Filmes baseados nos universos das HQ's pipocam todos os anos nas telas de cinema, se tornando uma verdadeira megalomania financeira, já que a maioria desses filmes, a cada novo lançamento vem se tornando uma receita de bolo que não acrescenta nada, estão lá os efeitos especiais, as porradas fofas e acrobáticas onde ninguém machuca ninguém, piadas ruins feitas para crianças de oito anos, etc. O que foi deixado de lado há um bom tempo, é a deixa de que esses filmes podiam ser utilizados como uma forma de crítica social que atingiria um público bem grande, mas, desde "O Cavaleiro das Trevas", em um já longínquo 2008, ou "V de Vingança" lá em 2005, esse tipo de filme vem se tornando cada vez mais vazio e sendo só fan-service à um amontoado da massa que lotam salas por todo o mundo. Felizmente, as coisas mudaram esse ano com o primeiro lançamento da Marvel em 2018, e Pantera Negra chega sendo além de só um filme de super herói, ele vem falar de igualdade, de etnias, de política, e não se esquecendo também de ser um filme desse gênero, e o faz com diferencial, se sobressai à toda essa parafernalha que surgem todos os anos.
O filme conta a história de T'challa, personagem que nos foi apresentado em "Capitão América:Guerra Civil", de 2016, que após a perda do pai, assume o manto de Pantera Negra, e em paralelo, tem a carga de também se tornar o novo rei de Wakanda. Além disso, T'challa se vê confrontado por uma ameaça de dentro de seus domínios e se vê diante de vários questionamentos, inclusive fazendo pensar sobre as decisões de seu próprio pai como rei.
Óbvio, que se esperava um filme mais politizado dessa vez, tínhamos um elenco todo negro, tratando de situações tribais e hierárquicas, em tempo onde discussões e embates de minorias afloram à todo instante. Isso acabou incomodando algumas pessoas que taxaram o filme de ruim ou querendo ser o que não é, resultado do costume da fórmula água com açúcar que se vem tendo em geral no gênero, mas longe disso, todas as críticas contidas em Pantera Negra, não vem para soarem chatas ou "estragarem" o divertimento, como alguns disseram, pois tudo está ali fantasiado e sem soar chato, assim como foi visto em "A Forma da Água", numa escala um pouco menor, o filme ainda acerta em cheio e vem no tempo correto para servir de veículo para discutir essas questões e visões do negro em nossa sociedade, como uma das cenas em que o personagem principal é questionado onde um bando de fazendeiros poderiam ajudar em algo para o mundo, nos fazendo ver como ainda o negro é visto como um fazendeiro, serviçal, um ninguém em lutas maiores. Porém, T'challa vem quebrar os paradigmas do herói negro de subúrbio, que convive em subúrbios com drogas e outros tipos de abuso, ele é um príncipe prestes a se tornar rei, com poder financeiro para se comprar um quarteirão todo e levar crianças carentes em passeios nas naves de combate que possui, gesto este que acabou inspirando o mundo real, onde algumas pessoas pagaram para que crianças vissem o filme em um cinema.
Mas para aqueles que ainda acham que o papel desse tipo de filme é só entreter, se deixarmos o lado político e suas discussões, ainda assim temos um ótimo resultado final. O filme tem pouco mais de duas horas que passam voando, o elenco é inteiro afiado, o protagonista interpretado por Chadwick Boseman, é carismático sem soar forçado e sem a necessidade de soltar piadas cafonas a cada cinco minutos, diferente do carro chefe cabeça de lata da empresa, e tem ao seu redor um elenco feminino tão afiado quanto, Lupita Nyong'o, a intérprete de Nakia, brilha em cena, Letitia Wright, interpreta Shuri, a irmã mais nova de T'challa, que serve como a inventora dos apetrechos do herói, e também como a guerreira da família monarca do país, e sendo também o alívio cômico em algumas cenas. Mas o destaque do elenco feminismo fica para Danai Gurira, a Okoye, uma guerreira patriota que fará de tudo por seu país, seja qual sacrifício seja necessário fazer para isso, é uma das melhores personagens do filme. Nos vilões, a Marvel tem um histórico de sempre trazer exemplos ruins do tipo em seus filmes, mas dessa vez temos dois ótimos por aqui, um deles feito pelo excelente Andy Serkis, que reprisa seu papel de Ulysses Klaus do péssimo "Vingadores - A Era de Ultron", lá sendo só um coadjuvante de luxo, o que muda aqui, Andy está insano em tela, pronto para matar ou atirar em alguém, e também temos o jovem em ascensão Michael B. Jordan, na pele Erik Killmonger, que confronta T'challa e representa ameaça por motivos bastante pessoais. Daniel Kaluuya, recém concorrente do Oscar pelo ótimo "Corra!" também está no elenco e cumpre muito bem seu papel.
Unidos ao elenco, os mega efeitos especiais continuam lá, as acrobacias nas cenas de ação, inclusive uma com um carro guiado de forma bem original pelo próprio Pantera, a trilha sonora empolga e casa perfeitamente com cada cena. Destaque para o primeiro desafio ao rei, que acontece dentro da tribo no ato de coroação do rei, que se faz muito bonita, colorida e de encher os olhos. Onde há um escorregão mais sério, é na luta final, que por pausas, acaba se tornando um pouco enfadonha e arrastada, que por um pouco mais poderia jogar tudo água abaixo, mas consegue se manter e não estragar o resultado final.
Num geral, Pantera Negra se faz o real acerto da Marvel nos cinemas, o seu melhor filme até o momento, seja ele como um filme político e crítico ou simplesmente como entretenimento, funciona de forma quase excelente, lembrando outros tempos desse gênero, onde a megalomania não imperava e ditava regras. Pantera Negra é filmão!
Esse se destaca dos demais, também não gosto da Marvel, mas esse acertou a mão e vale muito a pena!