Passado trinta anos, surge a refilmagem de um notável clássico dos cinemas, e não estou falando de “Mad Max”, que também foi relançado, tendo o mesmo espaço de tempo entre obra original e remake. O filme em voga é nada mais que o icônico “Poltergeist – o fenômeno”, obra de 1982, dirigida por Tobe Hooper, figura competente no gênero terror, e produzida por, ninguém menos que o notório e influente Steven Spielberg.
Na época o filme causou grande impacto junto ao público, principalmente pelo burburinho midiático de suposta maldição ao redor do elenco. A pequenina estrela Heather O’Rourke mesmo, intérprete de Carol Anne, veio à óbito com apenas 12 anos de idade, após concluir o terceiro filme da franquia. Alguns admiradores do filme até relacionam “Poltergeist” ao épico “O exorcista”, não só por se tratarem de duas obras que marcaram geração, dando origem a cenas memoráveis, célebres personagens, mas por serem igualmente apontadas pelos mistérios e curiosidades que envolveram bastidores, equipe de filmagem, entre outros diversos infortúnios durante suas gravações. Sem ignorar o fato de serem dois filmes protagonizados por meninas, em que somente os primeiros alcançaram êxito, afinal, ambos tiveram duas sequências de igual modo esquecíveis.
O roteiro combina os elementos tradicionais de casa mal-assombrada, com o resgate da criança aprisionada por fantasmas. A sinopse é basicamente a mesma, sobre uma família que se muda para uma nova casa, aonde terão sua pequenina filha aprisionada por espíritos em uma espécie de dimensão paralela à própria casa, o que leva os pais a buscarem o auxílio de uma equipe especializada em paranormalidade, na tentativa de resgatar a criança das tais forças malignas.
É inevitável não fazer comparações entre os dois filmes, ainda mais se tratando de obra originária e obra revisitada. Um remake não convence simplesmente pelo o que é, e sim por seu propósito, se não, sua existência torna-se um descaso à obra anterior e sua releitura uma mera desfiguração. Portanto, colocando os dois filmes em perspectiva de acareação, avaliando as diferenças de comportamento, conceitos, hábitos e interferência tecnológica, em relação ao cotidiano familiar das duas épocas, afirmo que o novo “Poltergeist” consegue ser menos crível e mais antiquado que seu antecessor de trinta anos atrás.
Hoje, filmes sobre “casa mal-assombrada” estão desgastados, e acrescentam pouco ao subgênero, já na retratação de terror de “Poltergeist” em 82, era apresentado algo fresco, por mesclar de forma idônea o horror nas situações e a comicidade nas representações. Eu, particularmente, não gosto dessa combinação, mas reconheço a eficiência disso no original. O espectador ria do pavor, mas não em forma de descrédito. A crítica social consistente e muito bem enlaçada à história, a respeito do desencanto da população em torno do dito “sonho americano” e suas aquisições, por fim dos anos 70, era também pertinente. Os pais, por exemplo, eram divertidos, dinâmicos e até inconsequentes, do tipo que assistem TV, embalados por um baseado. Outro timming interessante se dá na forma palpável e gradual em que o fenômeno enlaça a família, terminando abrangida de forma geral e desesperada.
A nova versão, por sua vez, prefere seguir por rumos divergentes, para não dizer, equivocados. O primeiro ato até funciona, por apresentar uma convincente atmosfera de tensão, conquanto, tudo perde credibilidade após o pirotécnico e descontraído último ato do longa. Escolha arriscada para um filme que se lançou como um terror sério. Outra decisão supérflua do roteiro foi lançar uma indireta à crise econômica mundial, optando por evidenciar problemas financeiros que circundam a família, sem angariar nada à trama com isso. Assim como a irregularidade dos pais atuais por parecerem marasmáticos demais. Nem a família num todo é envolvida nos primeiros eventos sobrenaturais. Basicamente é o filho do meio quem repara algo de errado com a casa e com sua irmã mais nova. Quando os pais se dão conta de que algo está acontecendo, o caos já está presente.
Os muitos efeitos visuais aqui destituem força de cenas antológicas como, a do palhaço e a invasão da árvore pela janela. O palhaço, mesmo sendo mais expressivo, literalmente falando, parece uma versão masculina de “Annabelle”, numa tentativa visível de buscar carona na popularidade da boneca macabra, tanto que a imagem dele ganhou destaque em muitas das divulgações e em alguns cartazes. Já o momento da árvore tem uma execução mais ágil, por conta dos recursos técnicos evoluídos, porém, sem a simbologia do antecessor, não passando de um momento qualquer dentro do contemporâneo universo de “Poltergeist”.
Ao defrontarmos também as pequenas protagonistas, é muito melhor o pânico demonstrado por Carol Anne ao ser sugada para dentro de seu armário. Nem mesmo os recursos mais modernosos em relação ao rapto de Madyson conseguiram superar a forma abrupta de como Carol Anne é transportada para o outro lado. No entanto, a ideia mais estapafúrdia do novo filme fica por conta da inserção de um especialista paranormal, detentor de certa fama, por possuir um programa televisivo que aborda casos mediúnicos. Novo integrante este que não possui o mesmo carisma da primeira médium. A filha mais velha tietando esta subcelebridade, enquanto sua irmã mais nova é vítima de fantasmas raivosos, chega a ser risível. Ou essa família tem sérios problemas de envolvimento, ou eu dou muita importância aos meus entes queridos.
Reconheço a considerável e óbvia melhora dos efeitos especiais, assim como o trabalho das câmeras em suas captações. O problema é o abuso do CGI na composição das criaturas, soando exagerado, e por vezes mal feito. Os fantasmas do primeiro, apesar de limitados pela desvantagem virtual da época, eram eficientes em sua singularidade. O ponto é que, o sucesso do “Poltergeist” veterano não se deu exclusivamente por méritos técnicos, e sim, pela personalidade própria do enredo, pela unicidade da fórmula utilizada, características que este sucessor não tem. Um dos poucos diferenciais desta nova história foi à decisão de mostrarem como é o outro lado, onde habitam os fantasmas, embora eu preferisse não ver de tão mal idealizado. As imagens do lado extranatural são transmitidas ao espectador por meio de um drone, como desculpa para inserirem, inda que rápido, a chata técnica-tendência found footage, tornando tudo ainda mais banal. Outro dos poucos detalhes diferenciados aqui, porém, positivo, são as mãos que aparecem na tela da TV, em interação com as mãos de Maddy ao tocar o televisor fora de sintonia. Talvez a única boa sacada do filme. Mas o melhor de tudo foi não terem preservado os nomes genuínos dos personagens. Teriam deturpado, com certeza, a imagem impagável da loirinha Carol Anne.
Sem mais delongas, sem mais confrontações, afirmo que, a oportunidade desta refilmagem em prestar uma boa homenagem e, ao mesmo tempo, trazer novos rumos ao tema, foi desperdiçada. Não sou apreciador do primeiro, ainda que eu reconheça sua importância histórica para o cinema, entretanto, este hodierno “Poltergeist” mostra uma essência mais tacanha. O filme não empolga, não impressiona, pouco assusta, falta atitude e não faz jus ao esperado. Brincadeiras à parte, nem os “chuviscos” das TVs modernas conseguem a particularidade daqueles produzidos pelas antigas TVs de tubo.
Excelente crítica ! realmente não precisava dessa nova versão.