Em meio a uma relativa onda de filmes sobre catástrafe, surge A Estrada, trazendo um sombrio e cinzento mundo aonde a alegria e a esperança já são sentimentos questionáveis e quase alheios ao homem. Diferente dos blockbusters já conhecidos e vistos pela mídia, como O Dia Depois de Amanhã, O Dia Em Que a Terra Parou e o recente 2012, o filme, adaptado às telonas por Joe Penhall, não se preocupa em dar vida a fatos ou contestações que argumentem contra o aquecimento global ou cria alieníginas para justificar o fim da Terra, ao contrário: em meio ao caos, trata de exemplificar a relação e os sentimentos que envolvem o relacionamento entre pai e filho. Sim, é esta a base do ótimo roteiro de Penhall, que consegue adaptar a obra de Cormac McCarthy, que ganhara, não há tanto tempo, o almejado prêmio Pulizter. Aliás, cabe aqui citarmos uma das grandes questões debatidas pelos críticos de todo o mundo quando se fala em cinema: a adaptação cinematográfica. Seja do teatro ou da literatura, o que se ouve, principalmente do público em geral, é a famosa frase “o livro é melhor que o filme”. A impressão que sempre fica é que o cinema se assume como uma arte inferior à literatura e simplismente faz o papel de colocar imagens na história que por muitos já fora lida tantas vezes, e mais, ainda sofre por “não colocar nas telas tudo o que o livro tem a oferecer”. Esta idéia, já fixada na cabeça das mentes menos intelectuais, é dotada de um sofisma exacerbado, eu diria. O fato de um mesmo enredo render a tantas manifestações artísticas é inteligente e bonito, aliás, desde que feito com competência. A adaptação realizada pelo cinema parte, ao meu ver, de uma premissa básica: deve oferecer algo que a literatura, ou o teatro, ou outra arte adaptada não pode dar. O recente filme infantil de Spike Jonze, resenhado aqui no blog, aliás, é uma boa prova disso, oferece ao telespectador sensações e sentimentos que não podem, de certo, ser alcançados por um leitor, por exemplo. Quando tais pontos são relevados com maestria, a adaptação é feita com perfeição. Em suma, é necessário que se repasse a essência que a obra orignal contem, encrementando esta com as qualidades e exclusividades que o “agente adaptador” possui. Quem teve a oportunidade de ler o livro de McCarthy e ver o filme de John Hillcoat após, sabe que, pelo menos nesta questão, a obra alcançou excelência.
Sem mais delongas, vamos ao filme. De início nos deparamos com uma família feliz, composta por poucos membros, em um ambiente claro, com cores destacadas e indiciando calma e felicidade. Logo após um curto plano neste ambiente, nos deparamos com um segundo plano, em um mundo que já não parece o mesmo: o cinza e o preto dominam, salvos pelo verde musgo das florestas abandonadas e frias de um lugar desconhecido, a população já está escassa, sobram apenas alguns refugiados e grupos de homens sedentos e esfomeados prontos a comer o que verem à frente, o clima está sempre frio e não há mais sinal de civilização. Ali encontramos nossos dois protagonistas, um homem e seu filho, interpretados por Viggo Mortensen e o jovem Kodi Smit-McPhee, respectivamente, e cujo seus nomes nunca vamos saber. Não importa, assim como a explicação para o evento cataclísmico ou apocalíptico. O que realmente vamos presenciar é a jornada destes dois seres em busca de suas salvações e o amadurecimento que esta caminhada vai trazer à relação dos dois. A primeira cena no mundo pós destruição nos traz a sensação exata do que vamos encontrar a seguir. Em mais uma parada para descansar, os dois acordam com a vinda de uma gangue que procura por carne para se saciar. Após se esconderem, os dois observam um membro da gangue destraído que acaba percebendo suas presenças, há uma pequena discussão com tom de ameaça e em um descuído o mau homem pega o filho do outro apontando-lhe uma faca ao pescoço. Em uma arriscada decisão, o pai atira no homem que o ameaçara e sai em fuga com seu filho. A partir deste momento, os dois seguem ao sul para se livrar de mais um inverno que os soa fatal. Em rumo ao sul, os dois vão convivendo em uma sintonia ímpar de lealdade e confiança e se deparando com situações que vão colocar em questão e agravar os sentimentos entre eles. É justamente nesta oscilação que vai se basear a relação entre um pai, que sofre por não saber se terá coragem de atirar, com uma arma que carrega sempre com apenas uma bala, em seu filho quando precisar e seu filho, que tem em seu mestre o exemplo ideal de caráter e honestidade, já que nascera em meio o caos de um mundo sem esperança. Trata-se de um belo filme, daqueles que aguçam o pensamento durante sua exibição e fixam na mente após ela. Uma linda obra que conta com uma muito bem escolhida locação, fotografia impecável, roteiro muito bem adaptado, efeitos eficientes e precisos, interpretações convincentes e, algumas, maravilhosas – falo de Viggo e Kodi -, uma direção competentíssima e, principalmente, a essência daquilo que só o cinema pode compreender. Falo daquela experiência única de sentarmos na poltrona e sermos surpreendidos com imagens, sons e uma história magnífica, até mesmo já sabendo do que se trata ou conhecendo todo o enredo, enfim, aquilo que só a simplicidade e a complexidade da 7ª arte pode dar. Sintetizando e voltando ao foco, The Road se trata de uma obra contundente, com um vigor extremamente forte, argumento crível e apaixonante, tudo isso falando simplismente da jornada de um pai e seu filho ao sul em busca da salvação em um planeta Terra destruído. Uma história de aventura, amadurecimento e lealdade, que comove e nos deixa boquiaberto após a sessão.
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