Apenas uma vez tem uma trilha sonora de fazer inveja a muitos filmes, e também a muitos cantores e bandas. Não é para menos, a canção “Falling Slowly” saiu da premiação do Oscar com uma estatueta. O filme conta a história de um jovem rapaz inominado (Glen Hansard) que trabalha em uma loja de consertos de aspiradores de pó com o pai, e de uma jovem também inominada (Marketa Irglová) vendedora de flores e diarista. Ele toca seu violão nas praças de Dublin todas as tardes e noites para ganhar dinheiro. É um músico muito talentoso mas que tem medo de expor sua obra. Ela é musicista e recém divorciada, que vive com sua pequena filha e sua mãe. Um dia se conhecem por acaso e acabam ficando amigos, o que nos faz imaginar que daí nascerá mais uma das tantas histórias de amor vistas nas telonas.
Contudo, o filme não é só isso. Os protagonistas do filme na verdade são mais músicos que atores, o que capta melhor a essência do filme, dois compositores que se aproximam e compõem juntos e gravam algumas dessas músicas. Inclusive Glen Hansard é o compositor dessas canções, criadas a pedido de John Carney, diretor do filme. Falling Slowly nos é apresentada em uma loja de instrumentos musicais onde a personagem de Marketa Irglová toca piano todos os dias no horário do almoço. A singela da canção conquista a todos. Outras grandes canções são ouvidas na trama como “Lies” “Say it to me” e “If You Want me”. Aliás, em se tratando desta última, o personagem interpretado por Hansard pede à personagem interpretada por Irglová que escreva uma letra em cima de uma melodia já criada por ele. Esta é uma das cenas mais interessantes do filme. Depois de escrever a letra, ela vai à padaria comprar mais pilhas para ouvir a melodia no seu aparelho portátil. A cena dura uns quatro minutos desde a saída da padaria até sua casa. Mas neste trajeto vemos, como na maioria do filme, a câmera tremida no andar da personagem, focando-a de frente. Vemos carros passando, carros estacionando e semáforos abrindo e fechando. Temos a sensação de um recorte verdadeiro na vida de alguém, a cena nos aproxima do real tamanha é a força da retratação do cotidiano. Por hora a luz desaparece, a câmera fica filmando o vazio com uma silhueta mal definida. Era a personagem de Irglová que acaba de passar por um beco mal iluminado.
Ela ainda sofre com o relacionamento acabo, assim como ele, que deixou a ex-namorada em Londres. E Dublin parece fria ao retratar a vida desses dois personagens, fechados em suas dores, mas com uma doçura a construir-lhes a amizade. Encorajado pela moça, ele resolve ir a Londres e, antes de ir, resolve ir ao estúdio gravar umas canções para levar consigo para lá, em busca de um contrato. Eles conseguem uma banda e gravam suas belas canções. Vêmos o trabalho interno das gravações, tanto dos músicos quando da pessoa responsável por mixar e ajustar os detalhes de som. Ao fim da gravação, temos uma bela cena na praia, no amanhecer, onde temos a sensação de dever cumprido, de um sonho que começa a ser realizado.
Agora podem estar se perguntando, eles ficam juntos ou cada um tenta reatar o relacionamento antigo? Ou nenhum dos dois? Deveras, esse dado no final do filme realmente não importa, porque o filme se transpõe além disso, a singeleza e a doçura que o filme nos traz torna esse dado menor em relação ao todo. Um dos melhores filmes desta década. Um estilo diferente de cinema para verdadeiros apreciadores da arte, seja cinematográfica, seja musical. Atores com uma qualidade musical absurda, e um olhar interessantíssimo sobre a vida e sobre a arte. Um dos meus filmes prediletos!
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