A amálgama resoluta dos Daniels pode ser interpretada de várias perspectivas — a depender da personalidade de quem o assiste.
Se for um(a) cantor(a): a belíssima sinfonia da natureza dita o rumo da trama. E vice-versa.
Se for um(a) psicólogo(a): conflitos da psique reverberam a todo instante um inconsciente desequilibrado por motivos alheios.
Se for um(a) poeta: atitudes e gestos levam a uma catarse de um beijo vívido nas profundezas de um rio, ascendendo desejos ocultos de outrora.
Se for um(a) artista: o surrealismo impera por todo o longa-metragem, remetendo a uma montagem estilizada e flertando com uma narrativa repleta de simbolismos.
Se for um(a) religioso(a): tudo não passa de uma visita do divino para impedir que o pior aconteça, ensinando a morrer carnalmente para renascer espiritualmente.
Se for apenas um(a) aspirante a cinéfilo(a): os diretores fizeram uma excelente obra autoral com muita sensibilidade e sentimentalidade em cima de um tema bastante necessário, que é a depressão.
Se for um(a) filósofo(a): aqui o Mito de Sísifo se aplica à jornada de alguém que tem a obrigação de levar o corpo de um morto consigo, desta vez não como punição, mas por sobrevivência.
Se for um(a) diretor(a) de cinema: o tom exagerado de comédia pastelão é colocado propositalmente como analogia àquilo que não expomos. O resultado soa pretensioso e por vezes até ruim. Mas é um ruim com Paul Dano.
Se for um(a) escritor(a): o cinema possibilita o ator utilizar seu corpo de um jeito mais abrangente e funcional, e nesta película, Daniel Radcliffe parece estar de posse destes domínios levantando sua varinha para indicar uma direção acolhedora, soltando flatulências reiterando uma possível síntese de sua carreira e encolhendo-se manifestando aversão por ter aceito tal papel.
Se for médico(a)/psiquiatra: o filme proclama a importância da terapia no desenvolvimento humano e cria bons artifícios para compor o quadro clínico de Hank, como por exemplo, na sequência inicial, quando ele está prestes a se enforcar e escuta a “voz” de Manny, no mesmo instante a câmera passeia pela praia e intercala closes intimidadores evidenciando deste jeito a condição asfixiante de Hank como se ele fosse um prisioneiro de si próprio. Catártico.
Caso você seja um mix dessas coisas ou nenhuma delas, encare tudo como uma metáfora para algo maior. Permita-se. Pois “Swiss Army Man” é paradoxalmente simples e complexo; poeticamente vislumbrante; magicamente inquietante e tragicamente sufocante em sua essência. Como todo bom filme deve ser.
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