A princípio, quando vemos o nome abreviado por “Adèle H.” nem fazemos idéia a que se remete esse “H”, mas então, aos poucos o enredo vai nos fornecendo as informações necessárias e assim descobrimos que Adèle H. é Adèle Hugo, filha do grande escritor francês, Victor Hugo, autor de obras literárias conhecidas e reconhecidas mundialmente.
A historia é baseada em diários da filha do escritor, uma obra angustiante e dolorida, minuciosamente dirigida pelo cineasta francês de grande prestigio, François Truffaut.
Não pretendo contar toda a historia da trama, mas preciso falar de alguns aspectos do enredo para discorrer meu comentário. O filme relata a historia da jovem Adèle que se apaixona pelo primo Albert, com quem conviveu desde pequena na ilha de Guernsey onde morava com a família. Adèle se entregou para Albert de corpo e alma, porém ele, como era um tenente estava prestando serviços em Halifax, leste canadense para onde foi embora sem deixar noticias alguma para Adèle. Conclusão: a jovem abandona a família na França, atravessa o Atlântico e vai ao encontro daquele que acreditava ser o seu único e verdadeiro amor.
Interessante e um dos temas mais comuns nos filmes de Truffaut a valorização do sentimento feminino, aliás, a valorização do mundo feminino. O diretor francês é um famoso “amante” das mulheres, até quem não conhece sua fama percebe-a em seus filmes, os closer fechados nos lindos rostos femininos que escolhe filmar são praticamente um marco de seus filmes. Há ate quem diga que ele saía com as atrizes que escolhia a dedo para os papeis principais, que fazer filmes era uma forma de “amar as mulheres”, e que a estreante (na época) Isabelle Adjani de apenas 20 anos que faz o papel de Adèle foi a única que não se rendeu aos encantos do diretor.
Voltando ao tema de Truffaut, neste filme não é diferente, o sentimento de Adéle não é só valorizado mas há momentos que possui vida própria, arrebata e é avassalador, a domina angustiantemente. E isso foi muito bem conduzido por Truffaut ao longo da trama. Quando ela percebe o desprezo do amado ao encontra-lo do outro lado do oceano e descobrir que ele havia abandonado ela por motivos óbvios (havia outra mulher na história), Adèle se entrega ao desespero, à angustia e à dor de se humilhar perante um homem que a desprezava.
E que momentos angustiantes Truffaut nos proporciona, aquele nó na garganta. Adèle estava tão “cega” de amores, por assim dizer, que chegou pedir ao seu pai, o respeitado poeta com quem nem falava mais, a não ser quando precisava de mais dinheiro, e agora, ela pede ao pai para escrever uma carta dizendo que aceitava Albert como genro.
Nós temos nessa trama um pai completamente preocupado com a felicidade da filha, embora não apareça em nenhum momento, as muitas cartas enviadas, o dinheiro que enviava todos os meses, contudo nada disso abria os olhos da jovem frustrada. E assim a trama é conduzida, através do sofrimento que acaba por levar a jovem amante à loucura.
O filme acaba de forma sublime e muito bela, embora triste, pois Isabelle fica louca, se perde entre os indigentes, não reconhecia mais ninguém e sua família é obrigada a ir buscá-la para interná-la. E no final ela revive o começo de tudo e não se arrepende de nada do que fez e ainda afirma que faria tudo de novo. Não é um conto de fadas que termina com “e todos viveram felizes para sempre”, mas é uma história muito bela e acima de tudo, bem contada, bem dirigida e bem atuada!
O fato do nome do poeta Victor Hugo estar em jogo também, não permitiu que Truffaut caísse no pecado de "louva-lo", não que ele não mereça, todos sabemos que sim, mas a questão aqui é outra, é tratar da filha dele, dos dramas e ressentimentos inclusive em relação ao proprio poeta. Tanto é que genialmente Truffaut se utiliza da escrita, das cartas e diarios para se referir ao poeta, de certa forma, acabou por louva-lo sem cair no pedantismo, atribuindo ate mesmo os dons de Adele, herdados do pai, de também escrever em diarios.
Para finalizar, achei incrível que Truffaut conseguiu um record de tempo de filmagem nesta película, o período em que dirigiu as gravações, as cenas, tudo, foi muito curto, de 8 de janeiro a 21 de março de 1975.
Não foi à toa que recebeu indicação ao Oscar de Melhor direção, não só por isso, é claro, mas pela qualidade e genialidade com que sempre conduz suas obras. O filme também recebeu indicação ao Oscar em mais duas categorias, Melhor desenho de produção e também, Melhor atriz para Isabelle Adjani que mostrou mais que talento em sua atuação, ela consegue nos contagiar mesmo. A fotografia, como sempre ressalto, é outro ponto forte de beleza no filme.
Totalmente recomendável a todos os amantes do cinema!
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