Quando quase 80 anos depois sento para assistir O Homem com a Câmera fico impressionado em como uma experiência visual pode ser tão impactante e impressionante sendo tão anacrônica. A simplicidade que ali é contida resulta no verdadeiro charme do filme: o olhar diferenciado da sociedade caótica que o mundo vivia, um olhar que não é possível simplesmente pelo olho humano, um olhar que apenas pode ser captado por uma câmera cinematográfica.
Utiliza-se dos recursos mais criativos, como fades singelos e montagens extremamente rápidas, coisas que até então nunca havia aparecido. Também podemos ver de tudo ali: alienação, lazer, burguesia, proletariado, população crescente, desordem no trânsito e um foco bastante curioso em relógios. A idéia do tempo parece sempre ser lembrada, o modo como o horário regrou a vida humana. Tudo isto e mais um pouco é captado por ângulos e enquadramentos sob um olhar mecânico.
Essa capacidade e originalidade exercida pelo diretor hoje é impossível de se realizar, pois a configuração atual social é prática e imediatista, contudo o que se deve de fato ser levado em conta é a belíssima análise da população. Interessante mesmo é que, durante o filme, conforme o tempo passa a trilha sonora se intensifica e sempre pára repentinamente dando também a supracitada idéia do horário.
A vida no trabalho é ressaltada e o lazer da sociedade também. E é exatamente este o ponto: só o “olho mecânico”, a câmera, consegue devassar a multiplicidade da metrópole, uma vez que essa força de turbilhões de sensações é jogada ao homem e se torna impossível observar estes novos fenômenos. Em seu ato final isso fica exatamente nítido: o diretor, por sua vez, vem a humanizar a câmera em “fechar os olhos”.
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