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Ted Bundy - A Irresistível Face do Mal

(Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile, 2019)
6,3
Média
56 votos
?
Sua nota

Críticas

Cineplayers

Elenco x roteiro

5,0

O diretor Joe Berlinger parece saber o que está fazendo ao adaptar a história de um dos maiores serial killers da História. Ao fotografar o rosto de seu protagonista Zac Efron com uma luz constantemente acinzentada, não ficam muitas dúvidas a respeito do lado escolhido pelo diretor, apesar de criar uma possível abertura naturalista ao caso, acompanhando a narrativa pelo lado do próprio Bundy; é a luz que entrega as intenções do projeto, que não é humanizar o monstro, e sim enxergar o seu lado, pintando o quadro com tintas destoantes do resto da paleta do filme, que pesa pro marrom e pelas cores quentes no geral, realçando características dos anos 1970 sem cacoetes visuais. Apesar da aparente defesa de tese, é esse tratamento fotográfico a cargo de Brandon Trost (vindo de elogiado trabalho em Poderia me Perdoar?) que logo chama a atenção, negando as palavras insistentes do personagem-título. Não estamos vendo o jovem responsável e injustamente acusado, mas o homem de rosto perdido nas sombras.

Outro escolha interessante e acertada é não fetichizar o corpo de Efron - uma tendência para o ator, que mostra o tórax em praticamente qualquer trabalho, mesmo em comédias românticas menos sexualizadas - mesmo que o filme observe o princípio de histeria que o assassino causou no público feminino, que saiu em defesa do mesmo basicamente por sua aparência física. Apenas duas cenas de sexo estão na pauta, uma muito rápida e edulcorada, e outra mais ágil, porém realizada sem tirar uma peça de roupa. Aparentemente fútil, essa análise se faz pertinente para demarcar mais uma vez o lado da produção, que aprisiona os atributos do ator na memória do público; o que se vê é um personagem em desconstrução, de frente pra trás, até chegar em sua verdade. Infelizmente se encerram aí os pontos positivos do filme em sua construção imagético-dramática, aos poucos legando ao público um amontoado de clichês que, ainda que verídicos, não recheiam o produto com interesse o suficiente para criar um diferencial. 

O roteiro é o primeiro com a assinatura do novato Michael Werwie e esteve na chamada 'black list' (que trata os textos na área do infilmável, por inúmeros motivos), que roda mesas a mais de 7 anos. A não ser por essa visão pessoal e auto-protegida de um reconhecido monstro das páginas policiais, Berlinger dá ao roteiro essa sua sacada de iluminação, acabando por realçar suas deficiências, com o típico sumiço de personagens em biografias (chegando ao cúmulo de apagar a filha da protagonista, que passa a ser apenas citada na trama, muitas vezes pra sublinhar possíveis ações da mesma) e o surgimento tardio de outras (é sério que a mãe de Bundy só apareceu quando o filho praticamente não tinha mais qualquer chance?), e reduzindo figuras ao mínimo de exploração de imagem, mesmo tendo reunido um elenco bastante acima da média, todos empenhados em suas funções. 

A dupla de mocinhas vividas por Lily Collins e a brasileira Kaya Scodelario tem bons desempenhos, especialmente a segunda, e as duas ofuscam aqui e ali o próprio Efron, que não tem as grandes chances que poderíamos imaginar num projeto típico para fazer alguém brilhar. Isso até acontece, mas é num único momento quando do último enfrentamento entre o Bundy e o juiz que o julga, vivido por John Malkovich. A cena é decisiva e ambos estão em pé de igualdade em suas funções, onde a melancolia do primeiro não consegue criar espaço para piedade no segundo, que lamenta sua trajetória mas não enxerga perdão para a mesma. Jim Parsons e Brian Gherarty são os advogados que tem pouco espaço de desenvolvimento, o que é uma tendência do próprio filme, em abafar seus possíveis predicados para promover inúmeras repetições de situações que só desintegram o resultado. 

Um ponto de real fascínio desse elenco tem os mesmos problemas de escrita do resto dos colegas mas conseguiu transformar seus momentos em cena, indo da curiosidade inicial a uma centelha de esperança quanto a sua própria carreira: Haley Joel Osment. Lá se vão 20 anos desde sua performance indicada a todos prêmios como o menino atormentado por mortos em O Sexto Sentido e o posterior trabalho em A. I., igualmente seminal; hoje, o que há é um rapaz na casa dos 30 anos, gordinho e barbudo. O imenso talento, no entanto, vaza até em um projeto problemático como esse. O personagem tem algumas oportunidades (ele é o interesse amoroso da deprimida jovem mãe vivida por Lily após a prisão de Bundy) e Osment aproveita cada uma delas. Seja no olhar ainda radiante e cheio de vida, seja na mecânica corporal que constrói para o homem tímido que lhe foi confiado, estamos diante de um ator que precisa voltar a ser solicitado, e - pasmem! - esse é o grande motivo para ver Ted Bundy.

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