Spike Jonze volta às telonas por meio de um gênero que nunca havia explorado: o infantil. Não abandonando suas fiéis características, o diretor consegue colocar em cada plano do filme a complexidade que traz consigo em sua obra, passando aqui um ambicioso tom de magia e sedução que os bons contos infantis deveriam trazer.
De início o que se pode dizer, sem dúvidas, é que Jonze explora o universo infantil sem cair na pieguice ou maiores clichês. Do contrário, aprofunda-se na mente de uma criança para tornar o conto de Maurice Sendak mais gracioso e criativo ainda. Spike Jonze define, por meio desta linda obra, com exatidão a função do tal “cinema de adaptação” – se é que isso existe: captar a essência do que está se adaptando e transformá-la em imagens, sons, emoções que só o cinema pode oferecer. Cada pequena passagem do breve conto aparece no filme com uma densidade e cadência única, não abandonando o foco da história original e não fugindo também da curta história do conto. Os eventos são todos muito bem colocados, a fim, talvez, de se estabilizar na mente uma história sem maiores complicações ou grandes reviravoltas.
Primeiramente somos penetrados em uma mente criativa e sombria, proveniente de um garoto de nome Max que convive com a solidão por não conseguir chamar a atenção de sua família. Jonze conduz com rapidez a apresentação do pequeno protagonista e não perde tempo com maiores detalhes, apontando de cara as maiores características do pequeno Max: sua imaginação fértil, a solidão e a depressão infantil. Logo após percebemos que tais devem ser superadas pelo mesmo quando acontece uma briga entre mãe e filho que finda na fuga do último para um lugar qualquer, que acaba sendo uma ilha aonde vivem grandes criaturas com costumes e aparência estranhos: enfim, os monstros.
É lá por esta ilha que os maiores e mais marcantes acontecimentos irão acontecer. Após uma confusa, malandra e ligeira apresentação, Max se torna o Rei dos monstros e os guia rumo à felicidade que eles, monstros, tanto almejavam. Interessante é observar como estas corriqueiras criaturas são, propositalmente ou não, parecidas conosco, seres humanos. Cada bicho parece trazer em si um estereótipo: a esposa mau humorada, o marido acomodado, o bom moço atrapalhado e nervoso, a mocinha apaixonada mas conformada, um fiel escudeiro, um isolado solitário, etc. Todos transfigurando emoções , sentimentos e oscilações intrínsecas ao ser humano. Outro fato interessante é que só conseguimos perceber estas oscilações ao decorrer da fita, quando analisamos o relacionamento entre estes diferentes seres e nosso pequeno protagonista, o que denuncia uma competentíssima construção de personalidades e relações entre estas, qualidade difícil de ser encontrada hoje, ainda mais no gênero.
O filme apoia-se sobre estes relacionamentos e não poupa análise psicológica ao falar de escolhas e consequências. Não há mau ou bom nem bem ou mal, todos são iguais, porém portadores de características distintas. E é da história de cada um destes que vamos perceber a essência do filme: um misto de melancolia, alegria, solidão, amizade e felicidade. Temos tudo dentro de cada personagem, estes sempre mudando conforme o decorrer dos fatos. Este clima um tanto contraditório é estabelecido até as cenas finais, aonde nos deparamos com um poderoso clímax que proporciona uma emoção ímpar. Não é difícil (e confesso que senti isso frente à tela) nos remetermos a grandes clássicos do cinema infantil, como E.T e História Sem Fim, por exemplo.
Em síntese, o filme emociona pela simplicidade e pela verossimilhança que alcança tratando de temas tão banais, cotidianos e, por vezes, complexos na vida de uma sociedade cada vez menos apegada a sentimentos e valores emocionais. De brinde nos deparamos com planos visualmente exuberantes a cada minuto, isto sem falar na música extremamente agradável de Carter Burwell. Um filme que, sem sombra de dúvidas, deve ser assistido. Surpreendente, emocionante, simples, apaixonante e encantador, contendo a essência daquilo que o cinema deve ser e pode oferecer.
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