O primeiro filme de Chirs Nolan já mostrava caraterísticas recorrentes ao longo de sua carreira; o desajuste, a ânsia e a busca pelo solucionamento de um acontecimento, dum fato mal resolvido ou que impossibilite seu protagonista de progredir, avançar e continuar sua vida de forma satisfatória. Seja o assassinato das esposas de Leonard em "Amnésia" e Cobb em "A Origem", passando pela obsessão de Robert em ser o melhor no excelente "O Grande Truque", a vontade de dormir de Will Dormer em "Insônia" e até mesmo os demônios pessoais e medo de morcego de Bruce Wayne na trilogia 'Batman', todos eles tem em comum assuntos inacabados. Em "Following", o personagem vivido por Jeremy Theobald intitulado apenas de 'O homem Jovem', apesar de em determinado momento ser apresentado como 'Bill', passa a angústia de ser um escritor fracassado, pobre e desempregado. Ele é um otário que nunca fez nada de relevante na vida, solitário e sem grandes perspectivas passa a seguir pessoas aleatoriamente nas ruas com um vago pretexto de encontrar inspiração para suas histórias. Ele acaba conhecendo Cobb e a partir daí ele é envolvido em uma história perigosa que vai mudar pra sempre sua vida medíocre...
Mesmo depois de uma década que separam este e 'Inception', é impossível não associar o personagem Cobb interpretado aqui por Alex Haw e por Leo DiCaprio no filme de 2010. Os dois são ladrões e mesmo que utilizem de outros meios a idéia central do roubo atua sobre o consciente e o inconsciente, sobre um fantasma de conhecimento o que é ou não realidade para os personagens e para o público propriamente dito. Até mesmo a mudança de aparência do personagem principal é motivo para causar dúvidas não? Em se tratando de Nolan, todo fato apresentado é motivo de desconfiança. 'Seguir' passa a não ser uma opção para Bill e sim um meio de agir e viver, observar as pessoas desconhecidas passa ter um significado tão importante para ele, mas ao mesmo tempo inexplicável. Ainda mais quando ele mesmo cita estar quebrando a regra principal do seu vamos dizer assim 'esquema'...
As características talvez mais marcantes da obra seja o voyeurismo e o clima noir que se arrasta durante a narrativa. O voyeur logicamente, sem a conotação sexual, mas sim o ato da observação que Bill para com indivíduos totalmente aleatórios que ele escolhe nas ruas de Londres. Já o termo noir é creditado desde a obvia 'femme fatale' loira ainda por cima, interpretada por Lucy Russel, os ambientes fechados, close-up's, contrastes e tudo o mais, mas bem Bill não é totalmente aquele cara ambíguo, sem moral. Ele só está entediado e fracassado, porém de toda forma os ambientes claustrofóbicos escuros e sujos estão ali. Já o estilo não linear de narrativa, desenvolvido com maestria na sua primeira passagem em Hollywood com "Amnésia" aqui era somente uma amostra, mas com potencial estarrecedor do que viria pela frente...
Mesmo com um time de elenco totalmente desconhecido nenhum dos rostos incógnitos deixam a peteca cair. O Cobb de Alex Haw é misterioso e elegante. Com suas roupas finas e linguajar impecável e requintado não é atoa que Bill tenha se interessado em segui-lo. Cobb em momento algum transparece insegurança ou hesitação e é a competência de Haw que garante a apreciação do personagem. Já citada antes, Lucy Russell também mostra um trabalho maravilhoso na pele do interesse amoroso de Bill. Sedutora e envolvente sua beleza impulsiona um novo ar de segurança para o protagonista da trama e a independência da 'Blonde' é característica certeira para a aptidão de sua interpretação. Temos ainda a participação de Dick Bradsell como o 'homem calvo' tipo um mafioso e o tio de Chris Nolan o policial que escuta a confissão de Bill, John Nolan. Fechando o time o também já citado Jeremy Theobald como o ingenuo e frustrado Bill está formidável e confesso que pensei que ele teria uma carreira de destaque depois do filme.
Escrito, filmado, co-produzido e dirigido pelo próprio Nolan, "Following" foi filmado na também já citada Londres, Inglaterra, terra natal do diretor. Os traços de genialidade dele já despontavam aqui com a total habilidade demonstrada para contornar o baixo orçamento disponibilizado para a reprodução da película. Para se ter uma idéia, as filmagens e trabalho de pós-produção demoraram algo em torno de um ano para serem concluídas, devido o fato das rodagens serem todas feitas apenas nos fins de semana já que o equipamento cedido para trabalho ser bastante limitado e outra, a maioria da equipe e atores possuíam outros compromissos e somente aos domingos e com sorte nos sábados podiam participar das gravações. Filmar em preto e branco com uma câmera 16 mm também não foi uma opção, mas sim, outra redução nos gastos, já que o preto e branco escondia vários outras restrições. Em grande parte do tempo, Chris Nolan filmou sem equipamento de luz profissional, usando apenas a luz ambiente e pra fechar com chave de ouro e comprovar o extremismo do quão barato a fita precisava ser, várias locações eram casas de familiares e amigos!
O vai e volta da trama intercala quatro tempos distintos da vida de Bill e se você acha isso já um pouco complicado, passe longe então de "Inception". Nolan sempre soube escalar não só um time de bons atores, mas também de sua equipe técnica. Se em "A Origem" Lee Smith apresenta um trabalho que deveria ter sido ao menos indicado ao Oscar, aqui Gareth Heal também não faz feio. Alias, Nolan também participa desse intenso trabalho de edição que é imprescindível para resultar em soberba dinâmica a narração que aos poucos vai dando forma e se encaixando completamente em seu final. Ampliando e dando força extrema a obra, o tom documental transposto em vários momentos se encaixa perfeitamente no relato emocional e pessoal do protagonista. Se Bill segue pessoas nas ruas, além de seguirmos ele também como uma espécie de outro voyeur, um coadjuvante escondido por enquadramentos fechados e cerrados.
Chris Nolan é gênio? Provavelmente não, mas pra mim o cara funciona. E muito ainda por cima. Em seu primeiro filme, infelizmente nunca lançado em 'home' aqui no Brasil, o cineasta nos brinda com uma história original e talvez já namorando o que viria ser mais de uma década depois "Inception", pois seu conto é bem estruturado e devido as limitações e regrado orçamento rapidamente deu o que falar na terra do Tio Sam. Não atoa hoje o cara tem carta branca por lá com seus projetos. O filme além disso tudo é curto, pouco mais de uma hora e dez de duração. Em determinado momento, vemos Bill em uma parede com posteres de Marilyn Monroe e Jack Nicholson em "O Iluminado", provavelmente homenagens do diretor. Talvez o mais curioso seja uma porta com o logo do Batman no centro... Será que Nolan em sonhos, já adivinhava seu futuro?...
Saber trabalhar com pouquíssimo orçamento não pra qualquer um. Tem que ser bom. E isso todos nós sabemos que ele é. Baita filme. Baita diretor. Baita texto.
Não boto muita fé no Nolan, apesar do começo de carreira dele ser bom. Belo texto! 😁
Nolan é um baita cineasta que daremos inveja, para as futuras gerações, que assistimos os seus filmes no cinema. Baita FILME. Baita diretor. Baita texto.[2]
Nolan é um baita cineasta que daremos inveja, para as futuras gerações, que assistimos os seus filmes no cinema. [2]
Obrigado a todos!