[Obsessão por John Travolta em tempos de Pinochet resulta num filme bizarro e cruelmente cômico]
Raul Peralta (Alfredo Castro) sonha em ser Tony Manero. O andar insinuante, a brilhantina no cabelo e a ginga dos passos orquestrados; tudo nele remete ao protagonista interpretado por John Travolta em Os Embalos de Sábado à Noite (1977). Nas salas de cinema em Santiago, no Chile, o intérprete assiste a exaustão a performance do ídolo. De tantas exibições, sabe de cor os diálogos do filme e adora reproduzi-los num espanglês de dar nó, mas que o ajuda a fazer sucesso com as mulheres.
Sua obsessão pelo dançarino seria normal se ele não fosse um vagabundo doentio com mais de 50 anos que vive de favor no cubículo de um restaurante capenga onde mantém relações, no mínimo inusitadas, com uma ex-prostituta e a dona da casa. Mais estranho ainda é ver até onde ele é capaz de chegar quando um canal de televisão anuncia o concurso de melhor sósia de Manero.
Embora o contexto social seja a ditadura militar do general Augusto Pinochet, Raul está alheio a tudo isso. Até porque ele é – ou parece ser – analfabeto. Tudo que ele quer é ser como seu ídolo, dançar como ele, viver como ele. É bem verdade que sua disposição pela dança não acompanha os movimentos do corpo. Assim como é evidente que ele é um pária da pior espécie; pervertido e amoral. Mas o melhor de tudo é que ele é também um assassino cruel que não mede esforços de matar alguém que ousa comprometer seus objetivos. Mais interessante ainda é que ele vive em status de contemplação pelos moradores que vivem com ele
Todas essas incongruências da trama e o destino sem propósito do protagonista são jogados na narrativa de maneira proposital pelo diretor chileno Pablo Larraín. Embora o cineasta tenha destrinchado os conflitos de Tony Manero da forma mais distante e descompromissada possível, é na bizarrice de seu personagem que ele consegue abordar a crítica social. Enquanto o país vive sob um regime militar sedento em aniquilar seus opositores, criminosos como Raul Peralta levam uma vida sossegada. Em contrapartida, jovens aliciados aos ideais da oposição acabam perseguidos sem sequer saber o que é direita ou esquerda, capitalismo ou comunismo.
Tony Manero possui um humor negro singular mas as cenas de sexo indigestas e alguns maneirismos exagerados do diretor acabam resultando num filme de altos e baixos. Bom mesmo é a atuação nonsense de Alfredo Castro - premiado como o Melhor Ator no Festival de Havana. Fazia tempo que não aparecia um vilão tão anticonvencional e acidentalmente cômico como esse.
http://blig.ig.com.br/planosequencia/
O filme oscila bastante e no final da película a unica sensação que sentia em relação ao protagonista era nojo e desprezo...