Já na época do declínio do gênero Faroeste, Don Siegel (Vampiros de Alma e Perseguidor Implacável) dirigiu Os Abutres Tem Fome, filme que tem como maiores destaques os diálogos afiados e a divertida relação entre o caubói Hogan (Clint Eastwood) e a freira Sara (Shirley MacLaine), um dos casais mais improváveis do cinema.
Tendo como pano de fundo a precária situação do México, quando o país estava lutando contra o controle da França, o diretor, apesar de lidar com uma situação grave, realiza um faroeste leve e sem maiores pretensões. Hogan salva Sara de um grupo de molestadores e descobre que a freira pode ajudá-lo a penetrar no quartel oficial francês que ele pretende roubar, já que ela está fugindo dos franceses devido à ajuda que forneceu aos mexicanos. Até mesmo a trilha do mestre Ennio Morricone, apesar de memorável e forte, cria uma sensação de bem-estar e diversão. O perigo está lá, mas por muitas vezes fica difícil temê-lo, e no caso da obra em questão, essa é uma boa característica.
Digamos que o filme está mais para Butch Cassidy do que para Era Uma Vez No Oeste ou Três Homens Em Conflito. Os diálogos entre a dupla são repletos de piadas relacionadas aos aspectos tão incomuns envolvidos (o maior deles sendo o fato de uma religiosa estar envolvida com um caubói, obviamente). Maclaine (sempre linda, até hoje) faz de Sarah um conjunto forte, simpático e por vezes quase etéreo (devido a sua posição em um ambiente tão inóspito) sob a bata e o crucifixo. O vigoroso Eastwood (até hoje) não muda muito o jeito durão, impertinente e irônico de qualquer outro faroeste que tenha feito, porém agora ele se mostra mais relaxado e cômico, enfim, o filme permite tudo isso. Até mesmo os estímulos para o roubo do quartel fogem do padrão tradicional dos heróis do Oeste: Hogan não quer o dinheiro para comprar um rancho e criar cavalos, mas sim para construir um cassino em São Francisco, a grande cidade em ascensão (estamos falando do final do século XIX).
Algumas passagens são extraordinárias e memoráveis, como a comicidade e a tensão que envolve a explosão de uma ponte e as sensacionais performances da dupla, tendo o ápice quando Sara tenta tirar uma flecha de Hogan. Siegel cria uma seqüência sem pressa e bastante rica em conteúdo, dando preferência aos closes que mostram a grande aflição (e determinação) de Sara e a descontração aparente de Hogan.
O clímax, apesar de bem feito e até ousado (estamos ainda no final dos anos 60), é o que menos importa, na verdade. Quando chegamos a ele, Maclaine, Eastwood e Siegel já fizeram o melhor do filme. O título original faz muito mais sentido à atmosfera do filme do que o pretensioso título brasileiro, que carrega um peso negativo que o filme não possui.
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