Eleito o melhor filme de todos os tempos pela crítica mundial, em especial pelo American Film Institute, Cidadão Kane é um dos maiores clássicos da história do cinema. Um filme absolutamente genial, diferente de tudo que já se viu. E olha que já se passaram quase 70 anos que ele foi lançado. Continua muito atual e original. Seu diretor Orson Welles que na época tinha apenas 26 anos de idade, foi considerado um gênio por ter dirigido, produzido, roteirizado e estrelado essa obra revolucionária.
Eram tempos de guerra (A Segunda Guerra Mundial), o mundo vivia um colapso, mas Hollywood não parou (Durante os seis anos de guerra, foram produzidos alguns dos melhores filmes da história, como por exemplo: ...E o Vento Levou, Casablanca, Pacto de Sangue, O Falcão Maltês e Cidadão Kane, entre muitos outros), e com isso suas produções eram ousadas e muitas delas a frente de seu tempo, como essa obra máxima de Welles que conta a fictícia história de Charles Foster Kane que de menino pobre, se torna um milionário e manipulador magnata da imprensa jornalística. O filme já começa com Kane morrendo, pouco depois de dizer sua última palavra: ROSEBUD. Um jornalista decide procurar pessoas relacionadas ao passado de Kane, a fim de descobrir o que significa tal palavra. Seria uma mulher? Uma loja? Uma cidade? Aos poucos, amigos, amantes, ex-funcionários e ex-esposas do magnata vão descrevendo quem era aquele homem que se tornou tão poderoso a ponto de interferir e mudar suas vidas.
Depois de sua morte, o filme começa com Kane ainda criança, sendo entregue pelos pais pra ser criado por um milionário. Já adulto, ele vai gerenciar o jornal e chama seus amigos pra ajudá-lo. Ganhando muito dinheiro, se torna um influenciável homem que se perde em suas próprias ambições. Não consegue manter o equilíbrio com a esposa, se deixa levar por amantes e vai perdendo as pessoas à sua volta. Ou será que as pessoas à sua volta no fundo não se importavam com ele?
Vemos com o passar do tempo, que Kane vive mergulhado numa solidão que o acompanha desde sua infância. Ele vive sempre reclamando, questionando, não se contenta com quase nada, mas ao mesmo tempo procura agradar sempre a mulher que ele diz ter amado. Kane não consegue disfarçar a frustração de sua vida, seus anseios não condizem com sua realidade de homem influente. Ele parece sempre querer gritar algo que está dentro dele, mas as pessoas não parecem querer ouvir. Num dialogo sobre a riqueza com o homem que o adotou, ele diz: “A mim só interessava as colherzinhas de prata”. Deixando subentender que nada daquela grandeza o preenchia.
Welles se inspirou (mesmo que negasse) na vida do magnata da imprensa William Randolph Hearst, para fazer o seu Cidadão Kane. Welles via na história desse homem, um riquíssimo material para começar a sua carreira cinematográfica. Mas Welles mal sabia que pagaria um preço muito alto por isso. Hearst quando soube do filme (ainda em fase de produção) tentou a todo custo impedir a sua estréia, não conseguindo, manipulou tudo e todos a sua volta para destruir o filme em sua divulgação. O magnata usou de seu poder nas comunicações pra acabar com Welles, tendo se irritado ainda mais por ter visto sua amante (a atriz) Marion Davies sendo retratada nas telas (no filme é uma cantora). Depois desse filme, Welles perdeu a confiança dos produtores (tudo por influência de Hearst) e só conseguiria terminar seus filmes através de muitos esforços seu e de seus amigos. Alguns desses filmes eam feitos fora dos E.U.A. Welles aceitava participações secundárias em alguns filmes pra conseguir dinheiro pra seus próprios filmes. A participação mais marcante em um filme que não era seu foi em O Terceiro Homem, um ótimo filme de 1949 dirigido por Carol Reed (Oscar de direção por Oliver! De 1968) e protagonizado pelo amigo Joseph Cotten que está além de Cidadão Kane, no filme posterior de Welles: Soberba (do ano seguinte).
Tudo em Cidadão Kane é revolucionário: roteiro brilhante com uma estrutura narrativa fragmentada, os movimentos de câmera com closes e elementos em segundo plano, os tetos pela primeira vez eram mostrados em um filme, o som capturava até o barulho das gotas da chuva, a excelente atuação de Welles, passando de jovem a idoso com uma naturalidade incrível. Tudo muito fantástico, um espetáculo de primeira linha. Mas engana-se quem pensa que a genialidade de Welles é fruto de um só filme. Em suas obras posteriores como Sobeba, Macbeth e A Marca da Maldade, ele imprime uma originalidade extraordinária. Suas participações em filmes de outros diretores também são marcantes, como em Moby Dick (1956, de John Huston) e O Homem Que Não Vendeu Sua Alma (1966, de Fred Zinnemann).
Há um documentário feito pela rede de tv PBS chamado A Batalha por Cidadão Kane no qual é relatado o conflito entre Welles e o magnata Hearst. É um documentário revelador e muito importante pra quem quiser saber mais sobre um dos momentos mais famosos e contundentes da história do cinema envolvendo um de seus maiores gênios. Curiosamente, foi feito também um documentário chamado Muito Além do Cidadão Kane, feito por uma rede de tv britânica que surpreendentemente fala sobre a Rede Globo e seu poder de manipulção, onde seu fundador Roberto Marinho é comparado à Charles Forster Kane (manipulador da opinião pública, viram a semelhança?).
Cidadão Kane concorreu a 10 Oscars, mas só ganhou o prêmio de roteiro original (Welles em parceria com Herman J. Mankiewicz, irmão de Joseph Mankiewicz, o diretor de A Malvada e Cleópatra, entre outros), perdendo melhor filme e direção pra Como Era Verde Meu Vale (um bom filme de John Ford, mas que evidentemente é inferior à obra de Welles). Dizem que isso foi por influência de Hearst. Mas uma coisa nós sabemos: William Randolph Hearst só é lembrado hoje por algumas pessoas em sua localidade, mas Orson Welles entrou pra história do cinema como um dos maiores gênios de todos os tempos.
O final é um dos mais surpreendentes e reflexivos da história, onde é revelado o segredo da palavra ROSEBUD.
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