Nas últimas décadas os musicais têm apresentado uma decaída assustadora em seu nível de qualidade, não que todos sejam ruins, mas uma grande parte deles não são nada além de divertidos (Mamma Mia! e Hairspray são bons exemplos). Porém Rock of Ages surgiu, as notícias começaram modestas e com o passar do tempo, realmente parecia que estaríamos diante daquele que ressuscitaria a boa era para o gênero. Infelizmente, apesar de não ser completamente ruim, Rock of Ages é uma decepção completa: A boa proposta - a de ressuscitar o rock pesado - foi desperdiçada em mais um musical enfadonho e raso.
Baseado num musical com o mesmo nome, Rock of Ages segue Sherrie, uma garota interiorana que vai para Hollywood afim de seguir seu sonho de ser cantora, lá ela conhece Drew, um rapaz – que também é cantor – que trabalha numa das casas de show mais famosas da cidade. Á partir disso assistimos a trajetória (clichê) do casalzinho, em meio á uma série de histórias paralelas que envolvem o roqueiro Stacee Jaxx e a ‘certinha’ Patrícia que luta para o fim do rock, e mais um punhado de personagens coadjuvantes todos eles com suas devidas subtramas.
Se mostrando um paço á frente do trabalho feito em Hairspray, Adam Shankman dirige o filme dando prestígio aos inúmeros números musicais, onde o cineasta caminha, pula e gira com sua câmera afim de encontrar o enquadramento certo, dando mais agilidade e ritmo a produção – corrigindo um defeito de seu filme anterior, que parecia ser longo demais. E graças ás coreografias de Mia Michaels e os figurinos de Rita Ryack somos introduzidos naquela época de modo eficaz. A direção de arte ainda ajuda nesse ponto, trazendo objetos que naquela época eram imenso e hoje são minúsculos, como o telefone móvel e o gravador de fita cassete. Além disso, a fotografia acerta nos bons jogos de sombras e efeitos de luz em diversos quadros.
Musicalmente Rock of Ages é curiosíssimo: Se ele é vendido como um filme que tende á resgatar aquele estilo de música clássico dos anos 80, ele é relativamente frustrado nessa tentativa, já que grande parcela dos números musicais são mais Pop do que Rock, o que é controverso, pois o script martela na cabeça do público um óbvio discurso que exalta o Rock e rebaixa o Pop, chegando á brincar diretamente com modinhas adolescentes que surgem frequentemente pelo mundo da música. Não que a trilha sonora do longa seja ruim, muito pelo contrário: Temos ótimas músicas como Paradise City, I Can't Fight This Feeling, Don't Stop Belevin' e We Built This City, e todas são inseridas dentro da trama (ou será que a trama é inserida dentro delas?) com rapidez e naturalidade.
Por outro lado, o filme acaba desperdiçando algumas músicas para deixar os números mais empolgantes: É estranho e triste ver I Love Rock n Roll (talvez a melhor música da trilha) sendo utilizada de maneira tão errada num mash-up, e mesmo que a sequência funcione, a música merecia um tratamento mais digno. Além disso, é incrível como Rock of Ages é desequilibrado quando o quesito é timing: Após ficar vinte minutos ouvindo diálogos desinteressantes numa história bobinha, acompanhamos dois números seguidos praticamente sem intervalo, o que, além de cansar o público, acaba por diluir as apresentações. Em contraponto, o timing cômico do filme é ótimo: Não consegui segurar o riso com Bryan Cranston dizendo ‘That’s the shurt answer?‘ (escrevendo ou lendo isso, dá pra perceber o quão essa tirada é batida e velha, mas no filme funciona) ou no momento em que a jornalista comportada acaba não resistindo ao charme de Stacee Jaxx e enfiando a língua em seu ouvido.
Um dos pontos altos do longa é seu elenco repleto de astros: Catherine Zeta-Jones retorna ás telas (á muito tempo não estrelava um filme realmente interessante) dando vida á vilã da história que protagoniza um momento particularmente divertido cantando Hit Me With Your Best Shot, além de dividir com Russell Brand (que está extremamente engraçado no papel) uma cena excelente: O mash-up de We Built This City e We're Not Gonna Take It!. Enquanto Alec Baldwin aparece apenas como um divertido coadjuvante, o casal Julianne Hough e Diego Boneta surpreende por não irritar – já que seus personagens, apesar de serem os protagonistas, não são muito interessantes.
Porém, quem acaba roubando (ou engolindo) a cena é Tom Cruise com seu Stacee Jaxx: O cantor é retratado de maneira sólida por Cruise, numa interpretação excelente que impressiona pele jeito de andar e por parecer sempre bêbado ou drogado. Stacee ainda é a figura mais interessante do filme, já que ele realmente representa o verdadeiro espírito do rock clássico, sempre usando roupas extravagantes – pequenas ou imensas demais – e sempre cercado por mulheres loucamente ‘apaixonadas’ (em uma longa sequência, duas garotas desmaiam ao ver o ídolo pela primeira vez, e ele simplesmente ignora, apenas para dar o espectador o quão rotineira é aquela situação). Pelo menos, não somos obrigados á ver um triângulo amoroso envolta do cantor moderninho.
O fato é que por mais divertidos que sejam os números musicais e por mais talentosos que sejam os atores, Rock of Ages é uma imensa e embolada confusão narrativa que utiliza dos mais antigos clichês para montar o palco das músicas (a mocinha do interior em busca de o sonho de ser internacionalmente conhecida: Quem já não viu isso?), e o pior é que o texto acaba caindo na armadilha de criar situações apenas para incluir mais uma música (a sequência em que é revelado que dois personagens são homossexuais, é engraçada, porém, totalmente desnecessária e fica perdida dentro da narrativa). Além disso, o filme acaba criando armadilhas relevantes para si mesmo e tropeça em alguns momentos em particular: Após decidir que o número de Any Way You Want It se parecia num Strip Club, o espectador presencia aquela provavelmente seria a sequência mais contagiante da projeção, porém Paul Giamatti aparece no meio da música repentinamente, causando a sensação de: “O diretor notou que Giamatti não tinha cantado nenhuma vez, então simplesmente o jogou em um número qualquer”, o pior é que a voz do ator não combina em nada com a música, e todos acabam saindo prejudicados.
Rock of Ages pode ser um passatempo divertido, contagiante e esquecível para alguns (o que foi para mim), ou pode ser uma tortura sem fim para outros, tudo depende de seu ponto de vista, suas expectativas e sua opinião sobre musicais Pop-rock. Mas um filme que numa sequência desenrolada mais de uma história, com cinco atores cantando Here I Go Again em três cenários diferentes e ainda consegue não ser cansativo e piegas merece um pouquinho de consideração.
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