5,5
O comentário, algo unânime após a projeção, foi o questionamento de onde estaria a anarquia no quinto longa de José Hernández Cordón. A história de um casal de namorados que ganha a vida ilegalmente vendendo doações de sangue é composta em grande parte do tempo pelo vazio, algo entediado, algo desesperador da vida classe média e baixa mexicana.
Cordón preenche o filme com as cenas que aprofundam as relações do casal protagonista e sua rotina que será cada vez mais alterada a medida que os laços com a máfia do mercado negro se intensificam. Rotina essa que se torna cada vez mais compulsiva e autodestrutiva, com as repetidas cenas de discussão, sexo e família ganhando novas significações a cada nova inserção.
Nisso o filme não parece intentar em representar a falta de coerção de ordem explicitado no título, mas a anomia, a falta de objetivos, de identidade e de falta de identificação com a vida tradicional proposta, como descrito por Emile Durkhekm em O Suicídio e Robert Merton em Estrutura Social e Anomia; seus indivíduos não estão cometendo o ato final em si, mas estão caminhando para a autodestruição ao não absorverem nem cumprirem certos objetivos sociais.
Os objetivos sociais são substituídos por relações interesseiras que visam apenas o capital e na recusa pelo amadurecimento; seus protagonistas adeptos da cultura adolescente urbana não interessam em absoluto em momento algum da narrativa em formar relações concretas e interpessoais além das que eles tem no momento.
A referência a Os Esquecidos (Los Olvidados, 1950) de Buñuel em uma das cenas iniciais do filme dá o tom em confluir uma narrativa até então dispersa, mas que logo irá desaguar em sacrifícios que envolvem abandonar a sucessão de atos espontâneos do início.
Com um compromisso estético de esvaziar a narrativa em prol de um retrato realista ainda que estilizado de uma geração perdida comunica com o realismo cru e brutal do cineasta espanhol que injetou o decalque social cru e visceral do país da América Central, contando a história de crianças destituídas transformadas em marginais pelas circunstâncias miseráveis e perigosas que tem de enfrentar todos os dias.
O mesmo ocorre aqui: uma vez dentro da vida ilegal, é difícil tomar o caminho de volta, que não só parece distante mas também conformado e ordinário.
Mas é justamente aí que mora a grande fraqueza do filme, derivativo esperado do drama social, pretendendo em muitas encontrar subtextos um tanto forçados de falar sobre as dificuldades - como no rap poético proferido por um adolescente drogado, nas relações com familiares levadas em uma chave quase sempre histérica que tornam-se deslocadas, caricaturais em um filme que pretende ser verossímil e a anarquia do título mostra-se uma frustração na arquitetura da tensão, que ainda que possa ter sido pretendido, acaba não levando o filme a lugar nenhum, a não causar nenhum efeito sensorial ou temporal em quem assiste. Acaba que fica no meio do caminho, sem objetivos atingidos, com identificações bem vagas com correntes anteriores. Assim como seus personagens.
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