Shane Black construiu o enredo de “Beijos e Tiros” a partir dos elementos recorrentes do cinema noir. Há um detetive (nesse caso, um arremedo de detetive) de índole amoral, uma mulher fatal, a noite de Los Angeles como ambiente da trama e uma narração em off repleta de ironia. A opção do diretor, porém, não foi de homenagear o gênero realizando uma paródia em tom sério, a exemplo de “Chinatown” (1974) e mesmo “Sin City” (2005). A idéia era fazer um pastiche, ou seja, uma sátira debochada, que pegasse essas características do noir e as distorcesse, banhando-as com uma roupagem nova. O verniz de atualidade foi conseguido justamente agregando ao filme as duas características citadas no início do texto...
Black emprega situações da série Máquina mortífera - como a dupla de protagonistas homens que mais parecem um casal. O casal da vez é formado por um hétero fracassado e um gay machão, mas o texto é suficientemente inteligente para não estereotipá-los. O resultado é fenomenal. Robert Downey Jr. (Na companhia do medo) e Val Kilmer (Spartan) nunca estiveram tão bem na telona. E afirmo a volta de Downey Jr ao estrelato é em "Beijos e Tiros" e não "Homem de Ferro"...
Na trama, um ladrão pé-de-chinelo (Downey Jr), durante uma perseguição policial em Nova York na qual perdeu o parceiro, acaba numa sala de seleção de elenco para uma série de TV. Para a sorte dele, trata-se de um teste para o papel de um detetive que... adivinha... acaba de perder o parceiro. Sem entender bem o que está acontecendo, ele é contratado e levado para Los Angeles. Na Meca do cinema estadunidense, ele é colocado pelos produtores ao lado de um detetive de verdade (Kilmer) que será seu treinador para o papel. No entanto, depois do que parecia ser uma investigação de rotina, acaba envolvido até o pescoço num assassinato - ou vários! - ao lado da garota mais popular de seu antigo colégio (Michelle Monaghan). Tudo acontece de forma tão frenética e cheia de reviravoltas que fica até difícil reproduzir aqui sem deixar passar alguns importantes detalhes...
Apesar da violência - que pode atrapalhar o filme para os que não apreciam piadas com cadáveres, mutilações e assassinatos - trata-se de uma diversão como poucas nas últimas temporadas. Black escancara clichês para depois ridicularizá-los usando um sarcástico narrador.
Michelle Monaghan está uma delicia como sempre, será que Tom Cruise passou o ferro nela também? Enfim, A trama do longa-metragem é meio complicada, mas isso é o que menos importa; o grande truque para curtir “Beijos e Tiros” é encará-lo não como filme policial, mas como comédia despretensiosa que brinca com os clichês do gênero noir. A dica é acompanhar os diálogos e situações impagáveis (Harry tem um dos dedos da mão esquerda arrancado duas vezes na mesma noite) sem dar muita bola para detalhes como construção de personagem e coerência lógica. Visto dessa maneira, “Beijos e Tiros” é diversão garantida....
Excelente texto!
Fiquei afim de conferir este. Confesso que nem tinha ouvido falar deste....
Mais uma vez obrigado Francisco! 😁
Cristian quando sobrar um tempinho pode conferir sem medo!