A obra conduzida pelo cineasta Bahman Ghobadi consegue emocionar pela sensibilidade com que é conduzida e pela força do roteiro. A produção nos mostra todo o sofrimento de uma tribo curda, que sofre sob o controle dos fervorosos seguidores de Sadam Hussein e aguardam ansiosos a invasão norte-americana. O local é bastante precário, as moradias são envoltas de sujeira e sucatas de equipamentos de alta tecnologia (um contraste interessante, entre o miserável e a comodidade que os artigos tecnológicos proporcionam).
Temos a presença de um grande grupo de crianças, que são o destaque do filme, já que a trama toda se passa com eles. Satélite (ou como falam os habitantes da tribo, Sateláite) é uma espécie de líder de todos os pequenos habitantes, um menino perspicaz que está à frente do grupo e é responsável pela instalação de antenas.
O interessante é que Satélite é visto como um líder para toda a tribo, já que é o único que pode possibilitar o acesso a informações sobre o mundo e principalmente sobre a guerra. Os verdadeiros líderes são bastante ultrapassados, mal sabendo o que é Estados Unidos ou quem é George W. Bush e assim se mantém alienados. As crianças vêem no garoto líder um exemplo de força para continuar sobrevivendo, e conseguem dinheiro a partir do trabalho nos campos minados, onde recolhem minas para vender no mercado negro.
As crianças ali possuem uma vivência de pessoas adultas, devido às atrocidades que presenciaram: muitos deles tiveram suas famílias mortas por soldados de Hussein, outras crianças foram mutiladas por minas terrestres. Ainda existe uma menina que teve a família assassinada, foi estuprada e deu a luz a um filho antes de ter 15 anos, com o qual possui uma relação de amor e ódio. São esses absurdos que são denunciados pela obra do cineasta Bahman.
A questão da garota é bastante abordada durante o filme, e uma das que mais comove. Bem desenvolvida e explorada, os conflitos internos que a menina vivencia são de emocionar, como quando pensa em se suicidar no lago, ou mesmo as tentativas de abandonar o seu próprio filho. Este, fruto de uma relação precoce e indesejável, é visto como uma recordação dolorosa tanto de seu passado como a perda de sua inocência de uma forma abrupta e muito antes do desejado. Muito bem trabalhada, a menina é transformada em uma adulta antes de completar seus quinze anos, e o diretor sabe conduzir de uma forma sem igual esse delicado ponto.
Em termos de maturidade, todas as crianças ali já possuem um certo grau de vivência, devido a difícil sobrevivência na região onde moram. Diariamente são expostos ao medo e a tensão de desarmar minas terrestres, muitos deles são mutilados, como o garoto que não possui os dois braços, fazendo o trabalho com a boca (outra cena incrível, diga-se de passagem). Satélite é visto como um porto seguro de todos aqueles garotos, que o respeitam e obedecem as suas ordens sem pestanejar. O garoto líder e suas idéias e bugigangas guiam os outros meninos para que jamais as tartarugas voem de novo, e talvez possam até lhe garantir segurança em algum futuro próximo. Afinal, a esperança é sempre a última que se esvai, não é?
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