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Críticas

Cineplayers

O Holocausto visto sob uma visão diferente, divertida e tocante, neste filme que divide a opinião mundial.

8,0

Há algum tempo que eu havia colocado para gravar A Vida é Bela e não havia assistido. Estava sem ânimo, talvez ainda reflexo da perda de Central do Brasil no Oscar de melhor filme estrangeiro de 1998. Prêmio, aliás, que não deveríamos ter mantido esperanças, já que Benigni (o diretor) e seu A Vida é Bela haviam sido indicados, além do melhor estrangeiro, como melhor filme de 1998, o que deixava claro sua vitória na categoria estrangeira. Era o único dos que disputavam que também estava disputando a categoria de melhor filme. De qualquer modo, já haviam se passado quase cinco anos, essa desculpa nem tinha mais fundamento e a mágoa já havia passado, então resolvi assistir.

Infelizmente não sabia o que estava perdendo. É totalmente compreensível sua indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro, um filme do jeito que a academia gosta: a luta de uma pessoa para que, com sua superação dos problemas, haja um final emocionante e que faça as pessoas pensarem. Só que A Vida é Bela conta com uma característica que Benigni costuma inserir em seus filmes: a comédia presente constantemente durante as cenas. Ou seja, um assunto tão polêmico quanto a guerra é tratado de maneira bem delicada para não ofender ninguém, só que ainda contêm diversas críticas de modo irônico e divertido, sempre com a seriedade ao fundo.

O filme pode ser dividido em duas partes muito bem definidas: a luta de Guido (também vivido pelo diretor Benigni) para conquistar seu amor Dora (interpretada por Braschi, mulher de Benigni na vida real) na primeira parte e a luta pela sobrevivência de sua família durante a Segunda Guerra Mundial na segunda metade do filme.

A primeira parte é toda bonitinha demais, daquelas histórias de amor que qualquer pessoa gostaria de viver. Guido é o típico imigrante, sonhador e empenhado em suas decisões, vindo do campo para a cidade. De um modo não muito convencional conhece a também já citada Dora, no qual começa a se apaixonar depois de diversos encontros casuais entre os dois, sempre com troca de flertes. Sempre se metendo em situações muito constrangedoras, e saindo delas de modo mais brilhante ainda, Guido consegue atrair a simpatia de todos o que estão assistindo, mesmo com piadas já bastante gastas (que costumamos, inclusive, ver até em Chaves).

Só que isso não é um ponto ruim, pois é uma história bem gostosa de se acompanhar e que poderia ser contada completamente à parte da segunda metade do filme. Tudo aqui se passa na Itália, tem uma fotografia com cores fortes e vivas, mesmo à noite. Dá detalhes da vida e de onde mora, aprofundando mais a apresentação do personagem. Só que só sabemos que Guido é Judeu no final dessa primeira parte, algo que acentuou ainda mais o romance entre ele e a italiana Dora, já que era um estrangeiro. Essa primeira parte se passa no ano de 1939, antes da guerra explodir e os Judeus serem caçados pelas tropas do alemão Hitler.

Na segunda metade o drama é muito mais intenso, recebendo o tratamento irônico que citei anteriormente. Tendo localização ainda na Itália e com a duração do período da segunda grande guerra, Benigni e seu filho Giosué (interpretado pelo novato Giorgio Cantarini) são levados para o campo de concentração nazista. Guido tenta, de todas as maneiras possíveis, proteger seu filho de tudo o que está acontecendo ao redor. Ele inventa uma história, uma fantasia, para que seu filho acredite que tudo o que está acontecendo é apenas um jogo, protegendo-o de toda a maldade que ronda uma guerra, e é em torno disso que a segunda parte se desenvolve. Tudo é uma fantasia, todas as cenas têm dois significados: o real e o inventado por Guido.

A parte técnica desse ponto é muito mais caprichada, como o tema propõe. Fotografia mais escura, pessimista, dor e sofrimento toda hora citados por expressões faciais dos atores, mas mesmo assim Guido continua com sua fantasia e o toque de humor característico, apesar da situação. A direção de arte está de parabéns, todos os uniformes são bem convincentes, tudo está muito belo, claro que com sua dose de beleza. A cena da neblina é fantástica, e algumas tomadas de câmera, apesar de não inovarem, caíram perfeitamente no contexto e evolução do filme.

