“Marilyn era uma amadora profissional (...) As pessoas achavam que fui tão bom como poderia ser. Mas Marilyn! Marilyn estava ótima, melhor que todos. Quem diria?”, disse Sir Laurence Oliver, referindo-se ao seu trabalho com a grande diva no filme O Príncipe Encantado (ou O Príncipe e a Corista [The Prince and the Showgirl, 1957]), que serviu de palco para essa interessante observação acerca da relação da musa com seus colegas de trabalho, sua turbulência emocional e o pequeno conto de fadas que viveu, durante uma semana, ao lado do jovem sonhador Colin Clark. Cercada de assédio pelos quatro cantos e acometida de um caos psicológico que envolvia, inclusive, quem estava ao seu redor, Marilyn Monroe, à medida que era abraçada por fãs, colecionava inimizades entre os profissionais com que dividia espaço na tela (e fora dela), já que nem todos compreendiam que por trás dos absurdos atrasos e da dificuldade de decorar falas e “incorporar” o personagem, existia simplesmente uma menina consumida pela própria insegurança.
Colin Clark (Eddie Redmayne), autor de dois livros sobre esse episódio e narrador das memórias que compõem Sete Dias Com Marilyn (My Week With Marilyn, 2011), foi um dos que conseguiram conhecer a mulher por trás do mito, dos holofotes e das telonas das salas de cinema. Cinéfilo admirador de Alfred Hitchcock, Orson Welles e Laurence Olivier, encontrava na Sétima Arte um refúgio para seu deslocamento dentro de sua refinada família, que o enxergava como uma decepção. Estar junto dos astros que via em tela grande sempre fora a obstinação do jovem, que decide partir a Londres ao saber que a nova produção de Laurence Olivier será rodada, e nela estará a atriz que tanto admira. Mal tinha conhecimento que, ao conseguir, sob muita dificuldade, o emprego de terceiro assistente de diretor, viveria uma história que parecia existir unicamente em seus sonhos, ainda que, na pura realidade, ela não seja tão feliz assim.
Marilyn, a princesa idealizada pelo rapaz, ainda que encantadora, é tomada por uma inconstância que a torna alguém de difícil interação, visto que seus profundos problemas com autoestima fazem-na acreditar que todos ao seu lado irão lhe abandonar de alguma forma. Colin, o plebeu, jamais poderia se imaginar tão próximo a ela, assim como não poderia supor a dimensão das complicações de sua personalidade. No auge do sucesso e diante do tortuoso matrimônio com o famoso dramaturgo Arthur Miller, o que a estrela mais procurava, naquele instante, era uma base para ajudá-la a sustentar o fardo que carregava, e, mesmo com auxiliadores a sua inteira disposição, como Paula Strasberg, sua mentora e instrutora, Milton Greene, seu amigo e sócio na Marilyn Monroe Productions, e até Dame Sybil Thorndike – vivida com elegância por Judi Dench –, sua companheira de cena nas gravações, o que ela precisava era de alguém como Clark, que estivesse alheio às suas aflições, e a admirasse mesmo tomando consciência dessas. Contudo, mesmo se divertindo com seu jovem fã, ela parece nunca se desligar totalmente de sua vida, sempre regressando à condição de artista e esposa infeliz. E esse era, talvez, o mais notório dos problemas que Marilyn possuía, no que toca em seus desentendimentos com parceiros de profissão ou da vida amorosa: trazer as perturbações de casa para o trabalho, e vice-versa.
Os sete dias angustiantes e ao mesmo tempo encantadores funcionam para oferecer, ainda que breve, uma ótica a respeito da mulher sem o verniz de Hollywood, com suas neuroses à flor da pele e um suposto breve romance com um jovem que, mais do que tudo, acreditava na capacidade dela de superar esses obstáculos e, ainda sim, não apagava sua visão idealizada da atriz. E se, para encarnar ao mito em questão, a escalação de Michelle Williams parecia inicialmente arriscada, uma vez que o sex appel que Marilyn simbolizou nos anos 50/60 não condiz com as proporções físicas de sua intérprete, Williams, sabiamente, opta então por construir uma Monroe composta basicamente de uma delicada gesticulação facial e corporal, reproduzindo os trejeitos e expressões da estrela com uma precisão incrível – sendo a melhor das atuações femininas concorrentes ao Oscar 2012. Sua Marilyn Monroe é um retrato comovente da garota que vivia à beira do abismo, sendo absolutamente incapaz de suportar o peso da fama e o fracasso da vida pessoal sem se permitir recorrer constantemente a calmantes e outros medicamentos para manter-se de pé.
Tendo os veículos comerciais destacado unicamente o símbolo sexual que Monroe representa, o diferencial deste conto de fadas do século XX é justamente trazer ao espectador essa visão humanizada da estrela, com as implicações de sua personalidade volátil que muitos conheciam, mas que só ficava realmente evidente nas biografias e documentos que relatassem suas desavenças atrás das câmeras e distante dos flashes da imprensa. Não existe nada de novo em sua estrutura narrativa que não o olhar de um terceiro sobre a vida do artista que conheceu, também não há quaisquer surpresas no meio do caminho, já que trata-se de um episódio que, diante os acontecimentos já conhecidos, termina como esperamos. Mas, apesar das eventuais previsibilidades, é quase certa a satisfação de ver Marilyn Monroe tão bem retratada nessa homenagem ao que ela significou para Hollywood (como entra em destaque na cena em que Laurence Olivier – muito bem interpretado por Kenneth Branagh – ressalta, após ver o resultado de sua obra finalizada, as qualidades da atriz) e para todos os fãs que, assim como Colin Clark, guardam dela não somente a beleza, mas a imagem de uma autêntica e inquestionável estrela.
7,5
Eu também percebi um estilo meio que de contos de fadas, porém não sei se foi por isso ou não, mas faltou profundidade... A escapatória que o Curtis dá para fugir do óbvio são apenas algumas frases, alguns gestos, mas nunca algo que se consolide, se aprofunde, que surja em meio às imagens do filme...
Michelle cria uma personagem parecida com a Marilyn, e concordo, se sai absurdamente bem. A figura que o filme pinta da estrela é o que eu acabei não gostando, ficou parecendo uma loira mimada, extremamente insegura e com indícios de QI baixo. :I
Tá bacana a crítica, Júnior! 🙂
Já li uma biografia de Marilyn Monroe e estava iniciando, há pouco tempo, o livro que fala sobre seu relacionamento com John Kennedy, e, em ambos, ela é retratada como essa pessoa de difícil interação, dependente de seus instrutores e viciada em calmantes - foi essa a causa de sua morte, afinal. E quando assisti esse filme, apesar dos trailers, achava que ela seria retratada daquela forma que a maioria dos filmes a retrata – a partir do “personagem” que criaram pra ela -, mas fiquei surpreso com essa humanização, achei bem fiel aos documentos que constam sobre sua personalidade. Eu gostei disso.
Bem melhor do que imaginei.
Brannagh está fantástico tanto como Olivier como principe-regente Charles.Eles estão vivos !