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Críticas

Cineplayers

Acrescenta nada a lugar nenhum.

2,0

Para que qualquer livro ou filme da saga de Stephenie Meyer desse certo era preciso, antes de tudo, que Stephanie Meyer fosse uma boa escritora. Como ela não é, nós poderíamos ser otimistas e esperar que pelo menos o diretor ou o elenco pudesse dar um jeito naquele, bem, “material”. Esse também não foi o caso em nenhum dos três capítulos inicias da cine-série, e muito menos é agora em A Saga Crepúsculo: Amanhecer - Parte 1 (The Twilight Saga: Breaking Dawn - Part 1, 2011), o novo martírio ao qual a tendência de adaptar livros populares para as telonas nos submete. Se nos primeiros episódios pudemos notar a mitologia dos vampiros ser despedaçada, subvertida, deformada, remodelada em um romance completamente inverossímil, em Amanhecer os personagens de Meyer terminam por ferrar de vez aquilo que já estava em um estado calamitoso. Além de desrespeitar toda uma tradição que é levada a sério por muita gente, esse novo projeto é também um desrespeito com o cinema e com o QI do espectador. Dividi-lo em duas partes só fará prolongar esse suplício.
 
Rapidamente gostaria de relembrar a origem dos personagens vampirescos, para poder assim expor o quão equivocada é a trama de Amanhecer. Para começar, eles não são dotados de características emocionais similares às dos seres humanos comuns. Não sentem compaixão, empatia, carinho, dó, e muito menos amor; portanto, não se apaixonam (sim, há histórias literárias em que eles se apaixonam, mas vamos nos ater ao tradicional conceito de vampiro). Isso porque são considerados, na maioria dos casos, seres que já morreram, ou mortos-vivos. Sendo assim, a lógica (dentro do terreno fantasioso, é claro) aponta para um tipo de monstro que não se relaciona amigavelmente com humanos, e só sente a necessidade de ou matá-los em busca de seu sangue, ou transformá-los em um companheiro vampiro. Fora isso eles são sensuais, têm aversão a alho e à cruz, descansam em caixões, podem se converter em morcegos, tem a pele pálida e arroxeada, não podem sair durante o dia por conta da luz do sol, etc. Claro que há variações para esses conceitos, mas no geral, podemos identificar um vampiro através dessas características.

Seguindo ainda essa linha de raciocínio, poderíamos afirmar então que vampiros, entre outras incapacidades, não se reproduzem. Afinal de contas, eles estão mortos e não sentem vontade de fazer sexo; e mesmo que sentissem, isso não resultaria em procriação. A partir dessa conclusão um tanto quanto óbvia podemos entender o quão absurda é a trama de Amanhecer, que se inicia em um casamento entre um vampiro e uma humana, que resulta na gravidez dela. Tudo já estava errado desde o princípio, lá no primeiro capítulo da saga, quando os vampiros foram retratados como seres dotados de características emocionais humanas, e Edward (Roberts Pattinson) se apaixonava por Bella (Kristen Stewart) e tinha que disputar esse amor com o lobisomem Jacob (Taylor Launtner) – sim, nada é tão ruim que não possa piorar. Desde então Bella tem se mostrado a mocinha casta e problemática que insiste em querer transar com o namorado. Mas este, com medo de que não consiga controlar sua vontade devorá-la (sem duplo sentido, ao que parece), adia o máximo possível esse entrosamento. A virgindade de Bella é, portanto, o grande tabu da história, que finalmente será rompido nesse filme.

Depois do casamento e de uma lua-de-mel que supostamente deveria ser “quente”, mas que no filme parece uma cena copiada de Malhação, Bella se descobrirá grávida – uma aberração para os vampiros da trama e para nós espectadores também. Como Edward já morreu como ser humano, só Deus sabe de onde veio o “necessário” para que Bella engravidasse. O fruto dessa relação é uma mistura de humano com vampiro, e começa a sugar o sangue de Bella ainda dentro de sua barriga para poder sobreviver, colocando assim a vida da protagonista em risco. Para piorar, os Volturi – um clã de vampiros dominantes que ditam as regras na comunidade vampiresca mundial – descobrem o ocorrido, que é extremamente contra suas leis, e anunciam uma guerra contra a família de Edward.

