Em 1931, o diretor James Whale levou às telas um filme de terror que ficaria marcado na história do Cinema, tanto pela sua qualidade técnica quanto pelo seu vanguardismo. Algumas adaptações da obra de Mary Shelley já tinham sido feitas, a primeira sendo realizada por Thomas Edison em 1910, entretanto, Frankenstein de James Whale foi um dos primeiros filmes (se não o primeiro) de destaque dentro do gênero. Essa obra pode ser considerada a mais significativa adaptação da obra de Shelley, apesar de não seguir fielmente o livro, o filme nos trouxe a imagem do Monstro que ficaria definitivamente nas nossas mentes (devido à maravilhosa maquiagem de Boris Karloff e sua ótima atuação), além de possuir um ótimo clima sombrio e bom cenários.
Apesar de ser uma boa adaptação, 'Frankenstein' mostra apenas uma parte do livro original, mais ou menos até a sua metade, quando o Monstro escapa do cerco dos moradores da cidade e o Dr. Frankestein (Colin Clive) é resgatado. Quatro anos depois o diretor lançaria a segunda parte do filme, intitulada A Noiva de Frankenstein, que começa exatamente onde a primeira parte terminou. Nessa continuação, enquanto o Monstro vaga pelo país em busca de refúgio, outro cientista, Dr. Pretorius (Ernest Thesiger), tenta convencer Henry Frankenstein a criar uma companheira para o Monstro. Henry, que planeja parar com esses experimentos após todas as tragédias causadas por sua criação, não se deixa convencer pelo aloprado doutor, mesmo quando esse mostra miniaturas perfeitas de seres humanos (criadas por ele) dentro de frascos (um desvio inacreditável da obra de Shelley, bizarra, mas interessante até certo ponto). Pretorius então, após encontrar o Monstro por uma obra do acaso, decide usá-lo para seqüestrar a noiva de Henry, Elizabeth (Valerie Hobson), obrigando-o assim a criar outra criatura.
A mudança maior do livro para o filme é a inserção do Dr. Pretorious. Enquanto no livro é o próprio Monstro que deseja uma companheira, o que é muito mais sensato, no filme, esse cientista é que tem a idéia, que não convence muito justamente por ele ter criado seres humanos tão perfeitos, sem serem violentos. Porque diabos então ele iria querer criar um verdadeiro monstro, violento e deformado? Pretorious argumenta que Henry criou um ser com proporções humanas, algo que ele não conseguiu realizar, mas essa explicação é um tanto rasa, afinal, se ele teve capacidade de criar o que criou, a questão do 'tamanho' não é muito convincente, dentro dos padrões da fantasia, ele poderia ter sido capaz de criar um ser do tamanho de um ser humano, um desafio fácil de ser alcançado se comparado ao que já tinha conquistado até ali. No livro, após ser vítima do ódio dos seres humanos e ter consciência de que nunca será aceito pela sociedade, o Monstro pede ao seu criador uma companheira, seus motivos são perfeitamente cabíveis, uma vez que uma companheira como ele seria a única maneira dele não se sentir sozinho. No filme, o Monstro é 'convencido' por Pretorious a ter uma companheira, o que acaba soando falso, Whale criou um clímax rápido demais, e esse é com certeza o fator mais negativo da película.
Nos minutos finais, Pretorious convence o Monstro, ele sequestra Elizabeth, Henry cria a companheira, ela ganha vida, o Monstro é rejeitado por ela, Elizabeth e Henry escapam do castelo, e o Monstro explode tudo. Além de ter o clímax muito corrido e não ser convincente no que concernem as motivações de Pretorius, o filme ainda possui outra falha incômoda: a beleza da noiva do Monstro. A diferença gritante entre os dois tirou o impacto que causaria se a noiva tivesse uma aparência tão chocante quanto a dele, e fica a pergunta sobre como Henry conseguiu fazer um ser tão belo dessa vez.
Mas o filme tem aspectos bastante positivos, sem dúvida. Além de Karloff continuar perfeito como a criatura, os efeitos especias são bastante convicentes (o destaque maior vai para os humanos de Pretorious), as atuações do restante do elenco também são corretas, apesar dos inevitáveis exageros expressivos (um 'problema' da época em si, os filmes ainda guardavam características do Cinema Mudo), e algumas cenas são memoráveis, especialmente a seqüência que mostra a relação entre o Monstro e o velhinho cego, nela vemos o lado humano da criatura, que finalmente é aceita por alguém, se tornando incrivelmente dócil. A relação entre os dois é com certeza o aspecto mais emocionante e bem construído do filme, além de ter sido o maior acerto do diretor, que ao invés de manter o que estava no livro (na obra de Shelley, o Monstro não tem contato com o velho, ele apenas fica meses observando o senhor conversar com seus dois filhos, e depois que os filhos avistam a criatura, ela foge desesperado), criou algo muito mais tocante, dando uma oportunidade a criatura de se relacionar com algum humano, e um homem cego seria a sua única chance de convivência. E por último, temos no início da fita uma conversa entre a própria Mary Shelley com Lord Byron, uma conversa real (também mostrada no livro) que foi a maior motivação para Shelley ter escrito a história, na época ela tinha apenas 19 anos.
É indiscutível o fato de que os filmes de Whale teriam ganhado muito mais força se tivessem sido apenas um. A divisão serviu apenas para gerar menos impacto, até o clímax ficaria mais aceitável se a obra fosse uma só. Mas mesmo assim, 'A Noiva de Frankenstein' é um ótimo passatempo, que também não deixa de ter um lado mais sério, com a discussão sobre até onde pode (e deve) chegar o poder do ser humano.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário