Para fazer uma surpresa a um recém conhecido, mulher vai até uma pequena cidade entregar um casal de periquitos. Chegando lá, ela se depara com pequenos ataques de pássaros, mas à medida que o tempo passa, as aves começam a agir de forma mortal, causando pânico e destruição.
Parece estranho, mas o que citei acima foi a sinopse de um filme de Alfred Hitckcock, diretor acostumado a utilizar seres humanos como vilões, mas que em Os Pássaros resolveu radicalizar, surpreendendo o mundo inteiro com esse que foi um de seus maiores sucessos de bilheteria. É interessante ressaltar que se trata aqui do último grande filme do mestre do suspense. Posteriormente ele faria bons filmes como Marnie – Confissões de uma Ladra e Frenesi, mas nada que se compare às suas grandes obras-primas.
Baseado em um livro de Daphne Du Maurier (a mesma autora de Rebecca, também filmado por Hitchcock em 1940), Os Pássaros é um dos filmes mais complexos e cheios de ambigüidades da história do cinema.
Quando Melanie (Tippi Hedren) chega à pequena cidade de Bodega Bay, acontece o primeiro ataque justamente com ela, quando é atacada dentro de um pequeno barco, depois os ataques não param mais, seja em uma festa de aniversário, seja contra os alunos saindo da escola, e, entre outros, quando algumas pessoas estão em uma lanchonete e um posto de gasolina ali ao lado é brutalmente atacado pelos animais,culminando depois no ataque final, quando o namorado de Melanie, Mitch (Rod Taylor), sua irmã Cathy (Veronica Cartwright) e sua mãe Lydia (Jessica Tandy) ficam presos na casa, sob o ataque feroz das criaturas.
Se Os Pássaros fosse feito por um diretor qualquer, veríamos um filme cheio de destruição e gente alarmada por todos os lados. Mas Hitchcock não era um diretor qualquer, mas um gênio que sabia como ninguém como provocar medo nas pessoas. Pra isso, ele não teve pressa em recorrer ao caos que se estabelece ali naquela cidade, optando primeiramente em nos mostrar um pouco sobre cada um dos personagens principais, entre eles, além de Melanie, Mitch, Lydia e Cathy, temos também a jovem professora Annie (a bela Suzanne Pleshette), uma antiga namorada de Mitch. Muita coisa em Os Pássaros é mais sugerido do que mostrado, para que nós mesmos tiremos nossas próprias conclusões. É interessante perceber que tudo parece acontecer depois da chegada de Melanie à cidade, um exemplo é o fato de a protagonista sempre estar com uma roupa verde (a cor dos periquitos que ela carrega no início), quando tem algum ataque dos pássaros, ela sempre está por perto, e em uma cena um habitante da cidade diz que tudo aconteceu depois de sua chegada.
Hitchcock sempre foi um diretor preocupado não em criar mistérios, mas em manter o suspense, mas aqui ele não deixa pistas do que teria causado a reação violenta das aves, e nem dá um desfecho definitivo, terminando em aberto, nem mesmo o “The end” (tão usado na época) aparece nesse filme.
O inglês Hitchcock sempre procurou ser antes de tudo versátil, não em gêneros, mas dentro das propostas do que queria mostrar em seus filmes. Em O Inquilino (1926), um de seus primeiros filmes em sua fase inglesa, ela cria um interessante enredo sobre um criminoso que lembra bastante Jack, o estripador. Em 1935, no clássico Os 39 Degraus, ele faz com que Robert Donat seja alvo de uma conspiração, uma das primeiras de suas obras em que ele fala sobre o “falso culpado, um homem que leva a culpa por algo que não cometeu, algo que seria visto com mais abrangência em A Tortura do Silêncio (1953, com Montgomery Clift), O Homem Errado (1957, com Henry Fonda) e Intriga Internacional (1959, com Cary Grant). Entre suas mais famosas obras estão: Rebecca – A Mulher Inesquecível (1940, seu primeiro filme norte-americano, vencedor do Oscar de melhor filme e fotografia, estrelado por Laurence Olivier e Joan Fontaine), Quando Fala o Coração (1945, com Gregory Peck e Ingrid Bergman), Festim Diabólico (1948, com James Stewart e Farley Granger), Pacto Sinistro (1951, com Farley Granger e Robert Walker), Disque M para Matar (1954, com Grace Kelly e Ray Milland), Janela Indiscreta (1954, com James Stewart e Grace Kelly), O Homem que Sabia Demais (1956, com James Stewart e Doris Day), Um Corpo que Cai (1958, com James Stewart e Kim Novak) e Psicose (1960, com Anthony Perkins, Janet Leigh e Vera Miles, tido por muitos como seu melhor filme). Hitchcock teve cinco indicações ao Oscar de melhor direção, mas nunca ganhou.
Os Pássaros é um filme-chave para quem quer entender a obra cinematográfica de Hitchcock, é também uma aula de como se fazer cinema. Um estudo elaborado da relação homem-natureza, onde fica sempre claro que uma vez mantidos presos, é hora dos pássaros inverterem a situação contra os humanos. A cena final em que os protagonistas são atacados pelos pássaros dentro de casa, é um primor de técnica, uma façanha magistral em que Hitchcock dispensa trilha sonora (aliás, o filme inteiro não se ouve nenhuma trilha) e mostra todo o suspense através dos ataques dos pássaros e as reações daquelas pessoas. A atriz Tippi Hedren (mãe da também atriz Mellanie Griffith) é o único ponto fraco da obra, sem muita experiência, ela não é tão convincente em seu papel, mas seria usada novamente pelo diretor um ano depois em Marnie – Confissões de uma Ladra. O final em aberto é uma das cenas mais aterrorizantes da história do cinema. Os Pássaros concorreu ao Oscar de efeitos especiais, mas perdeu injustamente para a super-produção Cleópatra. Os Pássaros é um filme magistral, uma obra-prima de um dos maiores gênios da história do cinema.
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