Há todo um cuidado desde os primórdios da história com relação à virgindade de Bella, já que isso também é um representante de sua condição humana. Bella quer ser uma vampira e quer perder a virgindade, e parece que uma ação está interligada à outra nesse mundo de novas simbologias criadas por Meyer. Para os fãs esse é um dos ápices da história, embora não se trate do clímax necessariamente. E quem diria que Bill Condon, um diretor que tem em seu currículo o polêmico Kinsey – Vamos Falar de Sexo (Kinsey, 2004), abordaria esse tema de forma tão amena e sem graça. Talvez por ser uma história muito presa ao politicamente correto, voltada para o público pré-adolescente, o tão esperado sexo entre um vampiro e uma humana acabou sendo pífio e constrangedor, contribuindo assim para que a transformação na vida de Bella também se comprometa.

Por conta disso a personagem se anula e perde sua força como protagonista. Edward então assume o posto de grande herói, ao lado de Jacob, acentuando por fim uma mensagem involuntária de que a heroína da história não passa de uma mulher fraca e submissa, que quando enfim consegue casar, passa a viver como uma frágil e omissa futura mãe. Claro que o constante estado de inanição impregnado no rosto inexpressivo de Kristen Stewart contribui para esse efeito indesejado sobre o espectador. Ou seja, até para as meninas adolescentes, o público-alvo do filme, que tanto anseiam ver na figura de Bella um exemplo para se impor e ousar ser diferente, o resultado pode soar decepcionante. Enquanto isso, a figura masculina e protetora fica por conta do insosso Robert Pattinson, garantindo assim tédio completo.

Para quem não liga para o argumento de que a saga Crepúsculo modificou vergonhosamente toda a mitologia dos vampiros, e que só está interessado no romance bobo mesmo, Amanhecer pode ser uma armadilha também. O romance é nulo (nos outros capítulos também é, mas aqui sua fragilidade fica mais evidente), a protagonista deixa de servir de incentivo às garotas introvertidas e sonhadoras, o mocinho é dispensável e o que sobra mesmo é Taylor Launtner, o único ator que faz alguma diferença positiva, mesmo sendo ridícula a presença de um lobisomem no meio dessa salada mista (embora seu corpo depilado não seja exatamente o que se espera de um profissional que anseia incorporar o personagem). Então é preciso tomar cuidado. Já ouvi muitos fãs do livro Amanhecer o elegerem como o melhor de todos. Se for mesmo, a decepção será bem maior, já que sua adaptação para as telonas se mostrou a pior de todas até o momento. Resta esperar que a segunda parte consiga ao menos recuperar os poucos atributos da série que este exemplar acaba de eliminar.

Comentários (53)

Alexandre Barbosa da Silva | terça-feira, 22 de Novembro de 2011 - 14:34

Pois é pedro paulo vieira silva KKKK quem diria? Por pior que fosse o filme da Hardwicke, os outros são ainda piores...

Caio Gouveia | sexta-feira, 25 de Novembro de 2011 - 08:18

Este é um filme feito para fãs (adolescentes, na maioria meninas)...e estes fãs têm q entender e respeitar, q qualquer "não-fã" achará o filme uma "m..." completa, como de fato ele é.

Bianca Melo | segunda-feira, 02 de Janeiro de 2012 - 12:12

Excelente crítica! Não vou mentir: eu tenho os livros, eu vi Crepúsculo em DVD e vi Lua Nova no cinema. E depois eu assisti LN no Telecine, então (ainda bem) caiu a ficha que os filmes são um saco. Não assisti Amanhecer e não acho que eu pretenda depois de ler a crítica, ou talvez eu assista só para checar a cara de inanição da Kristen Stewart, que lembra sua personagem diabética de Quarto do Pânico.

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