Há três anos foi lançado Tropa de Elite, um dos filmes brasileiros mais aclamados da história do cinema nacional. Assim como Cidade de Deus que mostrava o crime organizado de maneira ultra-realista e sem nenhuma maquiagem, Tropa de Elite mostrou além do crime organizado, a ação da equipe policial Bope, uma das mais temidas do Rio de Janeiro. Liderado pelo Capitão Nascimento (Wagner Moura), o esquadrão Bope recrutava homens para ingressar e fortalecer seu corpo tático, mas não era qualquer um que tinha peito pra fazer parte da equipe.
Tropa de Elite poderia ter se tornado o maior sucesso do cinema nacional se não fosse por um detalhe: a cópia do filme vazou e foi parar nas mãos dos “piratas” antes mesmo de ser lançado no cinema. Resultado: muita gente não quis ir ver na tela grande o que poderia ver a qualquer momento em casa, e não era cópia gravada de dentro do cinema, mas o filme em si com sua cópia bastante boa. Três anos depois é lançado sua continuação, porém com outro detalhe: o próprio diretor deixou claro que esse é pra ver exclusivamente no cinema, se referindo à impossibilidade de haver cópias. Mas uma coisa é certa: mesmo que esse filme venha a ser vendido nas ruas (dessa vez com imagem de cam, é claro), o bom mesmo é vê-lo na tela de cinema exibindo suas maiores qualidades. Aliás, qualidade é o termo que cai super bem à continuação Tropa de Elite 2 – O Inimigo Agora é Outro. Se o primeiro já era muito bom, esse agora é ótimo.
Começa de forma a não revelar muita coisa: o Capitão Nascimento é alvo de uma emboscada. Daí em diante seguimos sua trajetória (e sua narração), nos colocando dentro da penitenciária Bangu 1, onde há uma rebelião de presos liderados por um violento criminoso (Seu Jorge). Nessa que é uma das melhores seqüências dos últimos tempos em um filme brasileiro, acompanhamos o Bope entrando em ação pra tentar contornar (ou acabar de vez) com essa situação, quando é chamado um defensor dos direitos humanos (Irandhir Santos). Tudo acaba de forma imprevisível e começa então uma guerra entre policiais, bandidos e políticos (!!!). Aliás, os políticos são os verdadeiros vilões aqui, eles mentem, contratam, fazem acordos e preparam o terreno para que um grupo de policiais corruptos chefiados pelo comandante Russo (Sandro Rocha) estabeleçam uma milícia ultra-violenta nas favelas cariocas. Essa milícia detém o poder do tráfico, seja roubando e matando, seja assaltando delegacias pra roubar armas. Obviamente não vou falar mais acerca dos acontecimentos pra não estragar a surpresa de quem ainda não viu o filme, só adianto que muitas reviravoltas acontecem em pouco menos de duas horas. O Capitão Matias (André Ramiro) e o comandante Fábio (Milhem Cortaz) continuam tendo participação importante na história). Uma repórter (Tainá Müller) tenta descobrir até onde vai toda a corrupção). Um apresentador de um programa sensacionalista de TV tenta manipular a opinião pública. Se lembram daquele comandante do primeiro filme que disse aquela famosa frase: “Pra eu te ajudar, você tem que me ajudar a te ajudar. Se é pra rir, tem que fazer rir.”? Pois é, esse aqui se tornou peça-chave em toda a sujeira, ele é o líder da milícia que eu citei mais acima. Russo é o maior vilão de Tropa 2, ele é quem manipula as facções e faz a maior guerra nos morros. Mas Russo não comanda tudo sozinho, ele tem o apoio de aliados dentro da própria polícia, além de chefes de gabinetes, deputados, e o governador do estado. O diretor José Padilha não faz vista grossa, e sai atirando pra todos os lados, não poupando ninguém. Padilha que além de diretor é um dos roteiristas e produtor pode ser considerado o cineasta mais corajoso do cinema brasileiro. Tudo que ele mostra no filme não parte da mente exagerada ou paranóica de alguém, mas de fatos que são de conhecimento de todos, ele só estende toda a sujeira e o “ventilador” se encarrega de jogar pra todos os lados. Sua direção é exemplar, seca, e sem rodeios; tudo é mostrado de forma direta, sem espaço pra sub-tramas desnecessárias ou romances forçados pra atrair público mais jovem em busca de situações água-com-açúcar.
Tropa de Elite 2 não deve nada aos melhores filmes do cinema mundial. É tenso, direto e corajoso; brilhantemente dirigido, produzido e interpretado. Falando de interpretação, vale ressaltar o formidável trabalho de todo o elenco. Wagner Moura está novamente perfeito na pele do Capitão Nascimento. Ele passa ao seu personagem todo o drama e aflição, interpretando um homem que se vê acuado e sem poder confiar em mais ninguém; André Ramiro retorna com toda sua seriedade impondo respeito no papel do Capitão Matias; Milhem Cortaz dessa vez mostra outra faceta na pele do comandante Fábio. Sandro Rocha está ótimo no papel do líder da milícia, seu personagem assusta e causa repulsa todas as vezes que entra em cena. André Mattos mostra todo cinismo no papel do apresentador de TV e futuro político; Irandhir Santos faz com profundidade o papel do defensor dos direitos humanos (seu papel é fundamental para o entendimento de todo o filme); Seu Jorge está sinistro como o líder dos amotinados de Bangu 1. Todo o elenco de apoio brilha e enriquece um filme que não se preocupa em discutir fatores sociais, ele apenas joga na mesa e cabe a cada um de nós tirar nossas próprias conclusões.
Longe de filmes maniqueístas vistos recentemente que tentam exaltar figuras públicas, Tropa de Elite não joga nada pra debaixo do tapete, mas sim expondo toda a corrupção de forma crua e nada sensacionalista. O diretor Padilha optou por um tom bastante realista que chega a causar arrepios: as cenas dos bandidos nas favelas e o momento em que políticos e policiais corruptos estão numa festa ao som de samba e tiros, é de uma veracidade fora de série. Palavrões não são poupados, tudo é falado da forma mais realista, sem medo de censuras. O discurso final do Capitão Nascimento na CPI é fantástico, onde ele não poupa ninguém e diz o que todos os brasileiros tem vontade de dizer mas não tem oportunidade.
O primeiro Tropa de Elite ficou de fora, não sendo selecionado pelo Brasil pra ser indicado ao Oscar de filme estrangeiro e acabou sendo premiado na Alemanha com o Leão de Ouro no Festival de Berlim. Moral da história: enquanto alguns brasileiros não gostam de ver o Brasil sendo “mal” representado no exterior com filmes que denunciam toda a corrupção e sujeira verde-amarela, os estrangeiros não estão com essa preocupação e reconhecem o verdadeiro valor do que é bem produzido.
Andando a passos largos pra se tornar o maior sucesso do cinema brasileiro de todos os tempos, Tropa de Elite 2 é o filme mais corajoso, tenso e brilhante dos últimos anos e um dos melhores do cinema brasileiro. Exagero? Confira e tire suas próprias conclusões.
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