Em algum momento na história do Cinema as comédias românticas – ou pelo menos algumas delas – tornaram-se tão sentimentalóides, esquemáticas e novelescas que somente pessoas muito sensíveis caíam em suas graças. Geralmente, as mulheres mais jovens, vivendo seu primeiro amor, ou então as mais velhas, eternamente apaixonadas ou sonhadoras. Há um nicho razoável que constitui esse tipo de público, e os roteiristas utilizam-se de todos os clichês que funcionam há décadas enquanto escrevem esses filmes; e os produtores estão sempre preocupados em contratar o casal da moda, garantindo que seu filme tenha máxima visibilidade; e, finalmente, os diretores estão sempre jogando em terreno seguro, nunca se arriscando, entregando exatamente o que o público espera.
Sintonia de Amor é exatamente esse filme. A descrição acima pode servir para dezenas – oras, pode muito bem servir para centenas – de filmes provindos de Hollywood (e que os brasileiros parecem que continuarão copiando em versões tupiniquins-açucaradas, com sotaques regionais, sobretudo nordestinos ou cariocas). Não sei dizer se Tom Hanks teve um “auge” em sua carreira, afinal de contas ainda hoje, à beira de iniciarmos a década de 2010, as bilheterias de seus filmes são estáveis como rochas. Mas em 1993 ele estava prestes a explodir, definitivamente, pois logo faria Filadélfia e Forrest Gump - O Contador de Histórias, para não parar mais de participar de sucessos de crítica e público. Meg Ryan, por outro lado (e já que as mulheres têm mais problemas do que os homens para manterem carreiras de destaque) hoje não tem o mesmo nome de outrora. Isso porque os sinais do tempo são problemas muito maiores para elas do que para os homens – independentemente do talento. E ela nunca foi especialmente reconhecida por tê-lo.
Sobre este filme, conquistou uma baita bilheteria e hoje figura na décima posição no respeitado American Film Institute no que concerne ao gênero comédia romântica. Talvez por funcionar como uma síntese perfeita para esse tipo de filme. Todos os elementos estão lá: o pai recém-divorciado... com um filho engraçadinho (!); a mulher sonhadora (obviamente, o homem com quem está prestes a casar não é o seu príncipe encantado, e ela aceita isso... até conhecer Tom Hanks); e, claro, o cenário de sonhos, aqui representado pelo sempre reconhecidamente romântico Empire State Building, em Nova York. Tudo gira em torno do clássico filme Tarde Demais pra Esquecer, utilizado repetidamente como referência – é o filme preferido de Annie (Meg Ryan) – e Sintonia de Amor funciona quase como uma remontagem moderna daquele outro clássico água-com-açúcar, que era principalmente um romance e de comédia tinha muito pouco. Eram tempos mais tranquilos, a necessidade de entreter poderia ser preenchida simplesmente com uma boa história, muito além dos esquematismos das comédias românticas atuais, como esta mesma.
Fala-se que esse tipo de filme é especialmente perigoso para a mulher romântica moderna. Ao espelhar sua vida amorosa – normalmente medíocre – em contos-de-fada como este, ela traça uma necessidade inatingível de conhecer não apenas um parceiro bom o suficiente para mantê-la com uma qualidade afetiva razoável – ela quer o verdadeiro príncipe encantado: bonito (não necessariamente lindo), perfeitamente cavalheiro, engraçado, sempre atencioso, interessante (seja lá o que isso signifique) e sexualmente extasiante. Aqui, separar ficção de realidade seria algo imprescindível, porém nem sempre acontece para essas almas necessitadas e facilmente enganadas pelo cinema. É claro que não foi Sintonia de Amor que criou esses requisitos nos mocinhos de romances – isso vem de décadas – mas nos anos 1980 e 1990 eles foram tão escancarados que tornaram-se obrigatórios dentro dos romances mainstream do cinema.
Sobre o filme, este foi o segundo trabalho na direção de Nora Ephron. Cinco anos mais tarde ela repetiria a dupla principal na ainda mais açucarada e renovada refilmagem de Mensagem para Você que, apesar de ser bem divertido (muito mais que esta bobagem aqui), não chegava aos pés do original da década de 1940, de Ernst Lubitsch (embora seja de uma covardia imensa tal comparação).
Apesar de ter seu clímax em Nova York, a cidade de Seattle é o cenário da maior parte do filme. Poder-se-ia esperar que a cidade fosse excelentemente fotografada e ajudasse a contar a história, mas nem mesmo isso Ephron conseguiu fazer, dirigindo um filme bastante ordinário e monótono o tempo todo. Nem mesmo o tal clímax no Empire State Building é bem montado, carecendo de ritmo que justificasse toda a expectativa que havia sido criada durante todo o filme até então, com relação ao encontro do casal principal no topo do prédio.
No demais, pode-se dizer que Sintonia de Amor funciona perfeitamente dentro de seu nicho, a previsibilidade de seu roteiro é tamanha que, comparando-a com as horrendas telenovelas brasileiras, ganha por muito pouco apenas. Já é considerado um pequeno (e esse adjetivo é obrigatório aqui) clássico porque fez muito sucesso e tem Tom Hanks nos primeiros grandes anos de sua carreira, mas analisando friamente é um trabalho absolutamente medíocre e sem inventividade alguma. Bem pelo contrário, é tão banal e meloso que chega a dar arrepios de constrangimento em quem torce por bons roteiros e diálogos bem desenvolvidos – basta ver a situação ridícula pelo que passa o personagem de Bill Pullman durante o filme, um mero fantoche fadado a ser descartado desde o começo. Nem o charme de Nova York (que para o gênero quase sempre funciona) salva alguma coisa, pois a cidade aparece por somente alguns minutos, e quando aparece é mal aproveitada por Ephron. Enfim, um filme que não merece sua fama.
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