Após alguns curta metragens, Caru Alves de Souza resolveu se arriscar na carreira de longa-metragista, e surpreendeu a todos quando dividiu o prêmio de Melhor Filme do Festival do Rio 2013 com o excelente "O Lobo Atrás da Porta" (Fernando Coimbra, 2013). Eu que estive presente no festival do ano passado fiquei assustado, já que esperava que o filme de Fernando Coimbra reinasse soberano durante a premiação, e que se houvesse empate, "Tatuagem" fosse o escolhido para dividir o prêmio. Eu não consegui assistir o filme na época...e hoje dou graças a Deus por isso. Primeiramente, como estudante de cinema que sou, tive um ano para amadurecer meus pensamentos e minha postura crítica. Segundo, eu teria pagado pela sessão no festival do Rio, em vez de vê-lo de graça numa exibição especial que aconteceu na minha faculdade durante esta semana.
A história procura focar na vida de Helena (Rita Batata), defensora pública do juízado de menores de Santos, que vê sua vida desmoronar quando seu irmão de 17 anos, Caio (Giovanni Galo), comete um grave delito. O filme deveria partir do estudo de personagem para se tornar uma crítica, ou pelo menos uma análise complexa, à maioridade penal no Brasil, assunto polêmico que tem gerado muito barulho nas redes sociais durante os últimos anos.
O tema é interessante, quente, já que vem em ano de eleição, mas a maneira como é trabalhado é desastrosa. O filme que supostamente é um melodrama tentar ser algo mais (a diretora busca um cinema mais rebuscado sabendo das condições financeiras e dos recursos que tinha em mãos) e não consegue em momento algum, pelo contrário, falha ao aproximar o espectador da trama. Se Douglas Sirk soubesse que isso é chamado de melodrama, com certeza se envergonharia de ter feito filmes com a mesma classificação. Por sinal, Caru Alves deveria ter conferido a cinematografia de Sirk, considerado por muitos um mestre ao desenvolver personagens, pois os personagens de "De Menor" são fracos, inúteis; não trazem peso algum à uma trama. Primeiramente porque a atriz que protagoniza o filme foi escolhida de maneira equivocada e ela é o centro de toda a trama. Segundo porque o planejamento do filme parece não existir! Helena deveria nos fazer chorar ao ver seu irmão mais novo ser preso, deveria levar emoção ao espectador, mas isso não acontece pois, mesmo esforçada, Rita Batata atua sozinha, sem a colaboração de uma montagem tonal, devido à ausência de uma trilha sonora (o que faz muita diferença na troca de planos e no clímax do filme).
No início do filme, imaginamos Caio e Helena como amantes. Eles são muito íntimos, deitam juntos na praia e no sofá da casa em que moram e até se beijam, aparentemente (uma cena deixa isso muito claro), mas descobrimos que eles são irmãos ao ouvir Helena ler o testamento de seus pais. Então temos uma discussão sobre INCESTO. Assumo que fiquei animado, pois a diretora assumiria um risco enorme e mostraria coragem pelo menos. Mas depois dessa insinuação, o filme simplesmente deixa o assunto de lado, como se nunca tivesse existido. Segundo a diretora, ela e o montador resolveram deixar na montagem final pois foi algo que surgiu entre os atores durante os dias no set e eles acharam muito interessante. Mas quem disse que interessante é o mais correto para linguagem do filme? Aparentemente, Caru Alves de Souza não faz ideia do que é linguagem cinematográfica: a iluminação do filme é "chapada" (iluminada por completo - como num vídeo do portas do fundo ou de qualquer outro canal de humor no youtube - novamente distanciando o espectador das personagens); a cenografia não traz peso à trama e não ajuda a caracterizar Helena e muito menos Caio (que está feliz no início e de uma hora para outra aparenta ter problemas antigos); os técnicos da produção não acrescentam em nada à estética do filme, ou à falta dela. É, resumidamente, um filme "feio" de se ver. Nem mesmo os planos fechados faziam sentido em alguns momentos - a profundidade de campo é inutilizada.
No final, surge a oportunidade de criticar a Fundação Casa e sua situação precária, mas nada acontece e o filme toma um rumo completamente previzível. Parece que seus idealizadores não perceberam o tema que tinham em mãos. O tema, por sinal, deve ser a única justificativa para se premiar "De Menor". Colocá-lo ao lado de uma das obras-primas recentes do cinema nacional foi um pecado imperdoável. "O Lobo Atrás da Porta" é um filme que privilegia a linguagem, que cumpre com sua proposta e que passa uma forte reflexão para o espectador, isto é, faz tudo o que "De Menor" não consegue sequer almejar.
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