Bom, cheguei no ponto que não queria falar: a comparação com Central do Brasil. É praticamente impossível falar de A Vida é Bela sem falar de Walter Salles e seu grande clássico. Ambos os filmes, apesar de diferentes estruturalmente, tem um propósito básico bem parecido: o relacionamento com uma criança. Em um o personagem se chama Josué, no outro Gisué, coincidência, não? Ah, ainda há uma outra bem marcante para dois filmes que disputaram a mesma estatueta: tanto no filme de Walter quanto no de Benigni a personagem principal se chama Dora (no Brasil interpretada por Fernanda Montenegro, que teve uma atuação muito mais brilhante que sua concorrente).

Só que no demais são totalmente diferentes. Central do Brasil é sério e mostra fendas e amor numa mesma sociedade, enquanto A Vida é Bela trata mais uma vez da guerra, só que de modo mais delicado e sem sangue como de costume, além da história de amor. Central do Brasil é um filme mais pobre em termos sociais, pois mostra exatamente a dificuldade do povo em questão e como pode ser ainda pior (no caso, o lugar onde o menino mora). A Vida é Bela é incomparavelmente superior em termos de objetos de cena, onde inclusive um tanque aparece na telona. Só que, realmente, a mensagem passada por Benigni é melhor, mais tocante, apesar da péssima seqüência final (poderia ser muito melhor, convenhamos). Nesse ponto Central do Brasil é bem melhor, e em ambos a imagem na tela sempre é agradável aos olhos, sempre bem retratada, repito, na medida do possível. Na verdade, ambos conseguirão, com certeza, tocar o seu coração quando forem assistidos.

Certa vez li que o produtor do filme Trem da Vida (outro que trata sobre o judaísmo e a guerra) chegou a enviar o roteiro pedindo para Benigni interpretar o judeu do filme, só que não recebeu sequer um não como resposta. Tempos depois, apareceu A Vida é Bela e toda a repercussão quanto ao filme. Outra 'coincidência' bem interessante. Poderia me estender mais e mais nessa comparação, mas é melhor somente dizer que Central do Brasil é excelente, mas A Vida é Bela é ainda melhor.

Roberto Benigni atua no filme, como já citamos, e além de dirigir é responsável pelo roteiro, juntamente com Vicenzo Cerami. Sua interpretação é realmente excelente, assim como os outros atores. Claro que não posso julgar o garoto sendo tão pequeno, mas eu já vi alguns atores americanos e brasileiros mesmo na mesma faixa etária melhores que ele, em atuações muito menos exigentes, porém. Nicoletta Brashi faz seu papel, já que não era tão exigida na primeira parte e sua personagem foi praticamente nula na segunda. Talvez o “olhar apaixonado” seja ainda facilitado por questões óbvias, mas nada que tire o seu mérito na interpretação.

A Vida é Bela é um filme que realmente merece ser visto. Começa lento demais, bonitinho, mas os conflitos apresentados na segunda parte do filme são muito bem trabalhados com as personalidades apresentadas na primeira. Roberto Benigni acertou em cheio, e agora é fácil de entender porque da mágoa depois do Oscar: achamos que havíamos sido roubados, quando na verdade alguém conseguiu realmente fazer algo melhor que o nosso Central do Brasil. Mas a imagem da festa que Benigni fez ao receber o prêmio... Isso vai ser mais difícil de engolir.

Comentários (3)

Yuri Mariano | domingo, 15 de Março de 2015 - 02:30

Um dos filmes da minha vida!!!

Marcos Freitas | domingo, 15 de Março de 2015 - 15:43

Está entre meus 10 filmes prediletos...

Jackie | quarta-feira, 27 de Outubro de 2021 - 18:16

Qualquer filme que faça "comédia" com Holocausto ganha um zero meu. Não importa sua qualidade técnica

Esse e Jojo Rabbit são filmes que não merecem existir.

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