Em 2005, quando Crash, No Limite (Crash, 2004, EUA) surpreendentemente ganhou o Oscar de melhor filme, muita gente torceu o nariz alegando que se tratava de um melodrama feito apenas para fazer espectadores chorarem. Embora, de fato, possa provocar lágrimas, o filme não é menor. Conta com um belo trabalho de edição e fotografia, boas atuações e aborda um tema um tema delicado (preconceito, de quase todos os tipos) com sensibilidade e profundidade. Era elegível. Existe, entretanto, uma teoria da conspiração (não tão conspiratória assim) que alega que os prêmios da Academia no referido ano foram pulverizados entre várias obras para não ficar muito óbvio que O Segredo de Brokeback Mountain (Brokeback Mountain, 2005, EUA), grande favorito, não tinha sido escolhido por uma questão política, ao invés de artística. À época, eu estava nos EUA e pude comprovar que os jornais do dia seguinte ficaram atônitos, especialmente o finado San Francisco Chronicle. Digressões à parte, é inegável a força dramática contida nos personagens bem interpretados de Crash.
Em 2012, sete anos depois, uma discussão parecida está em pauta às vésperas da cerimônia do Oscar, que acontece no dia 26 de fevereiro. Histórias Cruzadas (The Help, 2011, EUA) tem quatro indicações ao prêmio: melhor filme, melhor atriz (Viola Davis) e duas para melhor atriz coadjuvante (Octavia Spencer e Jessica Chastain, uma das quais acredito que deve ficar com a estatueta). Assim como Crash, o filme fala de preconceito (sempre ele). Baseado no livro best seller de Kathryn Stockett, que no Brasil foi lançado como A Resposta (aliás, um título melhor do que Histórias Cruzadas), o longa aborda a relação das empregadas domésticas norte-americanas, todas negras, com suas patroas brancas. A ação se desenvolve em uma pequena cidade do republicano estado do Mississipi, na década de 1960, auge da luta pela igualdade racial nos Estados Unidos. As domésticas trabalham em um regime de semi-escravidão e lidam com uma sociedade segregacionista. A personagem de Emma Stone, Eugenia Skeeter, por meio de um livro-reportagem sobre o tratamento dado a essas mulheres, contado a partir da perspectiva delas, agride o tradicionalismo típico do sul dos EUA e transforma vida dessas empregadas, assim como a sua própria.
Mas, diferentemente do vencedor do Oscar de 2005, Histórias Cruzadas não tem uma edição que chame atenção. Além disso, também trata o tema, delicado, de maneira imatura. O filme dirigido por Tate Taylor é maniqueísta. De um lado está o bem, oprimido e esperançoso, evidentemente representado pelas domésticas. Do outro está o mal, implacável e cruel, personificado pelas patroas brancas. Não há nuance, aquela complexidade que borra as fronteiras entre o certo e o errado. Para completar o tom professoral não recomendável, o personagem redentor faz parte da comunidade agressora e surge como uma improvável figura magnânima. Nesse ponto, se aproxima exatamente do que há de mais fraco no excelente Avatar (Avatar, 2009, EUA), no qual o estrangeiro Jake Sully, pertencente à espécie do colonizador, aparece de maneira heróica para salvar os Na’Vi da dominação iminente.
O mérito da obra está no ótimo elenco feminino (não há personagem masculino de relevância). As atrizes brilham em seus papéis e a empatia (ou antipatia) com o público é instantânea. Viola Davis, como a protagonista Aibileen Clark lembra a Ms. Miller que viveu em Dúvida (Doubt, 2008, EUA) e que também lhe valeu a indicação para o Oscar. Octavia Spencer e Jessica Chastain dividem a categoria de melhor atriz coadjuvante, interpretando, respectivamente, o estereótipo da negra de personalidade forte e da branca de personalidade fraca. As outras atrizes também não fazem feio.
Assim, o longa vale pelas lágrimas e pelo elenco. Não é pouca coisa, significa sucesso de público (liderou as bilheterias norte-americanas em três finais de semana seguidos) e de crítica (é sempre contemplado com alguma menção em todas as premiações, vejamos no Oscar). Nota: 7,5
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