Na cidade de Belém, cineclubes privilegiam cinéfilos paraenses exibindo semanalmente, raridades encerradas com um debate entre um crítico de cinema e o público. Dentre elas, um filme de um desconhecido diretor grego, Theo Angelopoulos, entrou em cartaz atiçando a curiosidade de uma minoria.
Até o término da sessão, desconhecia a reação dos demais, porém já conhecia a minha: Theo Angelopoulos é um diretor incrivelmente sádico para com os espectadores mais sensíveis e Paisagem na neblina é a realização de um drama infantil destinado ao público adulto, um drama repleto de cenas memoráveis, na maior parte, acompanhada ao som da agradável trilha sonora de Eleni Karaindrou.
É doloroso acompanhar todo o processo envolvendo a perda da inocência de duas crianças. Observar um garoto chorando diante de um cavalo agonizando é angustiante, mas não tanto quanto observar a irmã mais velha submetida à violência sexual por um caminhoneiro, um ato sugerido em vez de apresentado pelo cineasta grego por meio de um longo plano seqüência à Hitchcock.
Angustiante a cada segundo, torcemos para alguém entrar em cena e salvá-la, porém Angelopoulos não é um diretor norte-americano, pelo contrário, à semelhança da maioria dos diretores europeus, permite vivenciarmos intensamente e ininterruptamente o sofrimento humano de forma realista, sem excessos e sem a presença de um herói para findá-lo. Daí por diante, os personagens viverão diferentes situações durante a sua jornada pela Grécia em busca de um pai inexistente, e em troca, perderão a inocência e a ingenuidade diante do mundo, passando a observá-lo não mais com o olhar criativo de uma criança, mas com o olhar rotineiro de um adulto.
Paisagem na Neblina seria um filme entediante do começo ao fim à semelhança das produções dirigidas por cineastas europeus famosos pelo abuso de longos planos seqüências, em sua maioria, criadoras de uma experiência entediante para qualquer espectador. Porém, equivoquei-me: este recurso é utilizado com habilidade, sem entediar, pois a temática infantil regada com a comovente trilha sonora são conduzidas com competência por Angelopoulos, hábil em manipular constantemente a atenção da platéia. Ademais, fãs de Felini se deleitarão com a homenagem realizada pelo cineasta grego à obra italiana A doce vida, em uma memorável cena surreal apresentada nos minutos restantes da produção.
Paisagem na neblina é recomendável para o espectador adulto relembrar os tempos em que a vida nos forçou a deixarmos a ingenuidade de lado para adentrarmos no mundo dos adultos. E sem hesitar, digo que Angelopoulos retratou com competência, e sem recorrer à pieguice rotineira dos filmes sobre a infância, este período da vida tão comum a todos nós.
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