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Críticas

Cineplayers

Uma obra-prima profunda do diretor de O Sexto Sentido. Um filme para ser sentido.

9,0

Depois dos ótimos O Sexto Sentido e Corpo Fechado, o diretor indiano M. Night Shyamalan virou figurinha de primeira categoria em Hollywood, cotado para ser o próximo "Senhor Blockbuster". Sinais, um projeto de mais de dois anos, da pré à pós-produção, foi lançado prometendo ser um dos maiores suspenses dos últimos anos, tentando, quem sabe, desbancar a própria obra-prima máxima do diretor, O Sexto Sentido. Não! Shyamalan infelizmente não conseguiu repetir a proeza de igualar à si mesmo no gênero (em termos de cinema atual), mas mesmo assim, Sinais chega perto, muito perto de ser uma nova obra-prima. Só as infindáveis discussões que o filme gerou desde seu lançamento já provam que é uma obra diferente – seja no bom ou mau sentido.

Com a atmosfera de suspense dos filmes de Shyamalan, vem também todo o misticismo e religiosidade presente em quase todos os trabalhos do diretor, como por exemplo no próprio O Sexto Sentido e também em seu filme menor, Olhos Abertos. Como de costume, Sinais possui um outro grande diferencial, que somente grandes escritores (o filme foi escrito pelo diretor também) conseguem colocar com felicidade em seus trabalhos: Sinais está cheio de segredos, truques e simbolismos, que exigem do espectador, para serem descobertos e bem interpretados, bons olhos, memória e cabeça aberta. Nenhum elemento presente no filme está lá por acaso, tudo tem uma função bem definida. O final revelará vários desses segredos e simbolismos, mas não todos. Você tem de ficar atento se quiser descobrir novos segredos.

A história de Sinais é sobre uma família que mora numa zona rural cercada de enormes plantações de milho. Vivem na casa pai (Graham, interpretado por Mel Gibson), tio (Merrill, interpretado por Joaquin Phoenix), filho (Morgan, interpretado pelo competente garoto Rory Culkin) e filha (Bo, interpretada pela menina Abigail Breslin). Graham é um pastor que perdeu sua esposa num trágico acidente de carro, fazendo com que ele perdesse junto sua fé. Quando sinais alienígenas começam a invadir o planeta, nos milharais, ele começa a questionar ainda mais a existência de Deus. Juntamente com sua família, Graham deverá enfrentar ao mesmo tempo uma grande invasão alienígena e o questionamento da sua fé.

Muitas pessoas certamente dirão que a resolução das coisas dentro do filme (não somente o final) acontece de forma abrupta, simplista. Ou seja, muitas pessoas esperavam uma explicação diferente da que foi dada, e sendo assim, boa parte delas tende a desgostar do que viu. Mas como foi dito antes, para gostar do filme você deve ter mente aberta (o que, logicamente, não é garantia para gostar do filme, mas ajuda muito). É importante ressaltar: a história, bastante superficial da invasão alienígena (não são mostrados tiros, naves, e há muitos poucos aliens para se ver), serve apenas como pano-de-fundo para a resolução do conflito interior pelo qual passa o personagem de Gibson. Como acreditar num Deus que levou sua esposa de forma tão horripilante? Por que valeria à pena se dedicar à religião quando é claro para o personagem que somos nós mesmos que controlamos nosso futuro, independente de um Deus?

Se levado pelo lado da ação, como muitos esperavam (o trailer acabou vendendo essa idéia), o roteiro realmente é frustrante. Pois simplesmente NÃO há ação no filme. Se for levado pelo lado do terror e suspense, porém, mesmo deixando todos os simbolismos de lado, o filme serve como entretenimento de primeira classe: sustos, atmosfera incrivelmente tensa, e cenas de tirar o fôlego, como a fita gravada no sul do Brasil, onde é mostrada pela primeira vez a aparição de um alienígena. Mas acredite: o filme se torna incrivelmente surpreendente quando visto pela ótica do diretor: Sinais é um filme sobre perda e reconquista da fé. Não é necessário que o espectador acredite ou concorde com as suas idéias (eu mesmo não acredito nelas), e sim que entenda a mensagem que o filme quer passar, independentemente do que acredite na vida real. O filme trata também do fato que não controlamos o nosso destino (como é bem explicitado no seu final), ou seja, tudo – mesmo a menor coisa – que acontece ao nosso redor NÃO é coincidência, e sim está lá ou aconteceu por algum motivo.

