Talvez possa ser apenas uma cisma minha, mas acredito que Chaplin seja a personalidade mais influente e conhecida na história do meio cinematográfico e provavelmente seu personagem "O Vagabundo" o mais conhecido. Ta bom, talvez o personagem não seja o mais conhecido do mundo, mas em um top 10 tranquilo ele está. Um dos percursores de trabalho com mimica, sempre intercalou drama e comédia com maestria nos seus filmes. É sabido de sua genialidade e egocentrismo também, talvez característica de todos gênios e a dificuldade em trabalhar com ele nos sets de filmagem era notória. Novamente, presumivelmente ele não tenha filmes ruins ou medianos em sua carreira e sim de filmes ótimos para obras primas. "Luzes da Cidade" se enquadra na segunda categoria, uma obra que já se encontra perdida e que supostamente as novas gerações terão cada vez mais dificuldade em aprecia-la...
Com várias mudanças de narrativa no decorrer da trama, o fio da meada é o vagabundo sendo vagabundo, conhece um milionário e uma vendedora de flores cega e a partir daí, confusões e sonhos se misturam com amor e solidariedade. Após o filme "O Cantor de Jazz" de 1927, o primeiro filme falado na história do cinema, depois de um choche inicial da sociedade, no inicio da década de 30 essa prática ja era amplamente utilizada nos filmes na época. Chaplin abre mão disso e na amplitude da sua capacidade e segurança criativa decide por filmar o filme sem diálogos. Na verdade Chaplin ainda filmaria outro filme em 36 "Tempos Modernos" e só se renderia a 'fala' em 40 com "O Grande Ditador". Em entrevistas posteriores ele alegou que a fala estragaria seu personagem icônico, o que nada mais é do que pura verdade.
Chaplin não era famoso apenas por suas brilhantes atuações e direções. Constantemente roteirizava, montava, compunha e produzia seus filmes e em "Luzes da Cidade não foi diferente. A ponderação entre comédia e drama é na medida certa, não deixando que nada soe forçado ou gratuito. O contrastes entre o requinte da mansão do milionário sempre com tons frios e ***timistas momentos ao lado da floricultora são bem nítidos e fenomenais. Embora alguns critiquem os absurdos da frequente mudança de humor e personalidade do milionário, sempre alternando quando está sóbrio para embriagado possa soar forçado, para o enredo da história é absolutamente aceito e acolhido pelo público. As também paradoxais situações em que ocorrem os momentos que a florista pensar ser O Vagabundo milionário passam um que de grandiosidade...
Ao ler a noticia de que um médico poderia curar a cegueira da florista, o amor do Vagabundo por ela é tão grande, que ele irá fazer o que mais detesta na vida: trabalhar. Ai é previsível que outras grandes confusões iram encher a tela. A simplicidade das situações são tão singelas que é impossível não chorar, seja de alegria ou por comoção. Chaplin sabia mexer no calo da gente e já não somos capazes de desgrudar os olhos da tela. Pelo menos não por 1 hora e meia. Com total domínio de seu projeto, ainda existe espaço para rumores de que Chaplin possuía o final de sua historia antes mesmo de começar a produzi-la.
O time de elenco apresenta coadjuvantes cativantes e adoráveis. Florence Lee como a avó da garota cega é a tipica velhinha bondosa, sempre disposta a ajudar e ver sua neta feliz. Harry Myers como o milionário excêntrico está hilario em seus instantes de embriaguez, as cenas das festas no clube e em sua mansão quando ele se mostra generoso com o vagabundo rendem momentos divertidíssimos e seu sempre rabugento mordomo interpretado por Al Ernest Garcia é sempre um forte empecilho para o vagabundo. Já Hank Mann como o boxeador, apesar de ter um breve momento no filme é o parceiro de Chaplin na luta de boxe, demonstrando um cacoete impagável para a comédia. Fechando com a também fabulosa Virginia Cherril que apresenta um espetacular olhar perdido, manifestando ótima interpretação como garota cega e já quando enxerga também não valida comprometimento.
O discurso de solidariedade sempre presente nas obras de Chaplin com toques de superação e otimismo aqui interage e toca corações. A bondade para com o próximo aliado ao sentimento de união de simpatias, interesses ou propósitos entre os membros de um grupo ou da sociedade propriamente dita possa parecer 'bonitinho' demais, mas é assim que deveria ser. A arrogância e egoísmo que o milionário ratifica quando está sóbrio é revoltante e melindrosa. Ficamos revoltados e a sensação de injustiça aflora de imediato. Infelizmente, por vezes começamos a nos acostumarmos com tais arbitrariedades e certos valores começam a se perder, mas filmes como esse nos motiva para algo melhor e vários são os exemplos a nossa volta de bondade a serem seguidos.
Elogiar Chaplin é tão clichê quanto encabulante. Gênio máximo na direção e atuação sempre capaz de criar situações engraçadas e comoventes. E o final do filme? Talvez o casal 'Vagabundo/Cega' seja o mais belo do cinema e isso tudo sem um beijo sequer. Não sei quando foi criado o termo 'o amor é cego', mas aqui ele não poderia se encaixar melhor. É um final tenro e puro, como todo amor deveria ser e a mediana duração da película é perfeita. Não sei se é a obra definitiva de Chaplin e recomenda-la é um ato tal banal quanto obrigatório. Cercado de histórias o filme também oferece o murmúrio que Chaplin teria gravado o primeiro encontro do casal em torno de 300 tomadas, aí já da pra se ter uma noção do perfeccionismo do camarada. Patrimônio mundial da humanidade e do cinema...
O Patrick deveria integrar a equipa de avaliação de textos, pois ele sempre se mostra imparcial nos elogios e nas críticas também. Parabéns pelo texto, lucas. É um dos filmes mais lindos de todos os tempos...
Só falei a verdade, Lucas! Realmente gosto de ler seus textos e faço isso sempre que posso, principalmente se for sobre um filme que eu adoro. 😉
Cristian, que nada! Eu não teria tempo suficiente pra isso e nem acho que seja uma função pra mim. Mas obrigado pela confiança! 😋
Tempo...
Coisa cada vez mais escassa 😢
"Não importa o tempo que temos, mas o que fazemos com o tempo que nos é dado.."
Não resisti....