“Todos os filmes devem ser terminados, nem que seja às cegas.”
Em algumas entrevistas, Almodóvar disse que Abraços Partidos foi feito sob a pressão de terríveis enxaquecas. Seriam elas uma alusão à cegueira?
Abraços Partidos traz à tela o esboço do que pode ser um novo Almodóvar. Assim como em Carne Trêmula, em que faz uma transição da comédia ao drama, em Abraços Partidos Almodóvar dá sinais da incorporação de uma nova maneira de fazer cinema ao seu estilo. O filme apresenta uma proximidade muito forte do cinema comercial. Novos ângulos de câmera, cenário e até a iluminação das cenas revelam que talvez Almodóvar queira aproximar-se do que nós vemos todas as semanas no cinema, só que sem perder o viço do seu próprio estilo. Ao contrário de filmes como Fale com Ela em que o silêncio consegue falar mais que qualquer outra coisa no filme, Abraços Partidos tem boas doses de diálogos, situações e personagens que necessitam da fala para que fique clara sua razão de ser. O que também observamos é que há um abandono quase que total das cores berrantes, tão características em seus filmes, e que por muitas vezes são substituídas pelos foscos tons de cinza.
Abraços Partidos é antes de tudo um desabafo de Almodóvar. A cegueira de Mateo e a sua necessidade de mudança até mesmo no nome levam a pensar sobre como o autor sente-se sobre a sua arte. Garotas e Maletas entra no filme como uma fase superada da carreira de Mateo e que faz clara alusão a Mulheres à beira de um ataque de nervos. Estaria também Almodóvar querendo dizer que é hora de mudar?
Os sentimentos dentro do filme também são abordados de maneira muito diferente. Por muitas vezes, os abraços partidos do filme parecem ser apenas técnicos e afastam-se dele, já que esse não apresenta a intensidade de sentimento que encontramos em outros como Tudo sobre minha mãe. Aqui, a história se entrelaça de maneira extremamente sutil até que o objetivo maior do filme seja alcançado: reunir todos em volta do cinema. É metalinguagem que emociona e ao mesmo tempo choca entre as oscilações da idéia de se fazer um filme entre o primeiro e o segundo plano.
O filme tem atuações belíssimas. Penélope Cruz, eterna musa de Almodóvar está como sempre deslumbrante e emana sentimento de seus olhos. Blanca Portillo está em sua melhor forma e impressiona com toda a sinceridade do seu drama, porque o drama de sua personagem não é algo mensurável e sim abstrato, que só ela mesma entende e consegue passar de maneira magnífica. Lluiz Homar consegue cumprir seu papel muito bem, ao mostrar como a escuridão envelhece as pessoas.
Como já havia dito, Abraços Partidos é um filme de transição. Não convém então dizer se é melhor ou pior que os anteriores e sim analisar o que vem por aí. As situações em Abraços Partidos são menos polêmicas e chocantes. Já os sentimentos são menos intensos e mais reais, além de serem esmiuçados pela câmera de Almodóvar, mostrando situações como a falsa felicidade de Lena em relação a Ernesto, o ciúme silencioso de Judit e até mesmo o amor doentio e carente de Ernesto. A cena da peruca e a cena da viagem para Ibiza são impagáveis. São simplesmente dois enquadramentos inesquecíveis de Penélope Cruz. A cena do acidente também é maravilhosa. Cética, mas incrível.
Não há palavras pra explicar o final. Aquece o coração ver os últimos minutos do filme. O último beijo quadro a quadro, a montagem do filme. É o cinema da vida imitando a vida. É lindo.
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