O final de Sinais é um dos mais bem elaborados a surgir desde o de O Sexto Sentido (porém inferior a este, mas melhor que o de Corpo Fechado, só para citar filmes do mesmo diretor). Sem entrar em maiores detalhes, pode-se dizer que Shyamalan passa-nos uma mensagem de fé e de crença num destino pré-determinado, para todas as pessoas (reforçando: isso não significa que você TEM de concordar com tal mensagem). Todos os acontecimentos e situações pelas quais a família passou desde o início da entrada dos alienígenas no planeta serviram para um clímax fenomenal, interessantíssimo, riquíssimo em simbolismos e importância. Neste momento, finalmente você enxerga os sinais que o filme possui (infelizmente, os sinais do filme foram vendidos somente – digo somente porque também podem ser – como os sinais nas plantações de milho).

Atenção: o próximo parágrafo (e apenas ele) fala sobre UMA das possíveis interpretações para os acontecimentos do final. Leia sob o risco de estragar a surpresa, caso não tenha assistido Sinais.

Para o final de Sinais existem várias teorias e interpretações. O melhor é você se dedicar tentando, quem sabe, criar a sua própria. Uma das que considero mais corretas e interessantes é a seguinte: Graham estava tendo a sua fé testada ao máximo. Os aliens, portanto, representam os demônios interiores que Graham vinha cultivando desde a morte de sua esposa. A água espalhada por Bo pela sua casa é água-benta. Se você pensar bem, lembrará que, perto do final, a televisão anunciou que foi descoberto uma maneira bastante primitiva de exterminar os alienígenas, no ORIENTE-MÉDIO. O Oriente-Médio, vocês sabem, é o principal ponto da fé e religião no mundo todo, e certamente essa maneira primitiva é o uso da água-benta. Mas como a água da casa de Graham é benta? Bo é (ou simboliza) um anjo, e ao beber um pouco da água do copo, transforma a água em benta (fazendo com que ela sinta que, logo depois, a água está “suja”). Portanto, os aliens não morrem simplesmente com água comum, e sim com água-benta. Mas lembre-se, os aliens são os demônios interiores de Graham, e os demônios podem ser exorcizados com água-benta. Logo que recupera a sua fé (com a morte do alien), Graham recupera também sua força e consegue salvar o seu filho da asma.

Mesmo a teoria acima possui alguns buracos bem óbvios, mas ainda assim é válida – e lembre-se: é apenas uma das interpretações, talvez a mais simbólica de todas. Há outras, mais simples e “palpáveis”. O importante é que ficou demonstrado, aqui, que Sinais é um filme extremamente rico em significado, e não deveria ser renegado logo na primeira vez assistido. É um filme que vai acabar não demonstrando seu real significado para a grande maioria das pessoas que vão assisti-lo.

De qualquer forma, deixando simbolismos e explicações estranhas de lado, Sinais ainda é um grande suspense, com uma excepcional fotografia, e um clima de tensão crescente (a cena final no porão é uma das mais tensas dos últimos anos no cinema), com belas interpretações (embora nada de excepcional neste quesito) e uma trilha sonora muito bacana. O certo é que, depois de assistir ao filme, ou você vai estar do lado dos que o amaram, ou estará ao lado dos que o odiaram. Mas vai ser difícil ficar indiferente...

Comentários (3)

Marcus Almeida | quarta-feira, 02 de Novembro de 2011 - 00:13

Muito melhor que aquela outra bosta de crítica.

Cristian Oliveira Bruno | sexta-feira, 22 de Novembro de 2013 - 15:16

Me lembro que na época muita gente reclamou do efeito do alien no final, mas francamente, quem se importa com efeito especial num fime magistral cheio de significados como esse??? Shyamalan em sua melhor fase. Baita crítica e parabéns pela percecpção dos simbolismos.

Kerlan T. | quarta-feira, 08 de Janeiro de 2014 - 20:21

Ótima crítica.
Amo esse filme e não me canso de vê-lo. Shyamalan foi magistral nesse aqui.

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