Quando se fala em cinema, pretensão não significa um grande problema. Porém, isso gera um problema: o da expectativa gerada em torno da obra criada. E quando se fala em adaptação cinematográfica de uma obra literária de sucesso, a coisa se torna ainda mais complicada. Esse é o caso de “Os filhos da meia-noite”. O homônimo livro de Salman Rushdie é inquestionavelmente conhecido no mundo. Aliás, a sua tentativa de contar parte da história da Índia em seus romances é algo admirável no meio literário. Consequentemente, faz-se a abordagem de uma história que detém diversos meandros que são muito mais do que simples detalhes.
Deepa Mehta tenta dar conta da complexa obra de Rushdie. No entanto, fracassa. O filme peca por manter uma cadência narrativa constante naquilo que viria a se mostrar extremamente complexo. Ao invés de “deixar os atores falarem em suas atuações”, prendeu-se demais a um roteiro que tenta abranger toda a obra literária – algo por si só impossível, devido principalmente à diferença das linguagens. Os takes são praticamente os mesmos ao longo de todo o filme, com cortes constantes, às vezes sem quaisquer critérios para closes, por exemplo. A linguagem acaba se aproximando muito mais da televisiva, em uma constante tentativa de criar uma ação que, definitivamente, não existe no livro de Rushdie.
Ademais, os atores não se destacam em seus papeis, não conseguindo ir além do óbvio na interpretação – por exemplo, a importância do nariz para Saleem poderia ter contribuído para Satya Bhabba, o ator que o interpreta, ter criado uma espécie de tique, marca do personagem, tornando-o marcante. Mas, não culpo os atores em si. A direção mesmo, como já dito, excessivamente presa ao roteiro, fracassa ao contar cada ponto do livro de maneira muito rápida, impedindo a assimilação do espectador – que, na maioria das vezes, como em meu caso, desconhece a história da Índia. Personagens vão e vêm, chegando e desaparecendo sem mais.
Ao final, o que se tenta captar é o drama da formação da Índia moderna, pós independência britânica – algo notável na obra de Rushdie. Isso passa muito longe no filme que, em contrapartida, poderia ter conferido uma outra tônica à narrativa. E, já na segunda metade do filme, nem é mais possível ficar admirado com favelas coloridas, como tenta a direção.
Enfim, um ponto muito fraco para o cinema indiano que, certamente, já fez coisas muito melhores com sua própria história.
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