De todos os poucos filmes de guerra que assisti, este ocupa uma posição privilegiada na minha lista de melhores filmes de todos os tempos. Spielberg fez a façanha de comandar um filme que não só funciona como registro de um momento crucial durante a segunda mundial, como também opera um eficaz uso da linguagem cinematográfica na narrativa.
O filme se passa na segunda guerra mundial e inicia especificamente no que é chamado de Dia D em 6 de junho de 1946, os primeiros minutos retrata o massacre que foi o desembarque na Normandia; depois disso acompanhamos John H. Miller e sete homens comissionados a resgatar o soldado Ryan, um paraquedista que é o último sobrevivente de quatro irmãos; o único problema é que Miller não sabe se o soldado ainda está vivo.
Em sua premissa simples, o roteirista Robert Rodat encontra tempo o suficiente para explorar a reação de cada ´personagem ante à situação em que se encontram; Miller acata a ordem que lhe fora dada mesmo sabendo que a missão é suicida; Caparzo tem boas intenções e é justamente isso que custará sua vida; Upham é um personagem retraído que movido por medo acaba não sendo útil quando seus colegas mais precisam dele; Mellish, Jackson e Horvath temem o que pode acontecer de pior, mas mesmo lutam até o fim de suas vidas.
Adotando uma abordagem documental, Spielberg é bem sucedido ao deixar a câmera tremida transmitindo um clima tenso e urgente, ao contrário de Michael Bay o cineasta toma muito cuidado para não confundir o espectador, apostando em planos abertos para nos situar na mise-en-scène, planos fechados quando destaca uma atitude que um personagem está prestes a tomar ou quando algo está pra acontecer, um exemplo disso é logo na cena do Dia D, em que Spielberg fecha o plano nos soldados, ali logo vemos o desespero de cada um deles, enquanto isso ouvimos as explosões e os tiros do lado de fora dos barcos, enquanto isso Spielberg evita mostrar o inimigo de uma única vez, isso nos ajuda a nos importar com cada soldado naquela embarcação mesmo que não o conheçamos ainda; e, o que mais gosto no Spielberg, planos médios ao filmar cenas complexas que contém múltiplas narrativas (por exemplo, quando um ou outro personagem é atingido por um sniper ou canhão).
Aliás, a mixagem de som é competente ao nos inserir dentro da narrativa e que participemos da dor dos personagens, um exemplo disso é quando presenciamos a morte de Carparzo, quando ele é atingido ficamos surpresos; isso graças ao uso eficaz da voz dos soldados que vociferam à Caparzo quando ele desobedece uma ordem em nome da vida de uma criança, á isso se mistura o uso do som da chuva que nos passa a sensação de uma aparente tranquilidade. Neste momento, podíamos ouvir uma música tensa, mas o uso da música impediria que sentíssemos a urgência da cena. Consciente disso Spielberg faz o oposto, junto ao diretor de fotografia Janusz Kaminski, investe num plano médio em que vemos Caparzo ainda vivo cair no chão e seus colegas tendo de se esconder; enquanto o soldado está no chão e fatalmente ferido clamando por ajuda, os mixadores de som (Gary Rydstrom e Richard Hymns) são hábeis ao ilustrar o perigo de qualquer movimento brusco usando um silêncio quase absoluto sendo presente apenas o som da chuva e a voz de seus colegas ordenando Caparzo não se mover, dessa vez sentimos o desespero do soldado; enquanto isso acompanhamos Caparzo com muita dificuldade pra falar e nós conseguimos ouvir até mesmo o som rouco de sua voz cada vez mais presente, assim Rydstrom e Hymns nos transmite choque ao nos sentirmos na pele de um personagem que está prestes à morrer.
O elenco do filme é competente ao mostrar a função que cada um exerce na história; com destaque à Tom Hanks que evidencia um sujeito que mesmo sabendo que a missão não tem "passagem de retorno" ainda segue nela até o fim, é impressionante como que em alguns momentos ele precisa ser firme com os soldados; Matt Damon encarna Ryan com uma sensibilidade impressionante, apesar de estar numa condição desesperadora o personagem junto com outros encontra momentos de companheirismos e tempo para compartilhar suas experiências e frustrações, Damon encara essa faceta de Ryan com singeleza, ao evitar excessos que poderiam atrapalhar seu desempenho. Vin Diesel em seu primeiro papel importante no cinema, encarna um personagem teimoso com muita naturalidade, aliás, faz anos que não vejo o ator se desafiar, gostaria que fizesse isso mais vezes.
Infelizmente, O Resgate do Soldado Ryan sofre com preconceitos que até hoje resistem, um exemplo disso, dizem que o filme só vale a pena pelos 20 minutos, o que é uma bobagem porque nos seus 169 minutos vamos encontrar muitas coisas interessantes, só as encontraremos caso houver disposição de procurar; outro preconceito que até hoje é dito por detratores é que Spielberg faz um chorôrô danado durante o filme deixando-o tolo, perante isso me pergunto se eu assisti ao mesmo filme que estes dizem ter assistido.
Enfim, Spielberg realizou um dos melhores filmes de guerra já feitos, senão um dos melhores de todos os tempos.
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