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Críticas

Cineplayers

Solidificações.

7,0
Há uma certa empolgação sobre Lorenzo Vigas, venezuelano que conquistou o Leão de Ouro em Veneza por este seu Desde Allà. Vê-se que o filme foge de definições, sustenta-se muito mais nos atores do que na imagem; são os personagens que precisam dar conta – e dão – de expressar a percepção do afeto, tanto é que é Alfredo Castro, popular e experiente ator chileno, o incumbido de ditar a ação. Bom com atores, Vigas dirige de forma similar ao que Nuri Bilge Ceylan faz: investe nos diálogos e atuações, e a imagem descende do ritmo ditado pelo texto, favorecendo a imersão do público até dentro da obra. Há muito mais a se considerar e se ver.

Existe toda uma ambiguidade nas relações entre os personagens. Um homem atrai garotos jovens até sua casa, oferece a eles algum dinheiro em troca da observação de seus corpos nus. O voyeurismo encontra distintas resoluções a partir da ótica desse personagem. Com a observação enquanto consumação de desejo, o filme, a partir de sua cinematografia, torna-se objeto de nossa observação. Não escolhemos o que olhar, mas interpretamos o que reparamos. Essa, me parece, é a grande sacada de Desde Allà; abrir possibilidades interpretativas de modo análogo ao de seu protagonista. E vem surpresas!

Sobre a ideia do olhar, ainda que trabalhe com imersões e distinga campos, Vigas parece se apropriar da estética para referenciar a ótica de seu personagem central, que se masturba enquanto espia os garotos. Eles ficam sob ordem e oferta, o que esboça uma vaga referência ao que Brisseau fez em seu Anjos Exterminadores (Les Anges Exterminateurs, 2006). Diante desse fato, o trabalho dos atores implica justamente no gesto e a câmera busca cada uma das partes, fragmentando os corpos a partir de pontos de vista distintos, até quando passa a ser troca – ou reinterpretação de papeis e valores. Isso tem início quando um rapaz especificamente, Elder (Luis Silva), vivencia outro nível de relação com Armando (Castro), favorecendo a solidificação da liquidez romântica.

A imagem é o tempo inteiro capturada por uma câmera livre. Observe que ela às vezes está dispersa, sugerindo que não há preocupações com posicionamentos e tampouco artifícios simbólicos. É o movimento que interessa. O cineasta mexicano Guillermo Arriaga aparece nos créditos. Ele produziu e contribuiu com o roteiro. Seu estilo pode ser percebido, dessa vez não pela cronologia, mas pela tendência episódica que a narrativa emprega através das cenas com os recorrentes encontros e posteriores diferentes momentos vivenciados pela dupla. O roteiro abarca conjunturas que se repetem.

Seria limitar demais a obra considerá-la um simplório possível romance com temática gay. Definições não se aplicam nem mesmo ao seu gênero. Em última análise, pensaria em Desde Allà como um exercício visual composto por interpretações, assimilando o gestual como conexão ao papel da fotografia. Ao que se refere à temática, o filme lida com personagens cujos comportamentos denunciam o que decididamente almejam: o toque, a compaixão ou, de forma mais escancarada e harmoniosamente clichê, o amor. De perversões também. Então, afetos se misturam em cena com resultados dissonantes uma vez que, para alguns, afetos são estranhezas como qualquer outra novidade desconhecida também é.

Visto durante a 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

Comentários (1)

Felipe Ishac | quinta-feira, 03 de Dezembro de 2015 - 07:56

Bela crítica

Parece bem interessante, futuramente assistirei.

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