Um homem costuma se definir por aquilo que faz - engenheiro, radialista, ator etc - ao invés de reconhecer as qualidades que possui, independente da sua ocupação. No longa Um Homem Que Grita (Un Homme Qui Crie, 2010), não se ouve em nenhum momento a voz do seu protagonista em um tom mais alto do que o natural, mas sentimos seu grito sufocado pela posição que um pai deveria ocupar em uma situação como a sua. O homem liga-se muito mais facilmente ao "fazer" do que a mulher, o que causa um enorme sentimento de vazio e inutilidade quando ele se encontra sem trabalho - algo que foi bem explorado no longa As Confissões de Schmidt (About Schmidt, 200_), de Alezander Payne, que tratava sobre as consequências da aposentadoria na mente masculina.
Adam (Youssouf Djaoro) tem 60 anos de idade, é ex-campeão de natação, e há 30 anos trabalha como guardião de piscina de um hotel de luxo situado no Chade, na África. Contudo, começa a ocorrer a privatização do estabelecimento e ele se vê obrigado a ceder sua vaga para seu filho Abdel (Diouc Koma), situação que o incomoda bastante por ver nela um declínio social. Durante muito tempo, Adam se estabeleceu como o empregado da piscina - como ele mesmo afirma em certo momento, "a piscina é a sua vida" -, onde podia observar as pessoas vivas diante dele, fossem jovens ou adultas, mas que lhe dava prazer de estar ali. Quando passa a ser porteiro do mesmo hotel, sente ao mesmo tempo o vazio de ser "mais um" personagem invisível daquele estabelecimento, cuja única serventia é abrir a passagem para carros conduzidos por motoristas com janelas fechadas.
Mas o que choca o espectador, na realidade, é decisão que o protagonista toma a fim de resgatar sua posição como guardião da piscina: como seu país passa por uma guerra civil, Adam precisa ajudar o governo com dinheiro ou enviando seu filho para que lute pelo país. Assim, ele toma a decisão de enviar seu filho para a guerra como uma maneira de também recuperar seu cargo na empresa, mas viverá a culpa de destruir sua própria família até que aconteça sua redenção ao final do longa. Mahamat-Saleh Haroun constrói um longa que explora a intimidade de seus personagens com naturalidade, investindo em extremos close-ups que tentam nos colocar quase dentro de suas mentes, deixando-nos à vontade para tomar partido pelas decisões que eles tomam. Seu elenco trabalha de forma sutil e delicada, com um trabalho que beira ao documental, mas com uma certa dose de poesia que surge insuspeita mesmo diante de atos tão questionáveis.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário