Uma rara ficção científica brasileira que com muita criatividade e sagacidade conjuntural constrói um Brasil fictício (num futuro próximo) onde Estado e Religião evangélica pentecostal praticamente se fundiram e dominaram a cultura (a ponto de substituir o Carnaval). Se falta força ou unidade narrativa, sobram boas sacadas soltas que podem abrir uma extensa discussão sobre variados temas, aí está a grande força do filme. Um filme que cresce muito em ricas releituras depois de muita ruminação.
Gabriel Mascaro perde o medo dos arcos dramáticos no que talvez não seja o seu melhor filme, mas o mais bem resolvido numa interessante dialética do cinema neste ano com Bacurau, entre a cidade e o campo.
Muita forma e pouca entrega. A fotografia é estupenda e a direção é boa, mas o roteiro entrega reflexões que não vão além do que é mostrado tela. Além disso, há um exagero em cenas de sexo, chegando a ser apelativo - e isso para um espectador que nunca se queixou disso em nenhum filme.
A hipocrisia do discurso panfletário visto de dentro, através de quem almeja a fé pura. Com visão distópica pouco distante dos dias atuais, a direção de Mascaro hipnotiza com reinterpretações de símbolos e ícones, um tom esotérico orquestrado pela performance sobriamente louca de Dira Paes.
Depois da derrapada de 'Boi Neon', Mascaro volta a acertar, unindo um tom de zuêra pulsante, mas contido, com um devidamente preocupado desenvolvimento dramático da personagem central - tudo isso inserido numa bem articulada distopia brasileira. Mas Júlio Machado não ajuda.