Martin, de George A. Romero, já entra em seu primeiro plano sem uma apresentação com créditos iniciais, sem nome de atores ou o que o figurino manda, o que pode até estranhar o espectador com o mesmo pensando que algo foi cortado - se bem que a versão primária teria 2h45, então vai saber, né?
Pois é exatamente este espírito sem explicações ou satisfações que permeia todo o filme, ao menos no que diz respeito ao protagonista: um jovem com alguns problemas psicológicos que se muda para a casa de parentes seus, onde há um velho supersticioso que acusa o primo/sobrinho recém-chegado de ser um vampiro, devido a uma maldita herança familiar. Ou seja, antes mesmo de se elaborar qualquer julgamento, deve-se aceitar o fato de que o rapaz é um ~Nosferatu~.
Só que não temos certezas durante o filme de Romero. Há toda uma necessidade visceral de derramamento de sangue vinda do rapaz, mas será ele de fato uma das criaturas míticas ou simplesmente imposição? As imagens e flashs em preto e branco são imaginação? Eventos passados de outras épocas? Ora, o próprio jovem é convencido de que tem seus oitenta e tantos anos, além de dificuldades sociais, desabafa seus atos violentos, mas, acima de tudo, está rodeado pela mulher que tem problemas conjugais, a parente cansada de sua vida, um membro autoritário sob o mesmo teto, pessoas que expelem maldade e indiferença a terceiros, adultério, entre outras situações.
O pai dos zumbis, que nos deixou esse ano, mesmo em seus outros filmes brinca bastante com o terror que nada mais é que a vida em sociedade. Somos vítimas e fazemos vítimas, na maioria das vezes sem a mínima percepção de nossos atos. Vemos nossos vizinhos, conhecidos e tantos outros e também ouvimos falar a respeito deles, e passaremos a acreditar sem a necessidade de verificar a veracidade do que nos chega à mente.
É por isso que Romero não precisa de trilha-sonora bombástica, efeitos (só as maquiagens feitas por Savini já são de ótimo tamanho), jumpscares para que seus zumbis, vampiros ou quaisquer outras metáforas para o ser humano ataquem. O assustador está nas entrelinhas.
A cada conferida e revisão de Martin pode-se obter uma interpretação diferente. Você assimila a tela e teu subconsciente se encarrega do restante. Por isso não há arte como o cinema.
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