Assim como a maioria dos bons cineastas subversivos, Matthew Vaungh sabe manipular todos os elementos possíveis de uma ação divertida e bem orquestrada. Pra quem não lembra, ele dirigiu o X-Men: Primeira Classe, um dos melhores da série, inclusive, e o sensacional e inventivo Kick-Ass: Quebrando Tudo. Nesses dois filmes, que marcaram a carreira dele, Vaungh mostrou não só ter inteligência pra desenvolver a narrativa encima do material base que ele tinha – quer seja o fio da meada de uma franquia ou uma série de quadrinhos – como também ser dono de uma força de vontade de fazer com que seus filmes virem poderosos chamarizes de audiência e crítica.
Suas melhores qualidades como diretor foram nitidamente mostradas em todos os seus filmes, mas é em Kingsman: Serviço Secreto onde ele extravasa por completo de onde ele tira toda a inspiração pra filmar. O filme é uma escancarada homenagem com boa doze de violência aos filmes do James Bond, no qual ele literalmente fala a respeito em várias sequências.
Como ponto de partida, tem-se um jovem rebelde de 17 anos que é preso e solto por um sujeito, interpretado pelo Colin Firth (ótimo), que se diz parte de uma sociedade secreta de espiões, a Kingsman, e o convida pra passar por vários testes até se tornar o substituto de um dos “soldados”, o Lancelot. A partir dessa simples historinha de filme de sábado à tarde surgem todos os tipos de surpresas das quais se pode imaginar, das mais hiperbólicas e extravagantes possíveis, típicas de um filme do Matthew Vaungh.
Vaungh usa em Kingsman todo o seu poder em uma ação desvairadamente violenta e criativa, jogando com todos os clichês de filmes de espionagem, como um vilão que quer dominar o mundo, aqui encabeçado pelo Samuel L. Jackson, reviravoltas nos personagens, cenas de ação desvairadas em locais inimagináveis e mulheres fatais, que aqui não tomam nenhum espaço. Da mesma forma como no Kick-Ass, o diretor começa aqui como uma história comum de adolescente que logo se transforma numa jornada imprevisível e incessante de ação, e um dos maiores méritos dele é equilibrar quase que perfeitamente os pontos mais importantes em uma boa sátira de espionagem, fazendo um filme extremamente metalinguístico, ao mesmo tempo independente.
A maneira mais fácil de conectar o público com a história é implementando recursos originais quase que frenéticos, criando cenas absolutamente marcantes, como a cena da água no quarto, a ótima cena do paraquedas e a estranha e violentíssima, mas divertida, cena da igreja. Todos esses recursos são usados por Vaungh de forma cínica, como em filmes do Tarantino, não exatamente com o mesmo poder e profundidade que eles, mas ainda assim, Kingsman tenta de tudo para chegar o mais perto possível desses filmes pop de sucesso que, apesar de não serem exatamente para todos os públicos, conseguem legiões de fãs ao redor do mundo.
Não obstante, a maior diferença de Kingsman para clássicos do Tarantino como Pulp Fiction e Kill Bill ou até mesmo do realmente superlativo Kick-Ass, além é claro de todos os apetrechos grandiosos de tecnologia, é a forma como ele procura sistematizar as cenas de violência; geralmente filmes desse tipo são ou de pancadaria sem sangue, ou sobra sangue sem nem muita pancadaria. O único problema de Kingsman nesse sentido é que nem sempre essas cenas de violência parecem se comportar dentro de um desses campos e também não consegue ficar em uma zona de convergência entre eles. Pra muitas pessoas, na verdade, isso pode ser até uma virtude a mais, porque também mostra o talento do Matthew Vaungh e a sua ousadia de colocar câmeras lentas em machadas, mutilações ou contusões. Mas é justamente por causa desse exagero de recursos que a violência às vezes passa a impressão de ser plástica demais, com aquela cara de sangue de pós-produção; típico de filmes que querem ser violentos sem ser.
Mesmo assim, é uma experiência divertidíssima e que, com certeza, se sobressai muito à maior parte dos filmes de espionagem de tela quente e revela mais uma vez um diretor crescente, que vem se mostrando cada vez mais competente para filmar e do qual sempre podemos entrar – e sair – dos seus filmes com gosto de quero mais.
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