Os primeiros encontros entre índios e o povo branco deve ter sido uma anarquia danada. Porra, os índios coitados, estavam ali de boa na lagoa, sem incomodar ninguém e eis que a 'super hegemonia' caucasiana aparece pois eles são donos da verdade e sabem o que é melhor para todos não é mesmo? Podemos comparar as destrutivas conquistas da Europa nos séculos XIV A XVIII ao holocausto imposto por Hitler. Um choque não só de culturas, mas também de vida, ninguém perguntou ao índio se ele queria aceitar Jesus, se podia desmatar e tomar tudo o que era dele, simplesmente suas posses foram arrancadas sem dó nem piedade. Além da retirada de bens, mortes e aniquilamento vários índios eram comercializados como gado, sendo tirados de suas famílias, foram tratados sem nenhum direito humano, como os africanos posteriormente. O poder que a Igreja Católica exerceu no mundo ocidental nesse período era gigantesco e eles controlavam a população através da tirania, opressão e medo, infelizmente os índios não tiveram vez frente essa autoridade...
“A Missão” trata sobre os conflitos que envolveram os jesuítas, as Coroas Ibéricas e com o Papa, culminando na expulsão dos primeiros em meados do século XVIII. O palco é a região de Sete Povos das Missões, disputada por espanhóis e portugueses, mas que com a assinatura do Tratado de Madrid (1750), foi finalmente reconhecida como possessão lusitana. O protagonista, um violento mercador de escravos, entra para a Ordem dos jesuítas como uma forma de se redimir dos seus pecados (ele matara seu irmão por um crime passional). Assim, de um carrasco, ele se torna um defensor dos índios contra os colonos sedentos por lucros, e contra os interesses das Coroas Ibéricas que começaram a ver nos missionários um grande inconveniente.
O Padre Gabriel lidera essa espécie de 'defesa' dos índios auxiliado por Fielding sem medir esforços e nem ligar para as consequências de seus atos, mesmo que custe sua vida...
Tecnicamente o filme é impecável. A fita intercala suas locações nas belas paisagens dividas entre as florestas e cachoeiras de Brasil, Argentina e Paraguai. Tudo fica claro ao fim da fita, ao questionarmos a que preço o continente sul-americano foi colonizado. De um lado os jesuítas, tentando catequizar os indígenas e tentando conviver pacificamente com eles e de outro os interesses políticos e econômico da coroa. Esse impasse extremamente violento foi determinante para os fins das missões. Joffé foi extremamente preciso na criação do cenário daquela época, com enquadramentos poderosos captando toda a beleza e imensidão das selvas. A trilha sonora é totalmente marcante, também pudera. Composta pelo mestre Ennio Morricone, a música exerce papel fundamental em determinado momento da trama, quando o Padre Gabriel toca flauta para fazer contato com os índios, rompendo as barreiras dos diferentes idiomas comprovando a força e a universalidade da música.
O figurino de Enrico Sabbatini é extremamente fiel aquele tempo, nos abduzindo e transpondo o expectador para aquela época, a maquiagem também transita em harmonia pelo século XVIII, exibindo a veracidade dos detalhes do tempo em que ocorre a trama. O bom trabalho de direção de fotografia de Chris Menges é o destaque na parte técnica, explorando com competência a absurda beleza das cachoeiras, dos rios e da floresta local. Nas poucas cenas de ação, as imagens são acinzentadas, depressivas e saturadas, contrastando com cores vivas nas tomadas nas vilas e comunidades indígenas e jesuítas, refletindo o estado de pureza e paz do local. Joffé tem um currículo interessante e irregular. Com filmes de época e mais artísticos no inicio e intermediário de sua carreira, seus dois últimos trabalhos estranhamente são um péssimo terror estrelado pela delicia Elisha Cuthbert "Cativeiro" e o péssimo "Encontrarás Dragões", Joffé foi indicado ao Oscar 2 vezes na categoria de Melhor Diretor, aqui e por seu primeiro trabalho, "Os Gritos do Silêncio".
"A Missão" mesmo apresentando uma excelente parte técnica não funcionaria se não tivesse um excelente elenco. Aidan Quinn aparece pouco e o responsável pela narração da película Ray McAnally na pele de Altamirano está razoável, quem brilha mesmo é o trio principal. O vencedor do Oscar de Melhor Ator em 1990, Jeremy Irons, está formidável ao dar vida a Padre Gabriel. De fala e personalidade serena, Irons demonstra bem a insegurança de Gabriel, afinal de contas, o padre também é um ser humano. Mesmo assim, decide seguir pelo caminho do amor, nem que pague com a vida por isso, Gabriel sofre grandes dilemas ao longo da trama ao ter que escolher entre defender os nativos da região ou seguir os ensinamentos de Cristo. Virtuosa a atuação de Irons. Liam Neeson antes dos tempos de filmes de ação também está competente na pele de Fielding e Robert de Niro apresenta extrema competência na transformação de Mendoza. No inicio o implacável e cruel comerciante vai atingindo sua tão almejada redenção com trações extremamente reais.
O filme peca mesmo na condução do roteiro escrito por Robert Bolt. Bolt retratando os portugueses e espanhóis ora tiranos ora preocupados somente com a expansão do império o que em parte não deixa de ser a mesma coisa, mas a oscilação e a falta de rumo e conclusão comprometem em muito o resultado final da fita. Por mais que Irons, De Niro e Neeson estejam formidáveis em seus papeis, não conseguimos nos simpatizar com nenhum deles, não nos emocionamos veemente e a fita adota certas vezes um tom documental que contribui ainda mais para um resultado negativo. De toda forma, a parte técnica, indicada em seis categorias do Oscar (Melhor Direção de Arte, Melhor Trilha Sonora, Melhor Montagem, Melhor Figurino, Melhor Diretor, Melhor Filme) tendo vencido somente na categoria de Melhor Fotografia, garante a conferida e "A Missão" cumpre seu papel como referencia histórica e nos prova que a colonização cobrou um preço caro, trazendo inúmeras consequências negativas, não só para o povo indígena, mas para toda a humanidade...
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