.
Se o discurso se mostra interessante não se pode falar o mesmo do desenvolvimento do filme, já que ele se apresenta lento, cansativo, monótono e sem algo que prenda o espectador. É um filme bem “cabeça” mesmo, pois ele não serve para entreter, tirando uma ou outra boa sacada, como a frase “sou um homem prático, sou do Missouri”. Os personagens são meros conceitos bem elaborados, mas nenhum pouco aprofundados, tendo histórias paralelas apenas citadas.
Um fracasso como filme, Ponto de Mutação serve para difundir o discurso de Capra e mostrar belas paisagens e belos diálogos, mas fica longe de atingir um público amplo, uma pena.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário