O autor que amava o amor
Em O Homem que Amava as Mulheres (L'homme qui aimait les femmes, 1977), François Truffaut justifica, mais uma vez, o seu alcunha de “cineasta do amor”. Através do protagonista (Charles Denner), um conquistador compulsivo, o diretor mostra a possibilidade de um homem se apaixonar por diversas mulheres, cada uma por um diferente motivo.
Charles Denner, vivido por Bertrand Morane, descreve honestamente suas conquistadas, que não têm uma beleza nos padrões hollywoodianos, mas sim admiráveis peculiaridades, como irresistíveis "balançares de vestido" e a forma firme de caminhar (como ele as descreve). Denner também “não é um Dom Juan”, mas o ar “circunspecto” dele garante seu charme. (como elas o definem)
Naturalmente, o herói da película trata muitas dessas mulheres como um simples objeto de prazer, o que não o torna um cafajeste ou um oportunista. Ele também se comporta como tal e é, quase sempre, sincero com elas - que simplesmente não o resistem.
Sem cair na tentação de julgar o protagonista, o que provavelmente aconteceria com um diretor menos hábil para tratar desse tema, um indecifrável Truffaut retrata a vida desse homem que busca a felicidade da sua forma, sem medo das opiniões alheias. O visual completamente casual dele vive em permanente contraste com a intensidade da sua vida interior.
Contado sob um único ponto de vista, com exceção do texto final, a película tem um tom autobiográfico, contada por um narrador cujas duas posições se fundem: o escritor do livro que o protagonista está escrevendo e o narrador do filme em si. As duas obras começam separadas e, com o decorrer dos fatos, assumem um único sentido.
Truffaut sempre buscou entender o amor, desde o tempo em que anarquizava ao lado dos colegas de Nouvelle Vague. Aqui, ele o faz, novamente, com criatividade e seu típico frescor. A aparente confusão fará todo o sentido para o espectador, ao final do longa. Ou ao final do livro?
No fim das contas, o amor retorna às cinzas, e os indivíduos são jogados à própria sorte, lambendo a poeira do chão antes habitado pelos espíritos livres que acreditavam em um sentimento que, de tão puro, talvez seja inalcançável para a raça humana. O tom melancólico do final deixa a impressão de que a desilusão amorosa seguirá deixando mortos em todos os lugares: da telona aos palcos de teatro, das moradias mais humildes aos palácios, da televisão ao meio das ruas.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário