Através da direção de arte, fotografia e figurino, sem falar da trilha sonora original, o espectador é imerso numa interessante aura retrô-futurista (ou futurista, se olharmos com a ótica da época) e que, somada ao tratamento dado por Kubrick à temática principal da trama, é bastante pessimista quanto às suas previsões. Isso tudo contribui para que "A Laranja Mecânica" nos mostre o quanto nós não somos mecânicos, principalmente ao testar em cada espectador uma gama de emoções que vai do riso à agonia, passando pelo nojo e pela catarse.
Dentre todos os aspectos um dos que mais se sobressai é a discussão acerca da lavagem cerebral como é realizada dentro da obra. Kubrick acreditava no poder do cinema como influenciador e acertou quando supôs que seria usado para tais fins. Afinal, a lavagem cerebral ocorre tanto do modo como vimos ali (é um dos tratamentos que prometem "curar homossexuais", por exemplo) como de outros modos (a televisão caberia bem como exemplo aqui). No futuro do diretor, tudo será controlado por quem controla a mídia, de modo que até uma laranja teria suas naturalidade roubada.
Por meio da lavagem cerebral, o jovem rebelde Alex DeLarge (Alexandre, o Grande?) tem seus instintos mais intrínsecos controlados. Ele (que bem poderia ser um precursor do punk que estava para estourar na Inglaterra e, assim, constituiria outra previsão sombria de Kubrick acerca da juventude pós-moderna) é, então, reintroduzido a uma sociedade que é, por dentro, igual ao que ele era por fora: tão violenta quanto se pode imaginar. É aí, talvez, onde mora a maior crítica de Stanley Kubrick dentro de "A Laranja Mecânica": as pessoas apenas escondem os seus ímpetos de destruição por convenções pré-estabelecidas e para manter aparências, mas, quando postas diante do desejo primitivo de vingança, todas abandonam as máscaras e as mecânicas e deixam o seu lado mais natural falar.
As atuações do filme são chocantes. Malcolm McDowell, claro, rouba a cena como um perfeito anti-herói carismático e anarquista, mas deixa espaço para outros se sobressaírem, como Michael Bates, que interpreta o policial repleto de trejeitos (e que parece ter saído de algum filme nazista) e Patrick Magee, que faz o escritor Frank Alexander, um personagem de evolução bastante interessante e profundidade considerável. Falar da direção de Kubrick é chover no molhado, apesar de que, aqui, ela soa muito mais solta e menos rígida do que em outros filmes dele (apenas soa, pois o controle do elenco está, talvez, mais pungente do que nunca). E é através de uma técnica primorosa e um tema polêmico que "A Laranja Mecânica" lança uma visão de mundo bastante crítica e nada otimista. O filme, aliás, de mecânico não tem nada.
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