“Se eu for falar da Portela, hoje eu não vou terminar...”
Desde quando consigo me lembrar, eu gosto de samba. E me felicita muito vê-lo lembrado em tantas produções do cinema nacional recente. Seja em cinebiografias como Noel, poeta da Vila ou em documentários como Cartola – Música para os olhos, mesmo que em algumas vezes essas obras não façam jus aos seus homenageados. De todas essas produções, nenhuma me toca tanto e tão profundamente como O mistério do samba, documentário de Lula Buarque de Hollanda e Carolina Jabor.
O mistério do samba é filho direto do Tudo Azul, álbum que começou a ser produzido em 1998 por Marisa Monte [também produtora do filme] e lançado em 2000, no qual a cantora garimpou sambas pouco conhecidos ou esquecidos dos compositores da Portela. Ao contrário do que diz o título, o documentário não pretende desvendar o mistério deste que é o mais brasileiro dos ritmos [ainda bem!], tampouco se pretende biográfico. É, na verdade, um filme-homenagem. Uma singela declaração de amor àquelas pessoas simples do bairro de Oswaldo Cruz. O filme cumpre seu papel de eternizá-las através de sua música e das histórias riquíssimas que elas tem pra contar.
Marisa Monte, juntamente com Paulinho da Viola e Zeca Pagodinho, ambos em menor escala, tem a função de nos fazer adentrar e nos familiarizar com este mundo de poesia, da música feita com simplicidade, de quintais e janelas dando pra rua, do trem que passa, de rodas com cerveja e miudinho. Um mundo azul e branco, cores da Portela e presente nas casas, nas roupas, nos chapéus e no coração de Oswaldo Cruz. E é perceptível o genuíno carinho e admiração que Marisa tem pela Velha Guarda.
Estão todos lá: Monarco, Casquinha, Casemiro da Cuíca, Argemiro Patrocínio e Jair do Cavaquinho, estes dois últimos falecidos durante as filmagens que duraram dez anos, Tia Eunice, Tia Doca, Tica Surica e Áurea Maria. E em espírito, Paulo da Portela, Manacéa, Mijinha, Alberto Lonato e tantos outros. E nós ficamos a nos perguntar como é possível existir tanta beleza e profundidade nestas canções nascidas da melancolia, da simplicidade, da alegria, do amor, da dor e da tristeza, porque “sem tristeza não tem samba bom”. E descobrimos que são estas pessoas que salvam o samba e por ele são salvas. E não há como não nos apaixonarmos por elas depois de conhecê-las.
Marisa Monte, já quase no fim do filme, diz que o fez porque tinha certeza de que a vida seria melhor com aqueles sambas. E ela estava com toda razão.
“Vejam que coisa tão bela, o passado e o presente da nossa querida Portela.”
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